Prática ilícita de encerramento contratual dos planos de saúde sob a justificativa ilegal de morte do titular.
Ação comum, e infelizmente cada vez mais recorrente, que as operadoras de planos de saúde praticam em sua praxe comercial é a resilição contratual unilateral sob a justificativa de morte do titular, classificando os então dependentes como não mais elegíveis. Tal situação é materializada com o seguinte exemplo:
"A" contrata os serviços do plano de saúde comercializada pela operadora "B", contrato na modalidade individual; por possuir família, coloca sua esposa e o seu filho como dependentes. Infelizmente, "A" vem a falecer. Devidamente ciente, a operadora "B" mantem o contrato para os dependentes por algum tempo, sendo certo que esses pontualmente arcam com os valores das mensalidades. Porém, a operadora resolve, de forma unilateral, comunicar a extinção do contrato, em virtude do falecimento do titular, estimando prazo de 90 (noventa) dias para o encerramento/exclusão.
Essa prática, contudo, via de regra é ilegal e merece intervenção judicial.
De antemão, é precisa saber o tipo do contrato estabelecido, caso em que a depender das circunstâncias o ato será ilegal.
Os contratos de planos de saúde podem ser divididos entre aqueles pactuados antes e depois da entrada em vigor da lei 9656/98; são conhecidos como planos antigos e novos. Os antigos, e que não forem adaptados à aquela lei, serão dispostos pelo contrato firmado entre as partes e a incidência da proteção normativa contratual pátria e normas consumeristas; de outra banda, contudo, os contratos firmados após a vigência da lei são regulados por suas disposições.
Pois bem. Ao receber a notificação de resilição contratual, deve o usuário saber primeiramente qual o tipo de contrato firmado (se na modalidade "antiga" ou "nova". Se antiga, é preciso buscar auxílio jurídico imediato a fim de ser realizada uma leitura contratual e análise de caso, para possível judicialização da demanda ou não.
Se a modalidade contratual for dos planos novos, é de se dizer que tal prática é, prima facie, ilegal, pois contraria "letra clara" da lei. Vejamos o Art. 30, §3º da lei 9.656/98:
Art. 30. Ao consumidor que contribuir para produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta lei, em decorrência de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, é assegurado o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral.
[...]
§ 3o Em caso de morte do titular, o direito de permanência é assegurado aos dependentes cobertos pelo plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde, nos termos do disposto neste artigo.
Nesse mesmo sentido, assim dispõe a Resolução Normativa 557/22 da ANS:
"Art. 3º Plano privado de assistência à saúde individual ou familiar é aquele que oferece cobertura da atenção prestada para a livre adesão de beneficiários, pessoas naturais, com ou sem grupo familiar.
§1º A extinção do vínculo do titular do plano familiar não extingue o contrato, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes".
As jurisprudências dos tribunais do país vêm rechaçando tal prática ilícita das operadoras. Por todos, vejamos o entendimento do STJ:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 1.022 DO CPC/15. FALECIMENTO DO TITULAR. DIREITO DE MANUTENÇÃO DOS DEPENDENTES. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. Inexiste afronta ao art. 1.022 do CPC/15 quando o acórdão recorrido pronuncia-se, de forma clara e suficiente, acerca das questões suscitadas nos autos, manifestando-se sobre todos os argumentos que, em tese, poderiam infirmar a conclusão adotada pelo Juízo. 2. "(...) Com a morte do titular, permitida a permanência de seus dependentes no plano de saúde com a manutenção das mesmas condições, desde que assumam as obrigações dele decorrentes" ( AgInt no REsp n. 1.765.995/SP, Relatora Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 8/6/20, DJe 12/6/20). Súmula n. 83/STJ. 3. Agravo interno a que se nega provimento.(STJ - AgInt no REsp: 1864273 SP 2020/0049031-3, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 1/3/21, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 3/3/21).
Conclui-se, dessa forma, para que os dependentes tenham seu direito de permanência no plano assumam a titularidade e o pagamento das mensalidades para permanecerem no plano sob as mesmas condições contratuais de preço e cobertura, e que se assim procederam não há que se falar em resilição contratual por parte das operadoras de planos de saúde.