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A responsabilidade objetiva dos bancos por vazamento de dados e a prática de fraude contra clientes

Consumidores enfrentam dificuldades quando instituições financeiras recusam reclamações de fraudes, mas uma recente decisão do STJ responsabiliza os bancos pelo vazamento de dados, como nos casos do "golpe do boleto".

23/11/2023

No mundo atual, é recorrente o número de casos de fraudes praticadas por terceiros no mercado de consumo, notadamente, através das instituições bancárias, com graves prejuízos aos consumidores.

A partir de reclamação na via administrativa, muitos consumidores são surpreendidos com a recusa das instituições financeiras no acolhimento das suas pretensões, sob o argumento de que o golpe contra a cliente foi aplicado por meio de negociações realizadas de maneira informal e ou que as informações do boleto falso divergiam dos dados constantes do contrato de financiamento e que o consumidor falhou em seu dever de segurança e cautela.

Em recente decisão brilhante, a Terceira Turma do STJ entendeu que a instituição financeira responde pelo vazamento de dados pessoais sigilosos do consumidor, relativos a operações e serviços bancários, obtidos por criminosos para a prática de fraudes como o "golpe do boleto":

Entre tantos outros, nesse tipo de estelionato, golpistas se passam por funcionários de um banco e emitem boleto falso para receberem indevidamente o pagamento feito pelo cliente, tendo sido proferida importante decisão no RESP 2.077.278, em reforma do acórdão do TJ/SP, oportunidade em que foi restabelecida a sentença que condenou um banco a declarar válido o pagamento realizado por meio de boleto fraudado e devolver à cliente parcelas pagas indevidamente em contrato de financiamento.

Sobre o tema, nos termos da tese fixada no julgamento do Tema Repetitivo 466 – que contribuiu para a edição da Súmula 479 do STJ - as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno em caso de  fraudes praticadas por terceiros, tendo em vista que a responsabilidade decorre do risco da atividade.

O fato é que, em relação aos chamados golpes de engenharia social, a relatora comentou que os criminosos costumam conhecer os dados pessoais das vítimas e, com base neles, usam técnicas psicológicas de persuasão – a exemplo da simulação de um atendimento bancário verdadeiro – como forma de atingir seu objetivo ilícito.

Nesse azo, cabe a análise do caso concreto, a fim de imputar a responsabilidade às instituições financeiras, no que tange ao vazamento de dados pessoais que culminaram na facilitação de estelionato, devendo-se garantir que a origem do indevido tratamento seja o sistema bancário.

Cumpre destacar que, nos termos do artigo 44 da LGPD, o tratamento de dados será irregular quando não fornecer a segurança que o titular espera, considerando-se o resultado e os riscos desse tratamento.

Considerando-se que em muitos dos casos os criminosos detém os dados pessoais da cliente referentes às suas operações bancárias, ainda que o boleto falso tivesse diferenças em relação aos documentos verdadeiros, não se espera que uma pessoa comum seja sempre capaz de identificá-las, devendo-se aplicar, inclusive, a teoria da aparência.

Nesse aspecto, impera a aplicação da Teoria da Aparência, tendo o consumidor que se cercar das cautelas mínimas para pagamento através dos bancos, não podendo responder por ação de terceiros, devendo imperar o risco da atividade econômica pelo fornecedor, conforme CDC.

O sistema adotado pelo Código de Defesa e Proteção do Consumidor consagra uma série de princípios, dentre os quais o da confiança, como dever anexo aos contratos de consumo, além da função social do contrato, reconhecida na nova lei, que o transforma de simples instrumento jurídico para realização dos legítimos interesses do consumidor.

Logo, leis imperativas de alto cunho social irão proteger a confiança que o consumidor depositou no vínculo contratual, mais especificamente na prestação contratual, na sua adequação ao fim que razoavelmente dela se espera, normas que irão proteger também a confiança que o consumidor deposita na segurança do produto ou do serviço colocado no mercado. Busca-se, em última análise, proteger as expectativas legítimas dos consumidores.

Assim é que, instaurada uma situação adversa não solucionada na via administrativa, com a utilização dos dados do consumidor na prática de fraudes e golpes bancários, deve-se recorrer ao Judiciário para salvaguarda dos seus direitos, a fim de obter o afastamento das operações financeiras e ressarcimento dos prejuízos materiais e morais sofridos, com base no CDC (lei 8.078-90) e lei Geral de Proteção de Dados (lei 13.709/18).

Milena Cintra
Advogada Cível e Consumidor. Especialista em Direito Educacional e FIES. Pós Graduada em Direito Público. Atualmente desempenhando também função de juíza leiga na Comarca de Salvador.

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