Introdução
Na atual sociedade globalizada e internetizada a velocidade das informações que resulta em ações positivas para sociedade pode, também, resultar em novos desafios e insegurança para os seus atores.
No dia a dia, onde as pessoas precisam disponibilizar seus dados para serem inseridas na nova realidade e por ela transitarem livremente, há de se considerar os riscos dessa exposição, tal como: a utilização abusiva desses dados pelas plataformas para tentativa de conversão de vendas de produtos.
Considerando que a citada exposição de dados pode não trazer segurança plena aos usuários de plataformas colocando a sua personalidade em risco (intimidade) e, de forma reflexa, seus direitos fundamentais, há a necessidade, segundo o autor Danilo Doneda de criar mecanismos de proteção.
Entender que as informações pessoais, quando publicadas, devem ser menos expostas quanto maior for a importância dos termos expostos (relação de proporcionalidade) pode ser um dos mecanismos.
No Direito, há conflito para a manutenção da equação (maior publicidade para informações que menos exponham seus titulares) frente a necessidade de acesso aos dados armazenados por órgãos públicos. Isso ocorre porque outros Direitos passam a se colidir com o da personalidade, cabendo ao operador do Direito temperar a sua decisão.
No judiciário, esse conflito também pode ser observado.
Como muito bem exposto por André Ramos de Tavares na sua obra O Juiz Digital1, de um lado, a implantação de sistemas de computadores, internet e inteligência artificial foram bem recebidos pelos usuários que de imediato perceberam que o processamento de informações e a agilidade na publicidade dos atos mudariam, para melhor, o dia a dia forense. Quem não se lembra do período que os advogados se deslocavam diariamente até o Fórum para conferir os andamentos processuais?
Ao mesmo tempo, novos problemas derivaram do rápido avanço tecnológico. Um atual exemplo é a validade das audiências de tentativa de conciliação realizadas de forma virtual em ações de competência da lei 9.099/95, que tem como base o Princípio da Pessoalidade (artigo 9° da lei Especial e artigo 20 do FONAGE).
Tanto nas situações positivas quanto nas negativas, deverá existir a resposta Estatal para definição de corretos padrões e reflexa manutenção da segurança social.
Ocorre que com o avanço da sociedade, há a necessidade do Estado mudar a sua atuação. A plasticidade é normal para uma ciência social que só existe em função desta e necessária para a garantia da ordem.
A norma positivada visa manter a ordem social através de comandos diretos. A máxima romana dura lex, sed lex reflete esta afirmação.
Porém, a nova formação social embasada na velocidade da informação, nem sempre verídica, resulta em duas consequências que antes não eram experimentadas. Quais sejam: Conflitos sociais não previamente tutelados pelo Estado e a consequente anomia das normas.
Esse artigo tratará, ao final, de um tema atual que reflete todo o exposto até este momento. Vejamos: Considerando que a fase de cumprimento de sentença onde o rol do artigo 835 do CPC, que dita todas as medidas diretas de constrição patrimonial e a sua correta ordem para que seja empregado o meio menos gravoso ao Executado, não foi suficiente para a efetivação do cumprimento de sentença, qual o limite de atuação do Juiz embasado no artigo 139, IV, do CPC?
Decisões já positivaram, por exemplo, o bloqueio de passaporte e o bloqueio da CNH do Executado como forma de satisfação indireta do cumprimento de sentença.
A pergunta que se quer responder: Há lesão aos Direitos Humanos e a efetivação da Função social (satisfação da sociedade decorrente da certeza da efetivação do poder do Estado frente uma lesão civil) no ato do Estado Juiz?
Byung-Chul Han2 defende sobre esse avanço social e os novos mecanismos de aplicação da norma, sendo que o século passado foi uma época imunológica na qual se estabeleceu uma divisão muito evidente entre o próprio e o estranho, entre o certo e o errado. Desta forma, a ação imunológica definida por ataque e defesa era analisada pelo Estado Justiça com base em normas previamente definidas e prontas para entregarem a resposta Estatal de resolução do conflito e restabelecimento da ordem social.
Para o autor, a sociedade do século XXI, é castigada pelo adoecimento neural causado pelo excesso de positividade e não mais estranheza.
A violência do igual embasada no excesso de informação, de comunicação e de produção gera enormes conflitos sociais (esgotamento), mesmo porque o ataque vindo de iguais é de difícil combate, ou nas palavras do autor: O igual não leva a formação de anticorpos.
O resultado é uma sociedade doente e repleta de novos problemas que o Estado não está preparado para enfrentar por ausência de normas. Ao mesmo tempo a Constituição Federal tem como objetivo fundamental3 uma sociedade livre e justa que tem a garantia de receber do Estado a proteção dos seus direitos em casos de ilegalidade4.
- Confira aqui a íntegra do artigo.
1 O Juiz Digital: da atuação em rede à Justiça algorítmica / André Ramos Tavares. – São Paulo: Expressa, 2022.
2 Sociedade do cansaço / Byung-Chul Han; tradução de Enio Paulo Giachini. 2° edição ampliada – Petrópolis, RJ: Vozes, 2017, p. 8-9
3 Constituição Federal artigo 3°, I.