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Os temas 315 da TNU e 862 do STJ e a proteção ao trabalhador acidentado

Para saber se você preenche os requisitos para o receber a prestação indenizatória, deve-se observar três principais fatores: 1. A existência de um acidente de qualquer natureza; 2. Sequelas após a consolidação das lesões; 3. A incapacidade em desempenhar suas funções habituais, ou aquelas que exercia à época do acidente, entretanto, que permita o desempenho de outra.

25/10/2023

A Carta maior dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo por meio de políticas sociais e econômicas a redução do risco e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Observa-se logo de início o papel do Estado em prestar assistência àqueles que mais precisam, inclusive na situação de incapacidade, em que o segurado não consegue exercer atividades laborais e de garantir sua própria subsistência de forma plena, necessitando de respaldo para garantia de sua qualidade de vida e, por consequência, dos seus direitos fundamentais.

Neste sentido, caso o segurado sofra com alguma lesão corporal ou perturbação funcional de qualquer natureza, que ocasione perda ou redução da capacidade laborativa, estamos diante do benefício de Auxílio Acidente.

Para saber se você preenche os requisitos para o receber a prestação indenizatória, deve-se observar três principais fatores: 1. A existência de um acidente de qualquer natureza; 2. Sequelas após a consolidação das lesões; 3. A incapacidade em desempenhar suas funções habituais, ou aquelas que exercia à época do acidente, entretanto, que permita o desempenho de outra.

Quanto a data de início do benefício - DIB, muito discutiu-se no âmbito administrativo e judicial, mas nos últimos anos firmou-se o entendimento de que a DIB do Auxílio-Acidente deve ser fixada no dia seguintes a cessação do Auxílio-Doença (benefício por Incapacidade Temporária).

Sobre isso recorda-se que em 09 de junho de 2021 a 1ª Turma do STJ adotou a seguinte tese jurídica (tema 862): "O termo inicial do auxílio-acidente deve recair no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença que lhe deu origem, conforme determina o art. 86, § 2º, da lei 8.213/91, observando-se a prescrição quinquenal da súmula 85/STJ".

Por sua vez, o artigo 86, § 2º da lei 8.213/91 afirma: O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria.

Mais recentemente, em 18 de outubro de 2023, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais seguiu a posição do C. STJ ao apreciar o tema 315, cuja controvérsia (abaixo transcrita) é bastante similar ao tema 862 da Repercussão Geral, já transitado em julgado na Corte Superior.

Saber se, nos casos de ausência de pedido de prorrogação, o início dos efeitos financeiros do auxílio-acidente, decorrente da cessação do auxílio-doença, deve ser fixado na data da citação válida ou no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença.

No representativo de controvérsia do referido tema, PEDILEF 5063339-35.2020.4.04.7100/RS, o Relator foi vencido, fixando-se a seguinte tese pelo voto-vista da Juíza Federal Lilian Oliveira da Costa Tourinho:

A data do início do benefício de auxílio-acidente é o dia seguinte à data da cessação do benefício de auxílio por incapacidade temporária, que lhe deu origem, independentemente de pedido de prorrogação deste ou de pedido específico de concessão do benefício de auxílio-acidente, nos termos do art. 86, § 2º, da lei 8.213/91, observada a prescrição quinquenal dos valores atrasados.

A magistrada apenas ressalvou que nos casos de inexistência de concessão prévia do benefício por incapacidade temporária (auxílio-doença), a DIB deverá ser fixada na data de entrada do requerimento - DER ou na data da citação do INSS na demanda judicial, conforme trecho abaixo transcrito:

Com efeito, como salientado pela Ministra, e acolhido pela Corte Cidadã, o prévio requerimento administrativo, ou, na sua ausência, a citação, somente terão relevância para a fixação do termo inicial do auxílio-acidente, nas hipóteses em que não houve prévia concessão de benefício por incapacidade temporária.

O STF respaldou referido entendimento de dispensa de requerimento administrativo de auxílio-acidente precedido de auxílio por incapacidade temporária acidentário ao firmar a seguinte tese, sob o Tema 1105:

É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à necessidade de requerimento administrativo, perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, considerado o entendimento firmado no RE 631.240 (Tema 350), como requisito para postular em juízo a concessão do benefício de auxílio-acidente precedido de auxílio-doença acidentário.

Assim, é dever do INSS, quando da cessação do auxílio por incapacidade temporária acidentário, avaliar se houve redução da capacidade laboral para o trabalho habitual, devendo ser concedido de ofício o auxílio-acidente, caso presentes os requisitos legais, a partir do dia seguinte à cessação do referido auxílio, independentemente, de requerimento administrativo. Inclusive, a Instrução Normativa Pres/INSS nº 128 de Março de 2022.

A TNU firma entendimento louvável e apto a guiar o entendimento dos magistrados singulares nas demandas perante os Juizados Especiais Federais - JEF’s em todo território nacional.

As decisões abordadas representam importante vitória para os trabalhadores que tiveram sua capacidade laboral reduzida e demandarem nas ações perante os JEF’s e a Justiça Federal e ou Estadual, pois terão direito a um saldo de parcelas atrasadas que remontará o retorno ao trabalho/cessação do benefício por incapacidade temporária (o que não raras vezes, resulta em importes consideráveis).

Em tempo, não é demais frisar que o entendimento consolidado do STJ é no sentido de que “O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão” e “A simples alegação de ser o mal reversível pela interrupção dos movimentos que a ele deram causa ou pela possibilidade de tratamento ambulatorial não afasta, por si só, a natureza permanente da incapacidade”. (precedentes REsp n° 1.109.591/SC e no AgRg no REsp n° 775314/SP).

Em conclusão, com base nas teses fixadas nos temas 862 do STJ e 315 da TNU, caso o trabalhador tenha voltado ao trabalho depois de um afastamento acidentário (acidente ou doença do trabalho) ou previdenciário (sem relação com o trabalho habitual), com lesões permanentes consolidadas (sequelas, redução de mobilidade, dores crônicas, perda da força, etc) poderá pleitear a concessão do benefício indenizatório de auxílio-acidente desde o dia seguinte ao retorno ao trabalho.

Claudia Caroline Nunes da Costa
Advogada previdenciária associada do escritório Cascone Advogados Associados. Bacharel em Direito pela PUC-Campinas. Pós-graduada em Prática Processual Previdenciária.

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