Migalhas de Peso

A reforma tributária e os impactos para os serviços de energia elétrica e telecomunicações

Como o princípio da Justiça Tributária será tratado para esses serviços?

25/10/2023

Com a expectativa de votação da Reforma Tributária neste segundo semestre, uma das questões que tem se discutido é se haverá aumento da carga tributária para os serviços de energia elétrica e telecomunicações, especialmente por ambos não constarem no rol de “exceções” ou com um tratamento tributário específico.

Isso porque, pela atual redação da regra de imunidade da PEC 45 para os serviços de energia elétrica e telecomunicações1, com exceção do (i) ICMS (que será revogado), do (ii) Imposto sobre Bens e Serviços (“IBS”), do (iii) Imposto de Importação, (iv) do Imposto de Exportação e (v) do Imposto Seletivo, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações envolvendo esses serviços.

Dito isso e pelo IS não ter sido afastado de forma expressa na redação constitucional, surge a discussão se (i) poderão incidir IBS e IS sobre esses serviços; (ii) se a ausência de um regime de tributação específico para tais serviços implicaria necessariamente em aumento da carga tributária; e (iii) se tais serviços poderiam ser considerados como prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente para fins de incidência do IS, entre outros pontos.

Nesse contexto e sem prejuízo da redação que será aprovada pelo Congresso Nacional, na qual se espera que não haja um aumento da carga tributária sobre tais serviços, fato é que esse novo sistema tributário deve ser interpretado em base em alguns novos princípios trazidos de forma expressa, como o da “justiça tributária”2.

Esse princípio, apesar de ser uma novidade agora na Constituição Federal, já foi analisado pelo STF de forma específica e detalhada para os serviços de energia elétrica e telecomunicações, bem como seus respectivos impactos tributários.

Tal análise aconteceu em 2021, no julgamento do RE 714.139 (Tema 745 de Repercussão Geral), em que o STF reconheceu que os serviços de energia elétrica e telecomunicações são itens/serviços essenciais aos consumidores, pelas características específicas desses serviços para os consumidores.

Isso significa dizer que, diante das particularidades desses serviços, em que foram consideradas “a capacidade econômica do consumidor final, a destinação do bem ou serviço e, ao cabo, a justiça fiscal”, o STF expressamente os definiu como essenciais com base na justiça fiscal, sem qualquer ressalva ou condição à texto legislativo, destacando que eles não poderiam sofrer uma carga tributária maior que os demais serviços.

Para fins de configuração do princípio da “justiça fiscal”, os Ministros entenderam (i) que esse princípio deve vir antes de determinada imposição tributária, (ii) que ele estaria ligado à menor regressividade de tributos, bem como (iii) que ele estaria relacionado à capacidade econômica dos consumidores em contribuir para com as despesas estatais.

Com base nesse racional, o STF, ao final desse julgamento, determinou que os Estados não poderiam cobrar alíquotas de ICMS superiores ao patamar geral (i.e. hoje 17/18%) sobre os serviços de energia elétrica e telecomunicação prestados em seus respectivos territórios, exatamente em linha com o princípio da justiça fiscal, à época sem uma previsão expressa na Constituição Federal.

Diante desse contexto e agora com sua previsão expressa na Constituição Federal, entendemos que a sua aplicação para os serviços de energia elétrica e telecomunicações, por si só, já afastaria qualquer possibilidade de incidência do (i) IBS e do (ii) IS de forma concomitante sobre tais serviços, em linha com o princípio da “justiça tributária”, o qual afastaria qualquer tratamento tributário mais gravoso do que a “regra geral”, que nesse caso seria apenas a incidência da alíquota geral/padrão do IBS.

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1 Redação proposta ao artigo 155 da CF/88: “§3º À exceção dos impostos de que tratam o inciso II do caput deste artigo e os artigos 153, I, II e VIII, e 156-A, nenhum outro imposto poderá incidir sobre operações relativas a energia elétrica, serviços de telecomunicações, derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País"

2 Nova redação proposta ao artigo 145, §3º da Constituição Federal: “3º O Sistema Tributário Nacional deve observar os princípios da simplicidade, da transparência, da justiça tributária e do equilíbrio e da defesa do meio ambiente.”

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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2023. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS.

Luiz Roberto Peroba Barbosa
Advogado e sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.

Guilherme Villas Boas e Silva
Associado de Tributário de Pinheiro Neto Advogados.

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