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Maternidade na advocacia: até quando caberá o desrespeito?

Os direitos e garantias individuais das mães e dos seus filhos devem ser preservados e respeitados, conforme a Constituição. Situações de desprezo com a maternidade refletem o quão patriarcal ainda é o mercado de trabalho. O lema é acolher, respeitar o ciclo natural da vida e celebrar cada alma gerada.

18/10/2023

Gravidez não é doença. Foi a partir desta frase que um desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, no Pará, iniciou sua fala preconceituosa de negação do direito de adiamento da sustentação oral a uma advogada que deu à luz poucos dias antes da sessão. Um total desconhecimento e desrespeito que atinge todas as mulheres que lutam, diariamente, em suas jornadas múltiplas, para manterem-se vivas no mercado de trabalho sem deixarem de lado a sua maior vocação: a maternidade.

Gerar e educar um filho é por si só uma missão que requer sacrifício e dedicação incessante. Uma doação unilateral, generosa e benevolente. Os primeiros dias após o nascimento da criança é um período único de conhecimento e criação do elo com o bebê. Um momento que exige da mãe intensos esforços para lidar com seus hormônios, dores pós-parto, dificuldades da amamentação, inseguranças, medos, dentre tantos outros aspectos tão individuais. O puerpério é um tempo de dores e de renascimento. Só quem já passou por ele, entenderá o que estamos falando.

O desembargador violou as prerrogativas da mulher advogada, previstas em Lei Federal, conforme preceitua o artigo 7º, inciso IV, do Estatuto da Advocacia (lei 8.906/94). Nele diz que é direito da advogada adotante ou que der à luz, a suspensão de prazos processuais quando for a única patrona da causa, desde que haja notificação por escrito ao cliente.

Outros são os direitos das advogadas, como o direito da entrada em tribunais sem serem submetidas a detectores de metais e aparelhos de raios X para as gestantes, além de reserva de vaga em garagens dos fóruns dos tribunais. Para as advogadas lactantes, adotantes ou que derem à luz, é direito o acesso à creche, onde houver, ou a local adequado ao atendimento das necessidades do bebê. Para todas elas, deve haver preferência na ordem das sustentações orais e das audiências a serem realizadas a cada dia, mediante comprovação de sua condição. Violar estes direitos pode ser considerado crime.

Assim como em outras profissões, as mulheres que fazem opção pela maternidade se sentem discriminadas, não valorizadas. É como se a maternidade fosse um problema na visão de alguns empregadores, que abre caminhos para ausência e displicência. Na verdade, o raciocínio é contrário. É com a maternidade que a mulher adquire virtudes e capacidades nunca imaginadas. A mulher se torna ainda mais sábia, mais preparada e inspirada para dar o seu melhor em busca de estabilidade e reconhecimento tanto em casa como no mercado de trabalho. Cabe ao empregador respeitar este momento único, pois o que vale é a competência.

Gravidez realmente não é uma doença. É um sonho, uma bênção na vida de uma mulher. E para tal maravilha e magnitude, o que se espera é compreensão e respeito. Os direitos e garantias individuais das mães e dos seus filhos devem ser preservados e respeitados, conforme a Constituição. Situações de desprezo com a maternidade refletem o quão patriarcal ainda é o mercado de trabalho. 

O lema é acolher, respeitar o ciclo natural da vida e celebrar cada alma gerada.

Alessandra Xavier de Oliveira Coelho
Advogada. Sócia e Diretora Administrativa da Jacó Coelho Advogados. Licenciada em Pedagogia. Pós-Graduação em Formação de Professores pela Pontifícia Universidade Católica de Goiânia (PUC-GO). MBA de Gestão Jurídica de Seguros e Resseguros. MBA, em andamento, em Liderança Integral e Gestão Organizacional - Franklin Covey, Instituto de Pós-Graduação e Graduação de Goiânia (IPOG-GO).

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