Migalhas de Peso

5 possíveis consequências da Nova Lei de Licitações e Contratos

Com a chegada do fim da possibilidade de licitar pela Lei 8.666, é preciso começar a pensar nas mudanças que ocorrerão nas contratações públicas.

29/8/2023

Num país onde “até o passado é incerto” e em que temos leis que “pegam” e que “não pegam” (a Lei da Liberdade Econômica que o diga) fazer qualquer vaticínio sobre os impactos da Nova Lei Geral de Licitações e Contratos (NLGLC) é certamente uma temeridade, mas, convenhamos, diante da aproximação do fim da possibilidade de a Administração optar por licitar pelo “Ancien Régime” encabeçado pela Lei nº 8.666/93, é praticamente irresistível tentar imaginar alguns cenários que decorrerão da aplicação da lei 14.133/23. A seguir, especulamos 5 possíveis consequências da aplicação do novo marco legal das contratações públicas.

1) Redução na quantidade de licitações: Em valores nominais, extraídos diretamente da lei e sem atualizações, os valores de dispensa de licitação previstos no art. 24, I e II da lei 8.666/9/93, saltaram de R$ 15.000,00 e R$ 8.000,00 para R$ 100.000,00 e R$ 50.000,00 respectivamente no art. 75, I e II da NLGLC, ao passo que, o tempo de duração dos contratos, que - à exceção dos contratos por escopo e os referidos no art. 57, V - poderiam, no máximo (e em caráter excepcional) chegar a 72 meses na lei 8.666/93 (art. 57, § 4º), passaram, com a lei 14.133/23 a ter limites máximos de 10 (arts. 107, 108, 110, I e 113), 15 (art. 114) e 35 anos (art. 110, II). Ora, podendo a Administração Pública dispensar licitações com base em valores 6 vezes mais altos e celebrar contratos com uma duração 2, 3 ou 7 vezes maior que a legislação anterior a tendência é termos menos licitações, seja em decorrência da contratação direta, seja em decorrência da menor necessidade de celebrar novos contratos em razão do aumento do seu tempo de vigência.

2) Maior competitividade: Havendo menos licitações e havendo a possibilidade de mapear o mercado de aquisições de produtos e serviços por parte da Administração por meio do acompanhamento do plano de contratações anual (arts. 12, § 1º, 18, § 1º, II) e do Portal Nacional de Contratações Públicas (art. 174, § 2º, I), é possível concluir que licitantes mais organizados, irão se planejar melhor e serão mais ferrenhos nas disputas pelos contratos que lhe interessarem, vez que a derrota numa licitação pode, por exemplo, alijar um fornecedor por 10 anos de um determinado contrato que siga sendo prorrogado.

3) “Federalização” das praxes: Num cenário pré-NLGLC a jurisprudência do TCU já era largamente divulgada e aplicada à revelia de eventuais entendimentos discrepantes locais, agora, com a obrigação da instituição, com auxílio dos órgãos de assessoramento jurídico e de controle interno, de “modelos de minutas de editais, de termos de referência, de contratos padronizados e de outros documentos, admitida a adoção das minutas do Poder Executivo federal por todos os entes federativos” (art. 19, IV) a forma como a AGU modela os instrumentos licitatórios e contratuais da União receberá prestígio semelhante ao conferido aos entendimentos do TCU. E, mesmo que não houvesse a previsão contida no art. 19, IV da Nova Lei Geral de Licitações e Contratos, na era do “Ctrl + C”, “Ctrl + V” e dos grupos de whatsapp e telegram, os modelos da AGU de editais, contratos, termos de referência e mesmo de pareceres parametrizados atualmente já são enormemente compartilhados por agentes públicos estaduais e municipais. Assim, ao longo do tempo, não é descabido imaginar uma consolidação do protagonismo da Administração Pública Federal (e do já citado TCU) para definir a interpretação que redundará na forma que a lei 14.133/23 será aplicada na prática.

4) Diminuição da necessidade de material humano: O fato de as licitações e contratações, via de regra, serem eletrônicas (arts. 12, VI, 17, §§ 2º e 4º, 19, II e 91, § 3º) e de os atos licitatórios e contratos a princípio terem de seguir modelos padronizados (art. 19, § 2º) aliado ao Portal Nacional de Contratações Públicas (art. 174) cria as condições necessárias para o desenvolvimento de tecnologias de machine learning que, no futuro, permitirão o emprego de inteligência artificial para conduzir as contratações públicas, vez que o ambiente eletrônico e a padronização de ferramentas auxiliam o uso de tal expediente.

5) Controle em tempo real: Com o rotineiro uso do Portal Nacional de Contratações Públicas (art. 174), será formado um poderoso banco de dados com as mais diversas informações sobre as aquisições realizadas por órgãos e entidades da União, DF, Estados e Municípios. Com o desenvolvimento de tecnologias, certamente os controles interno e externo poderão fazer o acompanhamento instantâneo dos gastos públicos, fazendo cruzamento de dados e agindo sempre que desvios a parâmetros pré-definidos forem verificados.

Aldem Johnston Barbosa Araújo
Advogado em Mello Pimentel Advocacia. Membro da Comissão de Direito à Infraestrutura da OAB/PE. Especialista em Direito Público.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

A relativização do princípio da legalidade tributária na temática da sub-rogação no Funrural – ADIn 4395

19/11/2024