De forma breve, a ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL OU AMIOTROFIA ESPINHAL PROGRESSIVA (AME) é uma desordem genética causada pela perda e morte de neurônios motores inferiores da medula espinhal e núcleos motores somáticos no tronco cerebral, acarretando fraqueza e paralisia muscular, avançando para grave atrofia dos músculos esqueléticos e repercutindo em vários órgãos e sistemas, envolvendo o sistema cardiorrespiratório, o osteoarticular e o gastrointestinal, seguida de complicações respiratórias e tem tipos AME 1 e AME 2.
Trata-se de distúrbio neurológico de fácil percepção no crescimento da criança, que não condiz com a idade e também gera fácil dependência da traqueostomia, pois a fraqueza muscular do tronco desencadeia dificuldade mecânica de sucção, deglutinação e respiração, levando os pacientes portadores da doença a diversas incapacidades, inclusive de tossir e respirar, além de diversos cuidados diários.
Se não tratada devidamente, esta doença causa insuficiência respiratória e, consequentemente, a morte precoce do paciente. Por tal razão, esta patologia é considerada raríssima, sem medicamentos disponíveis e acessíveis, com morte prematura da criança se não tratada antes dos 2 (dois) anos de idade, acometendo um em cada 10.000 (dez mil) nascidos vivos.1
De acordo com o Relatório de Recomendação de Medicamento da CONITEC 793, de dezembro de 20222, existem poucos medicamentos no mercado para o tratamento da doença e, na maioria deles, somente amenizam a evolução da doença e cujo tratamento perdura pela vida inteira do paciente, a exemplo temos o Nusinersena (Spinraza), disponível no SUS (Sistema Único de Saúde).
Ocorre que há no mercado um tratamento gênico que tem potencial de praticamente cessar a evolução da doença, todavia considerado como um medicamento de alto custo. Trata-se do Onasemnogene abeparvovec, comercializado sob o nome Zolgensma, da fabricante Novartis, cuja aplicação é realizada em dose única e, de acordo com as evidências científicas, garante eficácia incomparável com a do Spinraza garantindo sobrevida aos pacientes e melhora notável nas condições gerais de saúde.
Como já mencionado, por ser um medicamento de alto custo, considerado como o mais caro do mundo, seu acesso aos pacientes dignosticados com AME é limitado. Além disso, as pesquisas apontam sua eficácia máxima em pacientes de até 02 anos de idade, o que representa mais um obstáculo para o tratamento, já que muitas vezes o diagnóstico da doença não é possível ser realizado de forma precoce.
Em que pese a ANVISA ter incorporado ao SUS o medicamento Onasemnogene abeparvovec, a recomendação da CONITEC, a pretexto evidências científicas de segurança e de eficácia da terapia gênica, esta é recomendada pela agência brasileira apenas aos pacientes com até 6 meses de idade, ainda que a bula de sua fabricante demais órgãos internacionais avaliem ser possível a sua prescrição até 2 anos de idade3.
Esses dois fatores, custo do medicamento, em geral, cuja aquisição de forma particular se mostra impossível, e limite de idade, dificultam sobremaneira o acesso desse medicamento tão essencial para o tratamento dos pacientes diagnosticados com AME e que, diante de tais obstáculos, quando prescrito pelos médicos, acabam por ter de recorrer ao Judiciário para a sua obtenção e cobertura, seja através do SUS seja por meio das operadoras de saúde que, em geral se negam de pronto, a fornecê-lo, recomendando outros tipos de tratamentos mais acessíveis, todavia menos eficazes para tratar a doença.
Ocorre que, como mencionado, conforme apurado em estudos clínicos realizados por entidades internacionais, o medicamento Zolgensma é o único atualmente que garante a produção da proteína SMN, após a adequada inserção no DNA da criança com AME, sendo ministrado em dose única, endovenosa para corrigir a alteração genética.
O Zolgensma tem registro na ANVISA desde 2020, conforme Res. 3.061, de 14 de agosto de 2020 e também na European Medicines Agency4 desde maio de 2020, considerando suas evidências de confiabilidade e eficiência. Não somente a ANVISA aprovou o medicamento como também o governo brasileiro, através da Resolução 66/20 de 10 de julho de 2020, da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), zerou o imposto de importação do medicamento ZOLGENSMA, reconhecendo a eficácia do medicamento como referência para o tratamento de AME.
E de acordo com o último Relatório de Recomendação do Medicamento Onasemnogeno abeparvoveque (Zolgensma) da CONITEC 793 foi apurado que em monitoramento não foram identificadas tecnologias no horizonte tecnológico de medicamentos análogos. Diante disso, o Ministério da Saúde e Acordo de Compartilhamento de Risco, em decisão final, acolheu a recomendação da CONITEC, de acordo com protocolo estabelecido pelo Ministério da Saúde, conforme a Portaria 172, publicada no Diário Oficial da União nº 229, seção 1, página 191, em 7 de dezembro de 2022.
Os estudos clínicos, apesar de não randomizados e ser limitado a grupo de pacientes com AME sem controle, considerado pequeno, deve ser relativizado tendo em vista que a doença integra o rol daquelas consideradas ultrarraras, o que inviabiliza um estudo mais amplo com o uso do medicamento onasemnogeno abeparvoveque.
Ainda assim, as evidências clínicas em todas as pesquisas realizadas com o uso do medicamento no tratamento de pacientes com AME se mostraram mais eficazes em comparação com os demais medicamentos utilizados para o tratamento da doença, inclusive, apresentando a vantagem de ser em dose única, enquanto os outros implicam uso contínuo.
De acordo com o relatório final da CONITEC 793 , em suas considerações finais afirmou que:
O uso de onasemnogeno abeparvoveque em indivíduos com AME tipo I possui evidências favoráveis de efetividade no desfecho crítico de sobrevida livre de evento (morte ou ventilação permanente), com estimativas de grande magnitude nos seguimentos de 12 e 24 meses (aproximadamente 95%). Em pacientes pré-sintomáticos, estas estimativas são igualmente de grande magnitude (100%). (fl. 9). (g. n.)
Inclusive, existem dados publicados na literatura especializada já com seguimento de mais de 5 (cinco) anos dos primeiros pacientes que fizeram uso do medicamento solicitado, mostrando sua eficácia e segurança a longo prazo.5
Sobre o tema referente ao alto custo do medicamento, trata-se de um sofisma, tendo em vista, que a eventual argumentação de tratamento mais barato também não encontra respaldo, pois o Zolgensma é aplicação única, enquanto os demais como o Spinraza – medicamento alternativo no tratamento do AME - necessitam ser renovados a cada ano, isto sem mencionar os custos secundários, como suporte médico-hospitalares e cuidados multiprofissionais que com médicos geneticistas, pediatras, alergista, neurologistas, neuropediatras, pneumologistas, medicina intensivista, anestesistas, ortopedistas, fonoaudiólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, entre outros, sem mencionar gastos de internações hospitalares constantes e ocupação de leitos, bem como de cuidados paliativos.
Assim, no que tange à relação do custeio do medicamento, este não se mostra como um problema real quando estamos diante do confronto do direito do paciente com AME a uma vida saudável com o interesse puramente econômico, em especial das operadoras de saúde (custo elevado do medicamento), não se pode olvidar que deve prevalecer o direito à vida e à dignidade da pessoa humana.
Sobre a cobertura do tratamento, as operadoras de saúde vêm de forma reiterada negando as solicitações de seus beneficiários, sob as alegações de que além do alto custo do medicamento, este deveria ser pleiteado perante o SUS, todavia tal fundamento não se sustenta se considerarmos que os planos de saúde não podem delegar ao Estado deveres que são inerentes à sua atividade fim, sob pena, de privatizar bônus e socializar ônus com a sociedade civil.
De acordo com o art. 1º, I, da lei 9.656/98 resta vedada as limitações financeiras, outrora permitidas, nos planos de saúde. Em outras palavras, não podem mais as operadoras de plano de saúde, nem de seguro saúde, sujeitar os seus segurados a limites de gastos, porque estar-se-ia a ferir a finalidade do contrato, que é garantir a saúde, o que também é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, em razão da boa-fé e do equilíbrio da base contratual.
Inclusive, são ilegais e, portanto, nulas as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade, conforme disposto no art. 51, inciso IV, do CDC. Assim, sendo a natureza do serviço das operadoras de saúde a prestação de assistência à saúde, regras contratuais que reduzam este direito devem ser questionadas.
Outro argumento utilizado pelas operadoras diz respeito à não obrigatoriedade de fornecimento de medicamentos que não constam no rol da ANS, em especial, aqueles que apontam como sendo de caráter experimental. Ocorre que, havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.
No julgamento do RE 657.718 (vinculado ao Tema 500 da repercussão geral)6, o STF esclareceu que é possível, excepcionalmente, ainda que se refira ao dever estatal, a concessão judicial de medicamento, mesmo sem registro na ANVISA, quando preenchidos três requisitos: “a) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças ultrarraras e raras); b) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e c) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.”
No caso do uso de onasemnogeno abeparvoveque em indivíduos com AME, a jurisprudência do STJ é consolidada, e ao julgar os recursos especiais 1712163/SP e 1726563/SP7, em regime de recurso repetitivo, elaborou-se a tese no sentido de que os medicamentos importados, uma vez registrados perante a ANVISA e prescrito pelo médico, são de cobertura obrigatória, sendo essa a hipótese do medicamento Zolgensma.
Registre-se que o tratamento faz parte do serviço contratado, havendo farta jurisprudência a respeito resta integrado ao contrato celebrado máxime quando manifesta a indicação médica da necessidade emergencial, o que encontra respaldo no artigo 35- C, inc. I da lei 9.656/98:
Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos:
I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente;
A jurisprudência do STJ é consolidada no sentido de que não cabe à operadora estabelecer o tratamento a que o paciente precisa, sendo notória a abusividade da cláusula contratual que exclui tratamento prescrito para garantir a saúde ou a vida do segurado, porque o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado, em afronta ao art. 51, IV, e § 1º, II, do CDC.
Além do mais, não se pode olvidar a lei 14.454, de 21 de setembro de 20228, que alterou a lei 9.656/1998, afastando a taxatividade do Rol da ANS para "estabelecer critérios que permitam a cobertura de exames ou tratamentos de saúde que não estão incluídos no rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar". Assim, em face da nova legislação específica acerca do tema, verifica-se que o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) caracteriza listagem apenas de referência para os planos de saúde, não sendo taxativo.
Portanto, se mostra abusiva a conduta das operadoras em negar o seu custeio e fornecimento.
Diante do exposto, os tribunais sobre a matéria vêm privilegiando o direito à vida e à saúde do paciente diagnosticado com AME, deferindo tutela de urgência nos casos em que o tratamento requerido tem como objetivo resguardar a vida, em geral, de menores em tenra idade, que têm a chance, com o uso da terapia gênica, de alcançar marcos motores satisfatórios, pois não podemos deixar de compreender que alguns remédios curam, outros nos permitem ter uma vida com mais dignidade mesmo aos portadores de doenças, raras ou não.
Cumpre mencionar que no julgamento do RESP 1.657.156 foi fixada tese de tema9 repetitivo no sentido de que:
a concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
Trata-se de hipótese em que estão preenchidos todos estes requisitos do perigo de dano e risco ao resultado útil do processo, pois a incapacidade para custeio do tratamento é presumida diante do valor da medicação e custos acessórios, há aprovação da ANVISA e até mesmo isenção de imposto de importação, a comprovação através de laudo médico da necessidade do medicamento para o tratamento.
Assim, quando verificados os elementos do art. 300 do CPC, para a concessão da tutela de urgência em relação ao tratamento de saúde da criança, por seu estado de saúde, a urgência no tratamento, o alto custo e a eficácia comprovada da medicação, estes têm sido deferidos pelos tribunais. Observe:
TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. Indeferimento. Reforma. Concessão de liminar para compelir operadora de plano de saúde a custear o medicamento Zolgensma à requerente, portadora de Atrofia Muscular Espinhal. Medicamento prescrito pela médica que acompanha a requerente, ponderada a adequação e riscos do tratamento de acordo com suas condições pessoais. Aplicabilidade do tratamento conforme a bula e carta de aprovação da ANVISA, que admitem a eficácia do medicamento em crianças com a idade e peso da requerente. Tratamento não se qualifica como off label, nem é de uso domiciliar. Alto custo do medicamento não exime a operadora de cobri-lo, tendo em vista a natureza aleatória do contrato de plano de saúde. O risco de cobertura de tratamento ou medicamento de alto custo é inerente ao contrato. Teoria econômica do contrato a externalidades da decisão não podem ser invocadas para o fim de deslocar o risco de sinistro para o segurado. Risco de tratamento dispendioso constitui o próprio núcleo da álea. Fixação de astreintes para o caso de descumprimento. Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2056776-83.2023.8.26.0000; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 44ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/07/2023; Data de Registro: 05/07/2023)
AGRAVO INTERNO. Decisão que concedeu tutela provisória para compelir operadora de plano de saúde a custear o medicamento Zolgensma à requerente, portadora de Atrofia Muscular Espinhal. Manutenção da decisão agravada. Medicamento prescrito pela médica que acompanha a requerente, ponderada a adequação e riscos do tratamento de acordo com suas condições pessoais. Aplicabilidade do tratamento conforme a bula e carta de aprovação da ANVISA, que admitem a eficácia do medicamento em crianças com a idade e peso da requerente. Tratamento que não se qualifica como off label, nem é de uso domiciliar. Alto custo do medicamento não exime a operadora de cobri-lo, tendo em vista a natureza aleatória do contrato de plano de saúde. O risco de cobertura de tratamento ou medicamento de alto custo é inerente ao contrato. Astreintes por descumprimento que devem ser mantidas, tendo em vista o alto custo do tratamento e sua urgência. Recurso improvido. (TJSP; Agravo Interno Cível 2056776-83.2023.8.26.0000; Relator (a): Francisco Loureiro; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 44ª Vara Cível; Data do Julgamento: 16/06/2023; Data de Registro: 16/06/2023) (g. n.)
AGRAVO INTERNO. PLANO DE SAÚDE. Insurgência contra decisão que deferiu a tutela de urgência, condenando a Agravante a custear o tratamento do Agravado. Relatórios médicos que indicam a necessidade e urgência do medicamento, recentemente registrado na ANVISA, para tratamento da doença do infante. Estudos técnicos que atestam a indispensabilidade, a eficiência e a segurança do fármaco Zolgensma. Criança que possui peso compatível com o exigido. A demora no atendimento da tutela pleiteada acarreta evidente risco à saúde e à vida da criança. Precedentes. Primazia à proteção integral da criança. Decisão mantida. Recurso desprovido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2035001-12.2023.8.26.0000; Relator (a): Lia Porto; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 28ª Vara Cível; Data do Julgamento: 24/05/2023; Data de Registro: 25/05/2023) (g. n.)
TUTELA PROVISÓRIA – Contrato – Plano de saúde – Deferimento da medida para que a ré acoberte o medicamento "Zolgensma", a menor portador de Atrofia Muscular Espinhal – AME – , doença cuja evolução é grave – Manutenção – Presença dos requisitos previstos no art. 300 do CPC, especialmente ante o relatório médico juntado, o qual dá conta da necessidade da terapia e da gravidade da moléstia – Inteligência, ademais, Lei nº 14.454/2022, a qual possibilita a cobertura de exames ou tratamentos que não estão incluídos em rol da ANS – Dilação do prazo de 10 (dez) dias úteis, para o seu cumprimento – Descabimento – Tutela de urgência, não sendo razoável que o segurado aguarde por lapso superior ao estabelecido pelo magistrado de origem – Recurso improvido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2056785-45.2023.8.26.0000; Relator (a): Alvaro Passos; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 25ª Vara Cível; Data do Julgamento: 28/03/2023; Data de Registro: 28/03/2023) (g. n.)
Agravo de instrumento. Ação de obrigação de fazer c.c. indenização por danos morais. Recurso contra a decisão que concedeu tutela de urgência obrigando a agravante a fornecer à agravada o medicamento Zolgensma, prescrito para o tratamento da Atrofia Medular Espinhal – AME tipo II, sob pena de multa diária equivalente ao dobro dos medicamentos não fornecidos. Presença dos requisitos do art. 300 caput do CPC. Recusa violadora dos arts. 14 e 51, IV e § 1o do CDC. Medicamento prescrito em cenário off label. Irrelevância (Súmula no 102 desta Corte). Prevalência da prescrição médica. Medicamento registrado na Anvisa. Planos de saúde que só não estão obrigados a fornecer medicamentos sem registro na agência reguladora (REsp 1712163/ SP e 1726563/SP). Ausência de prova acima de qualquer dúvida razoável de que o medicamento seja ineficaz para o tratamento da doença que acomete a agravada. Existência de evidências científicas práticas de que o medicamento possui eficácia quando utilizado em pacientes com quadro clínico semelhante ao da recorrida. Fornecimento da medicação emergencial, nos termos do art. 35-C, I da Lei no 9.656/98. Suposta irreversibilidade da tutela de urgência, em razão do alto custo do medicamento (cerca de R$ 11 milhões a dose), que não autoriza o seu indeferimento. Prevalência do direito à saúde sobre o interesse patrimonial da agravante. Fornecimento do medicamento que não deve ser condicionado à realização de perícia e/ou à requisição de nota técnica do NAT-Jus. Precedentes do STJ e do STF. Astreintes. Alegações recursais que não justificam a sua revogação. Fornecimento do medicamento que depende exclusivamente de medidas administrativas, de natureza pouco complexa. Multa fixada em valor excessivo. Redução para R$ 200.000,00 por dia, limitada ao valor do medicamento, concedido o prazo de 10 dias corridos para cumprimento da tutela de urgência, contados a partir da publicação do acórdão. Decisão parcialmente reformada, revogado o efeito suspensivo concedido ao recurso” (TJSP, Agravo de Instrumento no 2202735-56.2021.8.26.0000, 1a Câmara de Direito Privado, Comarca: Campinas, Relator ALEXANDRE MARCONDES, j. em 01/02/2022) (g. n.)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM TUTELA DE URGÊNCIA E DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. IRMÃOS GÊMEOS PORTADORES DE AME (ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL) TIPO II. PRESCRIÇÃO DE TERAPIA GÊNICA COM O MEDICAMENTO “ZOLGENSMA”. DEVER DE FORNECIMENTO. RECUSA ILEGÍTIMA. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE SEGURANÇA E EFICÁCIA. MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA. IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DE TRATAMENTOS PELO PLANO. DOSE ÚNICA. MELHOR CUSTO-BENEFÍCIO. PROGNÓSTICO FAVORÁVEL DE CURA. [...]. SENTENÇA CONFIRMADA. RECURSOS DE APELAÇÃO E ADESIVOS DESPROVIDOS. 1. Não configurado cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, sendo suficientes as provas trazidas aos autos para firmar o convencimento do julgador, sem contar que o saneamento do processo não é obrigatório, podendo ser dispensado nos termos do art. 355 /CPC. 2. Não se admite a ingerência da operadora do plano de saúde na atividade médica, a qual se dá com base científica e levando em consideração o histórico e a evolução do paciente, de modo que a eleição do tratamento e sua condução compete ao médico assistente, inclusive para os tratamentos ditos “off label”. [...]. (TJPR - APL: 00217824420208160001 Curitiba 0021782-44.2020.8.16.0001 (Acórdão), Relator: Helio Henrique Lopes Fernandes Lima, Data de Julgamento: 11/03/2022, 8ª Câmara Cível, Data de Publicação: 11/03/2022). (g. n.)
Com efeito, tendo em vista, os prejuízos causados pela ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL (AMIOTROFIA ESPINHAL PROGRESSIVA) são constantes e ininterruptos, quais sejam: perda de neurônios motores inferiores da medula espinhal e núcleos motores somáticos no tronco cerebral, sendo necessário conferir tratamento médico eficaz e concreto.
Portanto, qualquer discussão relativa à estimativa de custos é de insignificante importância diante da opção de salvar vidas, uma vez que se trata de pacientes com AME que, em geral, são crianças, vidas estas que serão ceifadas caso não lhe sejam garantidos o devido tratamento de saúde que dependem do medicamento onasemnogeno abeparvoveque (Zolgensma), considerando que, apesar de ser tida uma doença ultrarrara, poderá beneficiar e ampliar o acesso ao tratamento. Devendo este ser fornecido e custeado pelas operadoras de saúde, além do dever dos Entes Federados, tendo em vista ser o único capaz de proporcionar e garantir qualidade de vida e dignidade aos portadores da doença.
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1 Disponível em: https://iname.org.br/a-atrofia-muscular-espinhal/. Acesso em: maio, 2023.
2 Disponível em: https://www.gov.br/conitec/pt-br/midias/relatorios/portaria/2022/20221207_relatorio_zolgensma_ame_tipo_i_793_2022.pdf. Acesso em: jun. 2023.
3 Disponível em: https://portal.novartis.com.br/medicamentos/wp-content/uploads/2021/10/Bula-ZOLGENSMA-Suspensao-para-injecao-intravenosa-Medico.pdf. Acesso em jun. 2023.
4 Disponível em: https://www.ema.europa.eu/en/medicines/human/EPAR/zolgensma. Acesso em maio, 2023.
5 Mendell JR, Al-Zaidy SA, Lehman KJ, McColly M, Lowes LP, Alfano LN, Reash NF, Iammarino MA, Church KR, Kleyn A, Meriggioli MN, Shell R. Five-Year Extension Results of the Phase 1 START Trial of Onasemnogene Abeparvovec in Spinal Muscular Atrophy. JAMA Neurol. 2021 Jul 1;78(7):834-841. doi: 10.1001/jamaneurol.2021.1272. PMID: 33999158; PMCID: PMC8129901.
6 Disponível em: https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/tema.asp?num=500. Acesso em: jun. 2023.
7 STJ, Tema 990. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&cod_tema_inicial=990&cod_tema_final=990. Acesso em: jun. 2023.
8 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/L14454.htm. Acesso em: jun. 2023.
9 STJ, Tema 106. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&sg_classe=REsp&num_processo_classe=1657156. Acesso em: jun. 2023.