O instituto do acordo de colaboração premiada – comumente conhecido como “delação premiada” – desperta a discussões desde a sua regulamentação no Brasil, a qual se deu originalmente pela lei 8.072/90, a lei de crimes hediondos que, em seu art. 8º, fazia remissão à redução de pena ao participante ou associado que denunciasse o “bando” ou a “quadrilha”, possibilitando seu desmantelamento.
Atualmente, a delação premiada é prevista no art.4º da lei 12.850/03, que tipifica o crime de organização criminosa e prevê diversos mecanismos de persecução penal aplicáveis especialmente para esta espécie de delito, dada a sua complexidade, que demanda o uso de ferramentas mais apropriadas por parte do Estado.
Nesta linha, pode-se definir o instituto como um pacto entre o Estado-acusador e a pessoa investigada ou acusada, que concorda em colaborar com a acusação, entregando elementos que auxiliem na punição da organização criminosa, em troca de ter sua pena diminuída ou até mesmo extinta.
Todavia, como é costumeiro na seara jurídica, o acordo entre Estado e acusado acarreta severas críticas acerca de sua validade no ordenamento jurídico, o que se pôde notar com clareza no âmbito da operação Lava Jato, a qual ficou conhecida mais pelas nulidades e ilegalidades perpetradas pelos personagens públicos, do que pelo êxito obtido no desmantelamento de estruturas criminosas.
Pode-se dizer, contudo, que as diversas opiniões atinentes a necessidade e a própria utilidade da colaboração premiada devem-se muita mais aos desvios em seu uso, do que a sua regulamentação.
Partindo-se da lição “lava-jatista”, é possível notar que a utilização deste meio de obtenção de provas de forma inadequada acarretou o reconhecimento, por parte dos tribunais superiores, de diversas ilegalidades que resultaram na anulação de grandes processos, além do escândalo envolvendo o conluio que fora descoberto posteriormente entre acusador e julgador.
Ademais, a própria eficácia dos pactos que são homologados pelo Juiz é um tópico ainda passível de discussão, visto que elemento essencial para a validade e concessão do “prêmio” ao agente que colaborou com o Estado para o desenlace da persecução criminal em face dos autores e partícipes do crime.
Neste enfoque, aduz-se que o problema da delação premiada não está na sua existência e nem tão pouco em sua regulamentação, mas concentra-se sobremaneira na utilização equivocada de um meio de prova muitas vezes manipulado, sobretudo em grandes operações.
É necessário, a vista disto, que o uso da colaboração premiada e dos demais instrumentos de obtenção de provas sejam harmonizados com a Constituição Federal e o sistema acusatório, pilares que, afastados, geraram rigorosos atritos nas relações institucionais no âmbito da aclamada operação Lava Jato a qual, nos dias atuais, descobriu-se que não serve muito de parâmetro para comparações legalistas com processos ainda em curso, como se tem observado em recentes manifestações atinentes ao Caso Marielle.