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Transparência nos órgãos da administração no Brasil contemporâneo

Torna-se urgente fazer cumprir a lei de Acesso à Informação em conjunto com os princípios da boa administração pública.

17/7/2023

A transparência pública no Brasil, definitivamente carece de urgentes melhorias em todos os níveis da administração pública. Tal conceito surge com enfoque em âmbito nacional, notadamente por intermédio da edição da denominada lei da Transparência (lei Complementar 131/09), essa que fora aprovada na Câmara dos Deputados no dia 5 de maio de 2009 e no dia 27 de maio do mesmo ano foi sancionada pelo então Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.

No decorrer da história, percebeu-se sobremaneira a relevância da transparência de tal modo que essa se transformou em princípio fundamental oriundo tanto do artigo quinto de nossa Constituição da República, bem como de diversos outros dispositivos que prestigiam a clareza mandamental, notadamente no artigo 37 (CF/88) no que tange ao zelo pela administração pública, bem como em outras cláusulas pétreas apartadas do rol do artigo quinto, a exemplo do artigo 225 (CF/88) que prestigia o meio ambiente ecologicamente equilibrado, com transparência obviamente, em seus procedimentos e instrumentos.

Atualmente temos vigente no Brasil, a lei 12.527/11 que versa principalmente sobre a autonomia que quaisquer cidadãos da República possuem em solicitar informações de órgãos públicos, consultar remunerações de servidores, fiscalizar contratos e licitações públicas, em suma, em exercerem o seu locus em uma democracia, inclusive potencializa o dever do parlamentar em fiscalizar as contas públicas.

Márcio Staffen é enfático ao afirmar que o dever de acesso à informação, representa um avanço civilizatório, bem como instrumento hábil a promover um paradigma global do Direito, prestigiando todo o mundo, em suas multifacetadas relações transnacionais1.

A Organização sem fins lucrativos que visa o combate à corrupção, sediada atualmente em Berlim (Alemanha), denominada Transparência Internacional, em pertinente análise confeccionada recentemente, destacou índice interessantíssimo de transparência e governança pública, notadamente pontuando que das assembleias legislativas pelo Brasil, apenas 04 (quatro) dessas apresentaram resultado satisfatório, e inclusive enfatizando que nenhuma assembleia obteve uma classificação sendo considerada ótima.

Destacou a Transparência Internacional nesse sentido que:

[...] Por outro lado, o Índice de Transparência e Governança Pública identificou que a maior parte das Assembleias Legislativas regulamentou a lei de Acesso à Informação (16 delas), possui portais da transparência (25), e divulga informações sobre suas comissões (26). Boa parte das assembleias também transmite suas sessões do plenário online (17) e todas divulgam os contatos dos parlamentares das legislaturas atuais (27).

Restou ainda consignada alguns destaques da avaliação2, sejam esses considerando que:

Para o gerente de programas da Transparência Internacional no Brasil, Renato Morgado, a análise feita destacou sobremaneira que o tamanho do estado ou seu desenvolvimento, não guarda relação com a boa governança e notadamente com a transparência, assim explica ele:

“Estados pequenos conseguiram melhores resultados que estados grandes e mais ricos. Isso demonstra que, mais do que recursos financeiros, é necessário vontade política para implementar medidas que vão aproximar os cidadãos dos seus deputados. As mesas diretoras das assembleias que assumiram no início desse ano nas novas legislaturas estaduais possuem uma grande oportunidade de promover avanços em seus mandatos”4.

Destaca-se, pois, a relevância da pauta, sendo essa inédita no país, muito embora com legislação de 2011 que regulamenta o tema, falta-se muito ainda para alcançarmos um nível de transparência compatível com os pressupostos inseridos no artigo 37 (CF/88).

Embora tal iniciativa da Transparência Internacional se demonstre deveras relevante, justamente por abordar pauta atrelada à moralidade na administração, outras análises igualmente ocorrem anualmente e inclusive buscam até mesmo criar rankings, premiar as boas ações em prol da ética no trato da coisa pública, em suma, apontar efetivar e fazer cumprir o descrito na Constituição da República.

Por exemplo, a Petrobrás ao fim de 2022, liderou ranking de transparência ativa da CGU pela 2ª vez, sendo que a estatal e ainda outras 40 empresas e entidades federais, tiveram nota máxima na avaliação da Controladoria Geral da União (CGU)5.

Destaca-se que também obteve boa avaliação no ranking de transparência ativa da CGU6, a Companhia Docas do Ceará. A CDC cumpriu os 49 itens exigidos, entre eles: “ações e programas”, “auditorias”, “convênios”, licitações e contratos”, “receitas e despesas”, “serviço de informação ao cidadão” e “servidores”7.

A CGU nesse quesito de transparência vem realizando um excelente trabalho com análises trazendo indicadores e métricas apuradas com diversos critérios, a fim de se estabelecer o combate à corrupção e fazer cumprir a lei de Transparência vigente no Brasil8.

Em Pesquisa realizada junto à 04 (quatro) portos de Santa Catarina (Itajaí, Navegantes, Imbituba e Itapoá) e a Secretaria do Estado da Fazenda (SC), fora possível a obtenção de informações relevantes para embasar dissertação, notadamente no que se refere aos Tratamentos Tributários Diferenciados 409 e 410 (TTD’s) de Santa Catarina. Depois de solicitar e aguardar 20 (vinte) dias, em alguns requerimentos foi necessário fazer uma Reclamação para se conseguir a resposta, e essa surgiu fundamentada em algumas poucas linhas, com isso se teve uma certa experiência empírica do demonstrado nas avaliações mencionadas9. A experiência empírica relatada acima, visa demonstrar justamente a dificuldade ocorrida no âmbito da busca pela efetivação da transparência e acesso aos dados públicos no Brasil.

Por fim, torna-se urgente fazer cumprir a lei de Acesso à Informação em conjunto com os princípios da boa administração pública, reavaliar critérios, repensar portais de transparência que surgem deficitários de dados prejudicando à livre informação ao cidadão fiscalizador, dentre diversos outros requisitos a serem reafirmados com o único intuito de estabelecer uma governança da transparência pública de forma sólida no Brasil, onde o cidadão pode gozar de seu lugar na democracia, a democracia viva e não simbólica tão somente em seu conceito de ser.

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1 STAFFEN, Márcio Ricardo; OLIVIERO, Maurizio. Transparência enquanto pretensão jurídica global. A&C-Revista de Direito Administrativo & Constitucional, v. 15, n. 61, p. 84, 2015.

2 Os dados da pesquisa na íntegra, podem ser conferidos em: https://transparenciainternacional.org.br/indice. 

3 REDAÇÃO. Índice de transparência e governança pública avalia as 27 casas legislativas brasileiras. TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL. Disponível em: https://transparenciainternacional.org.br/posts/indice-de-transparencia-e-governanca-publica-avalia-as-27-casas-legislativas-brasileiras/. Acesso em: 02 jul. 2023. 

4 RIBBEIRO, Leonardo. Transparência Internacional lista melhores e piores casas legislativas do Brasil; veja ranking. CNN BRASIL. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/politica/transparencia-internacional-lista-melhores-e-piores-casas-legislativas-do-brasil-veja-ranking/. Acesso em: 02 jul. 2023

5 REDAÇÃO. Petrobras lidera ranking de transparência ativa da CGU pela 2ª vez. PODER 360. Disponível em: https://www.poder360.com.br/energia/petrobras-lidera-ranking-de-transparencia-ativa-da-cgu-pela-2a-vez/. Acesso em: 02 jul. 2023. 

6 A CDC incluiu em seu Portal de Transparência o informado ranking, ver em: http://paineis.cgu.gov.br/lai/index.htm. Acesso em: 10 jul. 2023. 

7 REDAÇÃO. CDC ocupa 1º lugar no ranking de Transparência Ativa da CGU. DOCAS DO CEARÁ. Disponível em: https://www.docasdoceara.com.br/post/cdc-ocupa-1%C2%BA-lugar-no-ranking-de-transpar%C3%AAncia-ativa-da-cgu. Acesso em: 03 jul. 2023. 

8 REDAÇÃO. CGU divulga nova avaliação de transparência em estados e municípios brasileiros. ZENITE. Disponível em: https://zenite.com.br/2018/12/13/cgu-divulga-nova-avaliacao-de-transparencia-em-estados-e-municipios-brasileiros/. Acesso em: 03 jul. 2023. 

 

9 UNIVALI. Relação Porto-cidade e Desenvolvimento Catarinense: análise do regime fiscal do ICMS na importação, da tributação e da regulação do THC ressarcimento. Dissertação de Mestrado. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.univali.br/Lists/TrabalhosMestrado/Attachments/2955/Disserta%C3%A7%C3%A3o%20-%20MAYKON%20FAGUNDES.pdf. Acesso em: 10 jul. 2023. 

Maykon Fagundes Machado
Advogado e Professor. Mestre em Ciência Jurídica pela UNIVALI/SC. Pós-Graduado em Jurisdição Federal pela ESMAFESC/SC e em Direito Ambiental pela FACULDADE CERS. Contato: 47 99783-1449

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