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Impossibilidade de extinção da ação de busca e apreensão mesmo quando houver declaração de essencialidade dos bens da recuperanda

A declaração de essencialidade do bem alienado em garantia fiduciária durante o processo de recuperação judicial suspende apenas temporariamente a ação de busca e apreensão, mas não culmina na extinção do processo sem resolução do mérito, podendo a ação ser retomada posteriormente.

6/7/2023

Em recente acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, na Apelação Cível 5392383-53.2020.8.09.0051, abordou-se a controvérsia sobre a possibilidade de extinção da ação de busca e apreensão mesmo quando houver declaração de essencialidade dos bens alienados em garantia fiduciária no contexto da recuperação judicial do devedor.

A lide envolve um veículo que foi alienado fiduciariamente ao credor, sendo que o devedor teve posteriormente seu pedido de processamento da recuperação judicial deferido. A questão central era determinar se a declaração de essencialidade desse bem durante a recuperação judicial acarretaria a perda do objeto da ação de busca e apreensão movida pelo credor.

O juízo de 1º grau entendeu pela perda superveniente do objeto, em razão da declaração de essencialidade, julgando extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, VI, do Código Processual Civil1.

Como cediço, o credor fiduciário possui crédito de natureza extraconcursal, motivo pelo qual não se submete aos efeitos da Recuperação Judicial, a teor do que dispõe o § 3º, do art.49, da Lei 11.101/20052. Referido artigo também dispõe expressamente que a essencialidade dos bens só perdura enquanto o período de suspensão estiver vigente.

Logo, o TJ/GO reiterou que o crédito garantido pela alienação fiduciária de um bem móvel não se sujeita aos efeitos da recuperação judicial, garantindo os direitos de propriedade sobre o bem e as condições contratuais.

A decisão do tribunal ressaltou que a impossibilidade de busca e apreensão decorrente da declaração de essencialidade do bem alienado em garantia fiduciária no âmbito da recuperação judicial não é absoluta, mas sim temporária. Isso significa que a ação de busca e apreensão é apenas suspensa durante esse período, sem resultar na perda do objeto.

Nesse contexto, tão logo cessados os efeitos da suspensão, poderá o credor fiduciário dar regular seguimento à ação de busca e apreensão.

Dessa forma, a declaração de essencialidade do bem alienado em garantia fiduciária durante o processo de recuperação judicial suspende apenas temporariamente a ação de busca e apreensão, mas não culmina na extinção do processo sem resolução do mérito, podendo a ação ser retomada posteriormente.

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1 Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:

VI - verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual;

2 Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 3º Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4º do art. 6º desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

Lucas de Moraes Carvalho
Pós-Graduando em Processo Civil (Mackenzie-SP). Graduado em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado do escritório Carmona Maya, Martins e Medeiros Sociedade de Advogados.

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