Migalhas de Peso

Alterações legislativas na regulação de criptoativos e a (ainda) necessária correção de velhos equívocos

Corroboram tal afirmação a própria rastreabilidade, verificabilidade e segurança, típicas das redes descentralizadas, onde a garantia de lisura das operações não é garantida por apenas um agente, mas por todos os usuários da rede.

4/7/2023

O mercado de criptoativos vem, recentemente, passando por importantes alterações que exigirão, certamente, uma mudança de postura dos agentes deste mercado, e dos usuários destes instrumentos digitais, para a exata compreensão das novas regras.

Ocorre que, mesmo antes da inovação legislativa adiante mencionada, havia – e ainda há- certa confusão, por parte de operadores do Direito, sobre os conceitos e instrumentos deste mundo digital, como a não identidade entre o procedimento de “arbitragem” com a de “dólar-cabo”; a diferença entre criptoativos e criptomoedas ou, ainda, a diferença entre Bitcoin e bitcoin, apenas para ficar em três exemplos.

A rigor, referida confusão conceitual por vezes é, inclusive, presente em instrumentos contratuais de empresas que lidam com criptoativos, entre elas, a criptomoeda.

A recíproca também é verdadeira: empresas de intermediação de venda e compra de criptoativos parecem ter pouca clareza (para não se afirmar que atuam em “cegueira deliberada”) de que não são proprietárias dos valores que custodiam. Entretanto, não são incomuns notícias de que as chamadas “exchanges” se valem do patrimônio de seus clientes para alavancagem de seus próprios negócios.

Os exemplos, inclusive bastante recentes, comprovam o quanto afirmado.

Entretanto, empresas deste tipo fazem, apenas e tão somente, a intermediação da compra e venda de criptoativos, não podendo se equiparar à atividade bancária e, portanto, não pode realizar operações próprias de uma instituição financeira.

Aliás, o caráter disruptivo dos criptoativos é decorrência de sua oposição aos sistemas tradicionais de circulação de bens e serviços, e de trocas econômicas, em geral.

De toda forma, não é inteiramente adequado afirmar que o mercado de criptoativos não era regulamentado no Brasil.

A Administração Pública direta (por exemplo, a Receita Federal) e indireta (Comissão de Valores Mobiliários) vinha se pronunciando sobre pontos específicos e controversos da normativa relativa aos criptoativos.

Tal regulação por diversos órgãos da Administração já é indicativo da celeuma havida sobre a natureza jurídica dos criptoativos, havendo quem considere que estes possuem natureza jurídica híbrida, a ser examinada casualmente.

No entanto, no que tange especificamente à atuação do Direito Penal, em obediência à reserva legal, decorrente do princípio da legalidade, exige que a classificação de uma conduta como sendo criminosa exige lei estrita, escrita, prévia e certa.

Neste contexto, foi promulgada, no final de 2022, a lei 14.478/22 que, entre outros temas, introduziu mudanças na legislação penal brasileira (tanto no Código Penal, quanto na legislação extravagante), que merecem a atenção dos operadores do Direito e, também, de todo cidadão que tenha interesse em criptoativos, sobretudo os que fazem uso destes recursos.

A partir de 20 de junho de 2023, condutas que antes eram tidas como “crimes contra a economia popular”, cuja pena poderia variar de seis meses a dois anos de detenção e multa, poderá ser, de acordo com a nova redação dada ao art. 171-A, do Código Penal, estabelecida entre quatro e oito anos de reclusão, e multa.

É imprescindível esclarecer que o que se visa criminalizar não é o mercado de criptoativos, enquanto tal, tampouco o uso que se faz dele, mas sim as fraudes e demais condutas lesivas a terceiros, que podem ser cometidas em ambiente virtual.

Corroboram tal afirmação a própria rastreabilidade, verificabilidade e segurança, típicas das redes descentralizadas, onde a garantia de lisura das operações não é garantida por apenas um agente, mas por todos os usuários da rede.

Neste sentido, a adequada compreensão dos conceitos próprios a estas realidades, é importante medida de mitigação dos riscos e consciência dos limites entre o lícito e o ilícito nesta que já é, há algum tempo, uma realidade cada vez mais presente no cotidiano.

João Bosco
Especialista em Direito Penal do Urbano Vitalino Advogados.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Afinal, quando serão pagos os precatórios Federais em 2025?

19/12/2024

Atualização do Código Civil e as regras de correção monetária e juros para inadimplência

19/12/2024

5 perguntas e respostas sobre as férias coletivas

19/12/2024

A política de concessão de veículos a funcionários e a tributação previdenciária

19/12/2024

Julgamento do Tema repetitivo 1.101/STJ: Responsabilidade dos bancos na indicação do termo final dos juros remuneratórios

19/12/2024