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Desafios para o resgate da moda nacional frente o advento dos sites de vendas de moda estrangeira

Percebe-se que um dos pontos principais de enfraquecimento da Moda brasileira é a desvalorização do criativo interno. Pois, apesar do processo de fabricação chegar em solo nacional, ao menos, por enquanto não se identifica uma valorização à criatividade nacional.

8/6/2023

A problemática sobre as dificuldades enfrentadas pelos negócios de Moda brasileiros sob a perspectiva da competitividade internacional tem sido latente, sobretudo, a questão relativa ao mercado dos sites de vendas de moda chinesa, os quais, em essência, tem cerceado o cenário de Moda regional, nacional e internacional. Tal competitividade deu os passos iniciais, em meados de 1990, com a globalização e, consequentemente, a partir da liberação das importações. A ideia de reunir e compartilhar pessoas, informações, mercadorias, conhecimento, tecnologias e negócios não é recente.1

Culturalmente, o país não estava preparado, vez que há uma preferência dos consumidores brasileiros pelos produtos estrangeiros desde os tempos de colonização. Sabe-se que isto se deu por intermédio de D. Maria I, mãe de D. João VI, em 1785, atividades têxteis no Brasil, com exceção da produção de panos rústicos de algodão para o ensacamento de colheitas e para a confecção das vestimentas mais simples para os escravos2. Tais medidas tinham o escopo de proteger o monopólio europeu. Assim, exsurgiu-se culturalmente a preferência brasileira por produtos de Moda estrangeiros.

Nesse sentido, a China destacou-se como o principal exportador para o país de insumos e produtos acabados, como vestuário e calçados, ou seja, a indústria chinesa opera no campo da Indústria Têxtil-matéria prima e na indústria da Moda -peça pronta.

A problemática concentra-se no crescimento das vendas dos produtos de Moda chineses de modo superior aos produtos nacionais. Pois, tais mercadorias são vendidas pelos sites chineses, no Brasil, especialmente, sites que trabalham com produtos importados e por vezes com qualidade inferior. Nesse cenário, o mercado nacional sofre concorrência desleal, pois notadamente há um descompasso frente o preço ofertado pelo mercado lícito onerado.

Em perspectiva constitucional, a ordem econômica pautada no artigo 170 da Constituição Federal de 1998, é inteiramente violada, em decorrência, de violações à soberania nacional - pela falta de controle interno da economia - à função da propriedade, pela descaracterização dos modelos de negócios lícitos em espaços feitos para engrenagem do mercado nacional se desenvolver, a exemplo do “Centro Fashion-Fortaleza”, que, em regra, surgiu para fomentar o negócio local, mas implicou nas revendas de produtos produzidos em outros países. Dessa forma, vislumbra-se uma grande problemática sobre a precariedade da mão de obra local, ao passo que postos de trabalho são desativados mais facilmente.

 Notadamente os negócios de Moda brasileiros são prejudicados, em decorrência dos tributos incidentes ao setor, ao mesmo tempo, que os negócios chineses não são tributados da forma correta, frise-se quando o são. Pois, há a isenção sobre o Imposto de Importação para remessas internacionais de até US$ 50,0 (cinquenta) dólares para pessoas comuns. Infelizmente, é um meio propenso à fraude face à administração fiscal, pois os sites driblam a tributação nacional ao enviar os produtos como se o remetente fosse apenas pessoas físicas, além de dividir as entregas em remessas com datas distintas para não ultrapassar a isenção.

Nesse sentido, quem acumula os efeitos negativos das irregularidades são os negócios nacionais, principalmente, os pequenos e médios que não possuem acesso aos incentivos fiscais como os grandes negócios. Desse modo, arcam com a folha tributária e, consequentemente, concorrem em desigualdade tanto com o mercado lícito internacional quanto com o ilícito.

O consumo de produtos lícitos estrangeiros, de forma subsidiária pelo consumidor brasileiro, não acarreta problemas, vez que este é o traço da globalização. Mas, o consumo exclusivamente internacional colabora com a limitação do mercado nacional, pois não se “vitriniza” em escala internacional, em decorrência, da falta de aceitabilidade entre os pares.

Na sequência, o mais gravoso é a preferência por produtos de baixo custo, em sites internacionais, os quais não respeitam o sistema tributário nacional e oneram tributariamente o mercado brasileiro.

Recentemente, em 20 de abril de 2023, a Shein que realizará um invenstimento de aproximadamente R$ 750 milhões (setecentos e cinquenta milhões), no Brasil, nos próximos anos para estabelecer uma rede com milhares de fabricantes do setor têxtil no país.

Sob a ótica tributária os problemas em partes denotam solução, pois os impasses da concorrência desleal advindas das manobras irregulares perante à administração tributária diminuirão bruscamente por conta do próprio sistema tributário nacional. Ou seja, outros tributos serão incidentes e com possibilidades de transparênciais fiscais.

Ademais, o problema do esvaziamento do capital social face à desvalorização da mão de obra nacional tem tudo para ser resolvido com a geração de emprego local e, consequentemente, bom impacto na tributação por meio dos impostos incidentes ao mundo laboral, por exemplo, o imposto sobre a renda da pessoa física-IRPF,  a contribuição obrigatória feita pelo empregador ao fundo de garantia por tempo de serviço-FGTS e afins.

No entanto, em relação ao meio ambiente e a concorrência interna legal exurge-se vários problemas, vez que a Shein é uma fast fashion, que significa trabalhar com a ideia de consumação frenética e com alta obsolescência programada. Em conseguinte, a questão da tributação retoma neste ponto mais uma vez, pois por intermedio da função extrafiscal dos tributos o poder público tem o dever de oferecer à sociedade um meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme dispõe o art. 225, caput, da Constituição Federal de 1988. Ou seja, há um gasto público relacionado à coleta de resíduos imprestáveis ao mercado.

Contudo, com os processos fabris, por enquanto, apenas da Shein é uma equação que pode vir ao menos se equiparar melhor, pois sem os processos fabris e com a falta de taxação adequada dos produtos chineses a conta dos prejuízos ambientais advindos da baixa qualidade destes produtos era exatraída de outras fontes.

Nesse sentido, detectam-se melhorias, apesar de a ideia propagada da moda consciente, há anos, face a esses padrões de mercado defenda nitidamente uma regressão aos avanços das políticas ambientadas levantadas por vaários atores da cadeia de moda local.

Por fim, percebe-se que um dos pontos principais de enfraquecimento da Moda brasileira é a desvalorização do criativo interno. Pois, apesar do processo de fabricação chegar em solo nacional, ao menos, por enquanto não se identifica uma valorização à criatividade nacional. Para tal eixo a concorrência será mais evidente. Portanto, é necessária a reflexão acerca de que “um país, o qual não valoriza seus produtos, seus símbolos nacionais e sua língua, gera fragilidade na soberania nacional, bem como no processo de emplacamento internacional do mercado interno, vez que não gera valor”3.

Uma boa contribuição dos consumidores para dirimir as dificuldades dos empreendedores nacionais pauta-se na consciência do consumidor, em optar pelos produtos nacionais e locais sempre que puder.

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1 ACIOLI, Paula. A Culpa é do Rio! A cidade que inventou a moda no Brasil. Rio de Janeiro: Senac, 2019, p.30.

2 ACIOLI, Paula. A Culpa é do Rio! A cidade que inventou a moda no Brasil. Rio de Janeiro: Senac, 2019,p.114.

3 ALVES, Dayane Nayara. Impactos Sociais e Econômicos da Pirataria na Indústria da Moda. Lumen Juris:  Rio de Janeiro, 2021, p.32.

Dayane Nayara Alves
Mestra em Direito Econômico e Desenvolvimento pela UCAM-RJ. Especialista em Direito Fiscal pela PUC-RJ. Foi aluna regular da disciplina de Direito e Economia pelo PPGD-UFRJ. Professora Universitária.

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