Em um mundo pós-moderno, marcado pelo advento da criação da internet na década de 1970 e atrelado a intensa globalização que vivemos diariamente, não seria exagero afirmar que o século XXI é o século em que os direitos sobre a propriedade industrial foram revolucionados, uma vez que, graças às tecnologias, a diversidade e produção de bens imateriais cresceu em uma escala nunca vista antes, especialmente no que se refere à criação de marcas. Por outro lado, a concorrência no mundo marcário também se tornou muito mais agressiva, culminando muitas vezes em situações de concorrência desleal, uma conduta que enseja um crime contra uma marca registrada.
Atualmente no Brasil, os direitos e obrigações concernentes a defesa da propriedade industrial se encontra na lei 9.279/96, também conhecida como Lei de Propriedade Industrial, cujo artigo 2º diz que o registro de marca perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) é a forma pela qual será atribuída a proteção dos direitos tocantes à propriedade industrial, e que por meio dele, será legítimo coibir a concorrência desleal. A concorrência desleal, por sua vez, trata-se de quaisquer ações abusivas, cometidas com o objetivo de angariar consumidores de empresas concorrentes para obter lucros no mercado.
Com base nesse contexto, o registre de marca se torna um passo de extrema importância para garantir a proteção jurídica e o direito exclusivo de uso de uma marca em determinado segmento comercial, uma vez que com o registro, a marca obtém proteção legal para seu nome, logotipo, e outros elementos relacionados à sua empresa. Isso significa que o empreendedor pode usar sua marca sem o medo de que alguém possa copiá-la ou usá-la sem a sua permissão e estará resguardado em casos de práticas de concorrência desleal.
É importante ressaltar que, com a emersão do comércio eletrônico, o registro de marca assumiu uma posição ainda mais relevante, uma vez que, utensílios para promover publicidades pagas, como o Google Ads e o Facebook Ads tornaram ainda mais disputados os canais de busca online enquanto meio de obtenção de clientes pelas empresas.
Ocorre que, diante deste contexto, alguns empresários começaram a usar os canais de busca aplicando palavras-chave que representaria a marca de um concorrente, com o intuito de desviar os clientes do concorrente para a sua própria página. A partir disso, começou-se uma discussão acerca da legalidade ou não do uso de palavras-chave designariam uma marca já registrada no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) por uma pessoa que não é titular da mesma.
Casos em que há tal discussão estão sendo julgados nos tribunais nacionais, onde questiona-se a eventual violação de marca alheia, e também a prática de concorrência desleal.
Nesse sentido, em 2022, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, mediante o REsp 1.937.989, corroborou a interpretação de que usar palavra-chave que contenha elementos de marca registrada que não é da sua propriedade, enseja crime de concorrência desleal. Neste caso, o Relator interpretou que o uso de marca registrada do de concorrente como palavra-chave, visando obter vantagens como aumentar os acessos do website por meio das buscas dos consumidores no Google e desviar a clientela, conforme o artigo 195, inciso III, da LPI, estaria cometendo crime de concorrência desleal. Além disso, também estaria ensejando o crime contra registro de marca, a empresa que, sem autorização do titular, reproduzir marca registrada ao ponto de deixar o cliente confuso acerca da origem do produto/serviço que estaria consumido, segundo o disposto no artigo 189, inciso I, da LPI.
Dessa forma, demonstra-se o precedente que o STJ abriu em matéria de concorrência desleal quanto a utilização de marcas registradas em palavras-chave no comércio eletrônico, assim como, a relevância em registrar uma marca, uma vez que o registro confere dupla proteção ao empresário: protege a marca contra apropriação indevida do uso da mesma, consequentemente na obtenção de vantagem econômica ilícita, bem como desvio desleal dos clientes, e também prevenir que o consumidor seja confundido em relação à origem do produto.
_____________
SANTOS, Márcio. O Uso Indevido de Marcas no Brasil. São Paulo: Saraiva, 2014.
STOLZE, Pablo Luiz Nascimento e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Concorrência Desleal. São Paulo: Saraiva, 2016.
MALTA, Ruy. A Concorrência Desleal nas Ações de Propriedade Industrial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.
MARIANO, Gustavo B. Concorrência Desleal e Direito Marcário. São Paulo: RT, 2013.