Recentemente andei trabalhando em parceria com um colega que, aliás, é um expert na área de recuperação judicial, empresas endividadas e afins, e então comecei a pensar na relação existente entre empresas quebradas e relacionamentos quebrados.
Ele usa muito a palavra “quebra da afectio societatis” e então comecei a me perguntar: seria o divórcio também a quebra da afectio societatis, que, nada mais é, na linguagem das recuperações judiciais e empresas quebradas que a “quebra de confiança”, que, transportando para o casamento seria então a quebra do elo de ligação entre o casal, entre os pares.
Sabe-se que a lei de Falência e Recuperação Judicial (LFR) está em vigor no Brasil desde 2005 e sua finalidade é evitar que empresas com dificuldades financeiras fechem as portas. Para isso, oferece a elas a oportunidade de operar enquanto negociam com os credores sem o risco de terem suas dívidas executadas.
O impacto da recuperação judicial vai além da empresa contemplada ao permitir, por exemplo, a manutenção de empregos, a movimentação da economia, a saúde financeira de fornecedores. É um tema que reúne interesses dos setores privado, público e da sociedade.
A realidade mostra, no entanto, que mesmo com a lei uma quantidade relevante de empresas ainda não consegue evitar a falência. Uma pesquisa da USP realizada por amostragem revela que 46% das grandes e médias companhias que entram em recuperação judicial não conseguem sair da crise.
Outro levantamento, realizado pelo Observatório de Insolvência da PUC-SP, a partir de pedidos de recuperação judicial feitos entre 2010 e 2018 no estado de São Paulo, mostra que quase 60% das empresas não conseguiram sair da recuperação depois dos anos de monitoramento fixados por lei.
E, assim como nas empresas, também nos casamentos a pergunta é: uma vez quebrado há solução? Tem remendo? Na palavras do advogado THIAGO BRESSANI PALMIERI, sócio fundador do TBP Advogados Associados, especialista em recuperações judicias quando as empresas pedem recuperação judicial há um índice de saírem da crise de 70%, mas, nas palavras dele “quem vai no escritório e realmente quer resolver, ou seja, quer cumprir o plano de recuperação, e faz tudo direitinho, em 70% dos casos se recupera”. O que seria então o fazer tudo direitinho para tentar “salvar” um casamento? Terapia de casal, mediação, constelação familiar, diálogo, e, alguns jantares a luz de velas com crianças na casa dos avós!
E, Thiago continua: “falência é o desastre. É o divórcio. E, na tentativa de salvar a empresa ou o casamento, você precisa fazer várias concessões e você precisa querer muito. Tem que traçar um plano, cumprir um plano e não pode quebrar o plano”.
Fazendo uma analogia a crise no casamento (nas relações de um modo geral), fazer terapia de casal, mediação, constelação familiar, a meu ver, também pode ser uma solução para novos rumos de uma relação? Será que as relações pessoais podem, de alguma forma se assemelhar as relações empresariais? Serão as mediações de conflito uma espécie de recuperação judicial para as relações entre pares? Em recente pesquisa a mediadora Fernanda Levy me contou que, em casos de crises no casamento a mediação consegue resgatar 70% das relações.
As dívidas financeiras, para bancos, fornecedores podem, através da recuperação judicial ter um prazo para pagamento, ou, pagamento em doses homeopáticas, com deságio e redução de juros e através desta “ajuda” que a lei assegura aos devedores há grandes chances de recuperação. Estatisticamente falando quando chegam clientes na TBP Advogados Associados, 60% se recuperam e seguem adiante, mais fortalecidos do que antes.
Já nas relações, quando em crise, os envolvidos, a nosso ver, não têm a mesma facilidade e empatia para aceitar “concessões”, acordos e afins, porque, quando algo já está prestes a falir, diferente das recuperações judiciais, as partes envolvidas não estão mais dispostas a tentar e tentar e talvez por isto muitas relações terminem antes de terem tentado se recuperar.
Por que será que temos tanta paciência para lidar com dinheiro, com negócios e temos menos paciência para lidar com a gente mesmo?
Uma relação em recuperação judicial também merece ser olhada com carinho, também merece deságios, prazos e, sobretudo, paciência. Alguns ajustes no meio do caminho podem fazer com que sociedades, conjugais ou não, se refaçam, se restabeleçam de um jeito mais forte.
Para muitos casais, separar representa desordem emocional, financeira e familiar que produz desequilíbrio na família em virtude das mudanças e perdas.
Trata-se de uma transição complexa que compreende tarefas emocionais que precisam ser elaboradas e completadas para a superação além de outras questões relacionadas às mudanças que atingem a vida de cada cônjuge.
A maneira como a situação é interpretada pode contribuir de forma positiva ou negativa no manejo do processo, e ai, a nosso ver entram as mediações, constetações e muito diálogo porque se o processo for enfrentado e bem manejado é possível que as transformações sejam positivas resultando no amadurecimento emocional e na disponibilidade para um novo jeito de ser e viver, capaz de representar a felicidade não encontrada no casamento, dentro dele ou, apesar do fim dele.
A percepção de que os estressores (mudanças, perdas e períodos de instabilidade) que envolvem a separação são desafios manejáveis, auxilia no encorajamento para a tomada de decisão e no enfrentamento deste período caracterizado como situação de crise, aliás, segundo Dr. Thiago, lidar com crises é sua expertise: “as pessoas ficam mais confortáveis na crise, a descarga de adrenalina e de outros hormônios os mantém vivas e ativas” (sic).
Muitas vezes a principal causa de sofrimento está na dificuldade por parte dos cônjuges em lidar com suas cargas emocionais e medo da mudança. Na maioria das vezes o ser humano desde cedo é ensinado e incentivado a crescer, casar e ter filhos.
Esta é a ordem esperada pela família e sociedade. Separar geralmente se aprende na prática, entre a dor e a ruptura. Fim do Casamento
O ser humano carrega consigo ansiedades inatas que se ativam em cada processo de separação, desde as separações de fácil superação até as mais complexas. Fim do Casamento
A separação conjugal está entre as separações mais complexas uma vez que não basta apenas declarar o fim da relação, mas também lidar com a ansiedade de separação, tomar decisões, elaborar o término e ainda enfrentar um luto ao longo de um período que pode ser mais ou menos intenso conforme a pessoa e situação, e aqui, repetimos, existem recuperações judicias que dão certo e outras que se convolam em falência, como no casamento e divórcio.
Elaborar significa pensar, assimilar e aceitar uma idéia que implica em profundas mudanças tanto a nível pessoal como na condição de vida. É um processo caracterizado por diferentes fases desde a tomada de decisão até o desfecho final do luto.
Pular etapas através de condutas impulsivas e arranjo de novos relacionamentos não são estratégias que amenizam o sofrimento ou aceleram o processo de luto. Fim do Casamento
É importante o entendimento de que a separação para ser consolidada deve ocorrer nos três aspectos: físico, emocional e compromisso conjugal.
Em outras palavras o casal deve fazer a separação de corpos, trabalhar o desligamento emocional e desfazer os acordos que envolvem o casamento, desde judicial até responsabilidades financeiras e estes acordos exigem tempo, paciência e muito diálogo, assim como negociar as dividas com o banco e NÃO PODE QUEBRAR O PLANO antes dele ser aprovado e ambas as partes precisam querer muito e estar dispostas a isto.