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A imunidade parlamentar supera a falta de decoro social?

É importante asseverar que a imunidade parlamentar, eis que decorrência da necessidade de exercício desimpedido do mandato, só é reconhecida quando o parlamentar está, de fato, no exercício de suas funções, portanto, vestindo o manto do cargo a si atribuído, ainda que fora da casa legislativa a que é vinculado.

28/4/2023

Dentre as notícias que mais chamaram a atenção da sociedade nos últimos dias, está a trama envolvendo o atual Senador Sérgio Moro, ex-Juiz Federal que ganhou notoriedade em razão de sua atuação na operação Lava Jato, e o ministro do STF Gilmar Mendes, vitimizado por dizeres que fizeram menções a possível venda de decisões por parte do magistrado da mais alta Corte do país.

Ademais, todo o ocorrido foi filmado e divulgado nas redes sociais, resultando em denúncia ofertada pela Procuradoria Geral de República (PGR), a qual pediu, a prisão de Sérgio Moro em caso de condenação pelo crime de calúnia, previsto no Art. 138 do Código Penal.

Neste cenário, cabe uma breve análise de alguns institutos envolvidos entrevero jurídico-político, como a imunidade parlamentar, espécie de manto de proteção que objetiva que o representante de determinada parcela da sociedade possa exercer o mandato político que lhe foi outorgado de forma livre e desimpedida.

Logo, os Senadores da República, por força do Art. 53 da Constituição Federal, são imunes civil e penalmente em suas opiniões, palavras e votos, não podendo ser responsabilizados criminalmente por eventuais ofensas a terceiros, estando exposto apenas aos riscos de macular a sua reputação política.

Todavia, é importante asseverar que a imunidade parlamentar, eis que decorrência da necessidade de exercício desimpedido do mandato, só é reconhecida quando o parlamentar está, de fato, no exercício de suas funções, portanto, vestindo o manto do cargo a si atribuído, ainda que fora da casa legislativa a que é vinculado.

Nesta linha, estaria afastada a proteção constitucional no caso em comento, vez que os dizeres supostamente caluniosos teriam sido proferidos fora do exercício das funções parlamentares mas, ao invés disto, conforme comprovam as gravações divulgadas, sucederam-se em evento social privado, despido de cunho político.

Por outro lado, sabe-se que o crime de calúnia, o qual fora imputado pela PGR, pune a conduta daquele que imputa a outrem, falsamente, uma conduta criminosa, tal como o crime de corrupção passiva, no caso em tela.

Não obstante, apesar da gravidade do cenário político que se desenhou nos últimos anos, inclusive envolvendo os mesmos personagens destacados, é importante que se reflita acerca da intenção como veículo propulsor da tipicidade do crime de calúnia – o que, nas ciências criminais, chama-se de “elemento volitivo da conduta”.

Isto é, caso o objetivo da manifestação tenha sido meramente jocoso, manifestado em ambiente particular cujo contexto caracteriza um momento de descontração em ambiente privado, estaria esvaziada a responsabilização criminal pelo crime de calúnia, tendo em vista que o delito imputado trás como elemento essencial a intenção do agente de ferir a honra objetiva da vítima – a reputação que a pessoa tem perante a sociedade.

Deste modo, ainda que inadequada a conduta do parlamentar – como pode vir a ser rotulada -, convém refletir, uma vez mais, acerca da dilatação do Direito Penal para punir condutas que, numa análise atenta do operador do Direito, não ferem os bens jurídicos tutelados pelos dispositivos penais, dando espaço para o uso da persecução criminal para fazer guerra política, ao passo que as medidas cíveis e disciplinares atenderiam à repreensão dos excessos.

Leonardo Tajaribe Jr.
Advogado Criminalista. Especialista em Direito Penal Econômico (COIMBRA/IBCCRIM). Pós-Graduado em Direito Penal e Processual Penal (UCAM).

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