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Rescisão do acórdão que assegurava a não incidência do IPI na revenda de produtos importados

Ao que tudo indica essas decisões confundem a igualdade jurídica que determina tratamento diverso ante situações diferentes e tratamento isonômico diante de situação iguais.

19/4/2023

Como já escrevemos anteriormente tanto a jurisprudência do STJ, como a do STF levou muito tempo para se consolidar no que concerne à incidência do IPI no desembaraço aduaneiro e também na revenda do produto importado, independentemente de nova industrialização.

A oscilação da jurisprudência do STJ seguiu a evolução da jurisprudência do STF. Daí a não incidência do imposto durante certo tempo para, ao depois, decidir pela dupla incidência do IPI no caso de produto importado.

Isso aconteceu por mais de uma vez, trazendo muita insegurança jurídica para os contribuintes.

Essa alteração de entendimento da jurisprudência de nossos tribunais revela a falta de conhecimento acerca do fato gerador do IPI, que é a industrialização do produto e não a sua saída do estabelecimento, como ocorre em relação ao ICMS.

À época em que vigorava a jurisprudência do STF no sentido da não incidência dupla, determinada empresa logrou obter no STJ uma decisão desonerando-a do pagamento do IPI na revenda do produto importado. A decisão transitou em julgado.

Tendo em vista a mudança de jurisprudência do STF e também do STJ, a Fazenda Nacional ingressou com a ação rescisória contra aquela decisão transitada em julgado.

Em recente julgamento o STJ deu pela procedência da ação rescisória invocando o princípio da isonomia e o princípio de livre concorrência, porque aquela empresa detentora da coisa julgada deixaria de pagar o IPI na revenda, ao passo que as demais empresas estariam sujeitas ao pagamento do IPI na saída do estabelecimento industrial (AR 6.015).

Em primeiro lugar,  esse V. Acórdão violou a Súmula 343 do STF que assim prescreve:

“Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.”

É o caso sob exame. Quando aquela empresa obteve a desoneração da dupla tributação  perante o STJ, a jurisprudência do STF não mais exigia o IPI na revenda de produto importado.

Essa Súmula teve por objetivo maior a preservação do princípio da segurança jurídica, assegurando que o contribuinte não seja obrigado a dançar conforme a música tocada pelos tribunais, que vêm intercalando ritmos diversos ao longo do tempo.

Em segundo lugar, a manutenção da coisa julgada pela não incidência do IPI na revenda não viola o princípio da isonomia. Ao contrário,  a sua tributação na revenda é que importaria na afronta ao princípio da igualdade, à medida que o produto importado é duplamente tributado (no desembaraço aduaneiro e na revenda), ao passo que, o produto similar nacional paga uma única vez, quando o produto sai do estabelecimento industrial.

Quanto à invocação do princípio da livre concorrência, informador da ordem econômica, a sua invocação neste caso sob análise é absolutamente impertinente.

A empresa que logrou decisão judicial para não pagar o IPI na revenda esforçou-se para obtenção desse resultado, em contraste com as demais que se quedaram inertes deixando de questionar judicialmente o imposto tido como inconstitucional na época.

Se formos dar guarida a tese sustentada pelo STJ temos que uma empresa mais eficiente promove a quebra do princípio da livre concorrência ante as demais empresas tidas como ineficientes.

Assim sendo, a empresa eficiente deveria ser condenada a perder essa eficiência, para que todos pudessem atuar sob o regime da livre concorrência!

Como se vê, as razões invocadas pelo V. Acórdão que rescindiu a coisa julgada não se sustentam.

Cremos que essa decisão é mero reflexo das recentes decisões da Suprema Corte que determinaram a reversão automática da coisa julgada na superveniência de decisões em contrário proferidas nas ações de controle concentrado e no Recurso Extraordinário sob égide de repercussão geral (Temas 881 e 885)

Ao que tudo indica essas decisões confundem a igualdade jurídica que determina tratamento diverso ante situações diferentes e tratamento isonômico diante de situação iguais, com a igualdade material não passível de ser exigida legalmente ou por via de jurisprudência. Todos nascem iguais em direito, mas, todos nascem diferentes uns dos outros.

Kiyoshi Harada
Sócio do escritório Harada Advogados Associados. Especialista em Direito Tributário pela USP. Presidente do Instituto Brasileiro de Estudos de Direito Administrativo, Financeiro e Tributário - IBEDAFT.

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