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Vida de advogada não é fácil: sustentação oral

Essa foi a minha experiência mais recente de quase sustentação oral.

20/3/2023

Tem advogado que adora fazer sustentação oral. Subir na tribuna, vestir a beca e discorrer com ênfase e emoção, não raro exageradas, sobre todas as razões pelas quais – evidentemente – o seu cliente tem razão. 

Não é meu caso. Não gosto de ser o centro das atenções, fico nervosa, com medo de esquecer tudo ou de não falar bem. Acho que escrevo muito melhor do que falo, então toda vez que um julgamento importante é marcado e preciso me inscrever para a sustentação oral, a primeira coisa que faço é me lamentar: – Mas para que isso, está tudo escrito lá, basta ler o memorial; – Ninguém presta atenção a todas aquelas sustentações mesmo; – Por que as faculdades não ensinam oratória? Sabia que devia ter feito um curso disso, vou fazer (só que nunca faço...). 

Passada a fase de negação, todavia, é hora de encarar a realidade e se preparar para a tarefa inglória.

No meu caso, quase sempre os memoriais já estão prontos quando o recurso é pautado, mas se não estiverem, é necessário prepará-los, já que é essencial despachá-los com os julgadores, sobretudo em casos relevantes. Aliás, acho isso bem mais efetivo do que o teatro em si que é a sustentação oral, principalmente quando o julgador interage com você, presta atenção no que você está falando, faz perguntas e anotações (não é sempre). 

Afora os memoriais, faço um resumo de tudo o que aconteceu no processo, para não correr o risco de me perguntarem alguma coisa que eu não saiba. Além disso, e muito importante, preparo notas resumidas do que deve ser dito na hora da sustentação. Aqui, uma grande dica que me deram e que acho que realmente funciona é centrar no essencial e elaborar as notas usando palavras chaves e não texto corrido. Isso é relevante para que, no grande momento, você não se sinta obrigado a repetir cada palavra do texto perfeito que preparou, o que permite que a sua fala flua mais naturalmente. 

Aí é preparar as notas, refazer, mudar a ordem, cortar partes, devolver as partes cortadas, voltar à primeira ordem, até achar que ficou bom. 

Finalizado o roteirinho, na véspera e/ou na manhã do julgamento, treino bastante a sustentação. Praticamente decoro tudo, até os improvisos. Importante cronometrar o tempo, já que existe um limite de 15 minutos, em regra mais do que suficientes. Vale falar em frente a um espelho, gravar, convocar marido, pai, mãe ou colegas – as vítimas – para assistirem e julgarem. Óbvio que o look advogada-poderosa-e-confiante é cuidadosamente escolhido na véspera também. 

Ao menos para mim, todo esse treinamento é necessário para controlar o nervosismo e para me aprimorar em uma tarefa que não é das minhas favoritas (mil vezes escrever tudo!).

Eis que, no grande dia, chego com antecedência ao Tribunal levando o resumo, as notas e uma garrafinha de água, faço todos os exercícios respiratórios que conheço, até que chamam o meu processo e a relatora pergunta: – Doutora, você está pelo apelante ou pelo apelado? – Pelo apelante, respondo eu, já prevendo o que vinha pela frente, em razão dos julgamentos anteriores.

– Em sendo assim, segue a relatora, acredito que não haverá necessidade de sustentação oral, pois o apelado não está presente e estou dando provimento ao seu recurso. 

Então bate aquele misto de alívio com alguma frustração. Ganhei o caso, é o que importa, me livrei da sustentação, que não queria mesmo fazer, mas puxa vida, depois de todo aquele calvário...

Enfim, vida que segue. Essa postura, vale dizer, tem sido uma constante nos Tribunais, como forma de acelerar a pauta, pois de fato não faz sentido ouvir os advogados quando os julgadores já sabem que atenderão aos pedidos dos que estavam presentes para sustentar. Celeridade processual. 

O triste é que, se a outra parte não estiver lá e mesmo assim te deixarem sustentar, você já sobe desanimado na tribuna, sabendo que virá voto contrário do relator, somente na esperança de conseguir uma divergência ou um pedido de vista. 

Por outro lado, obtida a divergência e, quiçá, uma vitória majoritária, a conquista é ainda mais especial. Acreditem: foi o que aconteceu na primeira sustentação oral, há muitos e indiscretos anos, perante uma turma recursal de juizado especial. Certamente sorte de principiante. Ou os julgadores se compadeceram de mim.

A lição que fica é que nos resta fazer o nosso trabalho da melhor maneira possível, nos preparando ainda melhor para as atividades que reputamos mais desafiadoras ou menos confortáveis. Até porque, no caso da sustentação oral, somente na hora saberemos se ela será ou não necessária. Então temos que estar prontos.  

Essa foi a minha experiência mais recente de quase sustentação oral. Ganhei o caso, mas ficou aquela pontinha de desapontamento. Fica para a próxima. Tomara que demore.

Vida de advogada não é fácil. Mas a gente segue aprendendo. 

Eliane Leve
Advogada, sócia do escritório BCW Advogados. Formada em Direito pela UERJ, especialista em direito civil-constitucional pela UERJ e em direito contratual pela FGV.

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