São mais de mil pessoas detidas, outras centenas fichadas e algumas dezenas procuradas pela Polícia Federal no Brasil pelo vandalismo ocorrido no dia 8 de janeiro, em Brasília, quando o Palácio do Planalto, o Congresso e o Superior Tribunal Federal (STF) foram depredados por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). A cobertura massiva da imprensa e a pressão política induzem que houve terrorismo e os golpistas podem pegar até 38 anos de prisão, se forem responsabilizados por todos os crimes que teriam sido cometidos.
As imagens da TV e do circuito particular dos prédios públicos, o depoimento de policiais em trabalho e as postagens em redes sociais não deixam dúvidas de uma organização antecipada e serão usados para identificar e qualificar o vandalismo. O que se espera da Justiça é a tipificação e a condenação individual pela participação de cada denunciado, inclusive dos que financiaram o ato na Praça dos Três Poderes e que não apareceram no dia 8 para o "serviço". Então, tudo indica que quem fez conspiração em público ou destruiu o patrimônio do Estado, mesmo que tente apagar os rastros, terá de prestar contas com o judiciário. E não vai demorar.
Existem indícios de que um mutirão será feito pelas polícias e por membros do judiciário para ouvir os depoimentos, analisar os processos, denunciar, julgar e condenar. Em uma velocidade que a Justiça brasileira não está acostumada, semelhante ao que ocorreu nos EUA com a punição aos trumpistas que invadiram o Capitólio, em janeiro de 2022. A meta é colocar algumas centenas atrás das grades como exemplo por conspirar contra a democracia. E vai haver Justiça ou bodes expiatórios na punição?
Polêmica partidária e ideológica à parte, é fato que nem todos que vestiram a camisa amarela e foram a Brasília no dia 8 de janeiro podem ser considerados vândalos, terroristas, golpistas ou atentaram contra o estado democrático de direito. Tampouco deixaram de cometer crimes os que fizeram Pix (mesmo que o valor seja de R$ 1,00) para ajudar na gasolina, no aluguel de ônibus e na alimentação. Eles estão sujeitos a serem enquadrados em organização criminosa, tentativa de golpe e agressão (policiais e jornalistas).
Desde o dia 8, juristas brasileiros debatem sobre a punição aos vândalos e aos que financiaram os atos em Brasília. Foram elencados diversos delitos diretos e indiretos cometidos, o caminho a ser seguido pelo Ministério Público Federal nas denúncias e a possibilidade de sentença a ser dada pelos juízes. A principal divergência está no enquadramento dos vândalos na lei 13.260, de 2016, a lei do Terrorismo, pois até mesmo os ministros do STF não estariam dispostos a sustentar essa argumentação para condenação de até 12 anos de reclusão ao condenado por esse artigo. Alívio? Não! Há outros crimes que somados podem dar até 12 anos de cadeia.
Encontrar o caminho equilibrado para a defesa fará a diferença em pegar de 3 a 6 meses de cadeia, no caso se for denunciado e condenado apenas por fazer ameaças, ou 38 anos de reclusão, se forem "responsabilizados civil, política e criminalmente pelos atos atentatórios à democracia, ao Estado de Direito e às instituições", conforme prometeu o ministro Alexandre de Moraes.
Poderá ocorrer num erro grave se as defesas dos réus seguirem a linha ideológica direitista, como está se verificando nos últimos dias nos noticiários e em posts de advogados nas redes sociais. Nenhum juiz aceitará como justificativa para o vandalismo o direito à livre expressão política. Uma retórica bolsonarista que precisa ser abandonada pelo advogado de defesa se a proposta é evitar uma pena pesada. Lembre-se: o patrimônio público foi depredado e pessoas foram machucadas. Se há ou não infiltrados de esquerda, houve organização e líderes que se diziam partidários do ex-presidente Bolsonaro e se declaram patriotas. É preciso esquecer a retórica e se ater aos fatos ocorridos.
Nos últimos anos, assistimos a decisões do Judiciário que foram consideradas atos políticos/partidários e até motivaram discussões acaloradas nas eleições presidenciais. Desta vez, com fartas provas produzidas pelos réus (vídeos em redes sociais e depósitos bancários rastreáveis), alguns personagens do trágico dia 8 de janeiro não vão escapar da punição. A defesa ideológica, desta vez, não assegura liberdade. A fundamentação jurídica bem feita fará a diferença a partir de agora.