Migalhas de Peso

Medidas tributárias recentemente adotadas pelo novo Governo Federal

São estas, prezado leitor, nossas breves considerações sobre as alterações tributárias do novo Governo Federal.

15/3/2023

Recentemente, os contribuintes foram surpreendidos com uma grande gama de alterações substanciais nas engrenagens tributárias do país.

Essas alterações podem ser vistas como um pacote, pois foram disponibilizadas em um curto período de tempo (de dezembro até agora).

Contudo, as alterações emanam de múltiplas frentes, e não de um único comando legal.

Essas medidas, como já deve suspeitar o nosso leitor, não são benéficas aos contribuintes. Elas buscam o aumento da arrecadação por via oblíqua, carreando recursos financeiros para cobrir uma expectativa de gastos um tanto quanto perdulários do Governo Federal.

Nesse pacote de alterações, estão abarcadas as Medidas Provisórias (MPs) 1.159/23 e 1.160/23, que alteraram as leis 10.637/02, 10.833/03 e 13.988/20. Além dessas MPs, a Portaria Conjunta da Receita Federal do Brasil (RFB) e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) 1, de 12/01/23. E, por fim, o decreto 11.379/23.

Primeiramente, é importante ressaltar que as alterações realizadas pelas medidas provisórias possuem força de lei, e são editadas pelo Presidente da República em situações de relevância e urgência. Elas produzem efeitos jurídicos pelo prazo de até 120 dias, mas, para que continuem produzindo efeitos após esse prazo, precisam ser convertidas em Lei pelo Congresso Nacional.

No processo de conversão da medida provisória em lei, os Congressistas podem alterar a redação original, apresentando emendas. Podem, ainda, rejeitar a MP ou, sequer analisá-la, hipótese em que resulta invalidada desde a sua edição.

Voltando às mudanças, abordaremos as principais alterações no processo administrativo fiscal. Elas são três:

Após nossas breves considerações sobre o processo administrativo federal, passamos às demais mudanças.

As demais mudanças possuem um tino um tanto quanto – para não dizer totalmente - arrecadatório. A MP 1.159/23, por exemplo, alterou as leis 10.637/02 e 10.833/03, vedando, por alegada “decorrência lógica”, os créditos de PIS/COFINS nas aquisições. Se o ICMS deve ser excluído da base de cálculo do PIS/COFINS nas vendas, conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF), não deve ser base de cálculo dessas mesmas contribuições quando das compras. Essa é a infundada “decorrência lógica” alegada pelo Governo Federal.

Porém, é possível deixar de fora dos efeitos negativos alguns contribuintes, pois, quando a MP determina a exclusão do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição, ela deixa de fora a exclusão do ICMS sobre transportes e comunicações.

E isso porque o ICMS apresenta duas hipóteses de incidência: (i) operações relativas apenas à circulação de mercadoria; e (ii) prestações de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicações. As mercadorias são adquiridas, enquanto os serviços são tomados, na própria terminologia do ICMS. Assim, se a vedação recai sobre as aquisições, por evidente que não se aplica à tomada de serviços.

Há também o Programa de Redução da Litigiosidade Fiscal (PRLF), prevista na Portaria Conjunta RFB/PGFN nº 1, cujo objetivo é permitir a realização de acordo entre contribuintes e a União, abrangendo apenas os créditos tributários em contencioso administrativo fiscal com recurso pendente de julgamento e que sejam de pequeno valor (nas DRFJs ou no CARF). A adesão a esse Programa pode ser feita a partir de 1º de fevereiro de 2023 até 31 de março de 2023, havendo as seguintes modalidades:

Adesão com utilização de créditos decorrentes de Prejuízos Fiscais e de Base de Cálculo Negativa da CSLL apurados até 31/12/21 - para créditos em discussão nas DRJs ou no CARF.

O percentual efetivo de desconto observará a capacidade de pagamento do contribuinte (sendo maior para créditos classificados como irrecuperáveis/de difícil recuperação e menor para os classificados com alta/média perspectiva de recuperação).

Nessa modalidade de transação poderão ser incluídos débitos constituídos cujo vencimento da multa de ofício tenha ocorrido antes da publicação da Portaria.

Adesão independente da capacidade de pagamento do contribuinte ou classificação da dívida, relativa a créditos com valor de até 60 (sessenta) salários-mínimos que tenham como sujeito passivo pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte, os quais poderão ser negociados no âmbito do PRLF.

Nessa modalidade de transação, poderão ser incluídos os créditos inscritos na dívida ativa da União há mais de 01 (um) ano.

Os benefícios variam de acordo com a classificação do crédito tributário: se forem classificados como irrecuperáveis, o contribuinte poderá obter uma redução de até 100% dos juros e da multa, devendo adiantar 30% do saldo devedor em dinheiro, em até 9 parcelas, e, para o remanescente, poderá usar prejuízo fiscal/base negativa da CSLL., se possuir.

Se o crédito for classificado como de alta ou média capacidade de recuperação, o que muda é que o contribuinte deverá adiantar 48% em até 9 parcelas.

A Portaria em comento não se aplica aos créditos apurados na forma do Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte - Simples Nacional, instituído pela lei Complementar 123/06.

Outro ponto é o decreto 11.374/23, do atual Governo, que revogou o decreto 11.322/22, publicado pelo Governo anterior ao apagar das luzes. O decreto revogado reduzia as alíquotas do PIS/COFINS sobre receita financeira em 50% (as alíquotas passaram de 0,65% e 4% para 0,33% e 2%).

Com a revogação das reduções, em teoria, as alíquotas retornariam aos patamares anteriores à redução (de 0,65% e 4%) já a partir da data da publicação do citado decreto 11.374/23, ou seja, a partir de 02/01/23. Dissemos “em teoria” uma vez que, havendo aumento de contribuições sociais, como é o caso do PIS/COFINS, deve ser observado o instransponível Princípio constitucional da Anterioridade Nonagesimal, segundo o qual a majoração das alíquotas do PIS/COFINS somente pode entrar em vigor 90 dias após a publicação do já referido decreto 11.3674/23.

Os contribuintes, assim, poderão recorrer ao Judiciário contra o aumento das alíquotas a partir da publicação do decreto, com grandes chances de êxito.

O mesmo decreto 11.374/23 revogou a redução das alíquotas do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), elencadas no art. 6º, da lei 10.893/04, concedidas pelo Governo anterior via decreto 11.321/22. Do mesmo modo, em teoria, voltariam a vigorar as antigas alíquotas (40% para a modalidade Fluvial/lacustre ou 8% para as demais modalidades). Ocorre que, caracterizando-se o AFRMM como uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE), a majoração das alíquotas somente poderá entrar em vigor a partir de 01/01/2024, por força do Princípio Constitucional da Anterioridade da Lei. Neste caso, os contribuintes que desejarem continuar praticando as alíquotas reduzidas ao longo de todo ano de 2023 poderão recorrer ao Poder Judiciário com boa possibilidade de êxito. Já há, inclusive, liminar afastando o aumento em 2023.

São estas, prezado leitor, nossas breves considerações sobre as alterações tributárias do novo Governo Federal.

Rafael Maldonado Canesso
Semi Sênior da Divisão do Contencioso da Braga & Garbelotti - Consultores Jurídicos e Advogados.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

A relativização do princípio da legalidade tributária na temática da sub-rogação no Funrural – ADIn 4395

19/11/2024