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A hermenêutica jurídica e a suposta benesse aos devedores

A despeito do princípio da menor onerosidade ao devedor, é essencial que os Tribunais não apenas façam uso da correta interpretação das normas, mas também que sigam validando e regulamentando as novas medidas constritivas.

2/3/2023

Para facilitar a discussão, sem se valer de doutrinadores clássicos e outros termos essencialmente jurídicos, é necessário deixar claro que a hermenêutica jurídica nada mais é do que o ramo da hermenêutica (filosofia que estuda a teoria da interpretação) que se ocupa da interpretação das normas jurídicas. Simples assim.

Neste sentido, nos valemos da hermenêutica jurídica toda vez que uma lei precisa ser interpretada.

Pois bem. Trazendo a narrativa para o campo da sua utilização no Judiciário, é importante contextualizar que os números anualmente divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) demonstram o quão impactante é o volume de ações de execuções (ou em fase de execução), contribuindo diretamente para a morosidade do próprio Judiciário.

Dentro deste contexto, estamos diante de uma delicada contraposição entre a criação e validação de novas medidas constritivas , visando potencializar o nível de satisfação das execuções, e um contexto legal e de hermenêutica jurídica em que a execução deverá ser promovida pelo modo menos danoso ao executado².

Para fomentar essa discussão, o STJ – Superior Tribunal de Justiça veiculou recentemente uma notícia³ posicionando um holofote em um acórdão publicado no final de 2022, o que terminou por reforçar a importância de se efetuar a interpretação do texto legal de maneira a garantir ao devedor uma posição mais favorável (menos onerosa).

Importante destacar que a legislação vigente não visa proteger o devedor, todavia, seguindo as regras de hermenêutica e os princípios vigentes, visa que a execução seja efetivada sem que haja qualquer atropelo ao texto da lei.

No caso concreto, o devedor poderia ter se valido de uma impugnação à penhora, prevista expressamente no art. 525 do CPC, contudo, entendeu que o agravo de instrumento, recurso previsto no art. 1.015 do mesmo código, lhe era mais conveniente para buscar a reforma da decisão que havia determinado a penhora de seus bens.

O STJ, portanto, se valeu da interpretação de que a impugnação não está na lei como requisito indispensável para a interposição do agravo de instrumento e que as exceções devem ser interpretadas restritivamente, mantendo o provimento do agravo dado pelo Tribunal local.

A decisão se mostra acertada, não apenas pelas regras de interpretação vigentes, mas também pelo quanto previsto no próprio CPC. Todavia, faz com que a sensação de impunidade, diante do elevadíssimo número de execuções frustradas, seja inevitável.

Nesse sentido, a despeito do princípio da menor onerosidade ao devedor, é essencial que os Tribunais não apenas façam uso da correta interpretação das normas, mas também que sigam validando e regulamentando as novas medidas constritivas (SNIPER)4, preservado igualmente o princípio da efetividade da execução, considerando também o interesse do credor, que por muitas vezes acaba sendo negligenciado.

Bruno Maglione
Sócio do Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados (FF Advogados), responsável pelas áreas de contencioso cível, arbitragem e imobiliário. Mestre em Direito dos Negócios pela FGV/SP.

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