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A adjudicação compulsória via cartório veio pra ficar!

A adjudicação compulsória extrajudicial pode ser feita em qualquer cartório de notas, tendo como documento inicial a elaboração de uma Ata Notarial (feita pelo tabelião de notas).

23/2/2023

A transferência compulsória de títulos de imóveis agora pode ser feita via cartório, conforme prevê o artigo 11, da lei 14.382/22.

Antes, a adjudicação compulsória de imóvel só podia ser feita pela via judicial e demorava longos anos para conclusão.

Agora, extrajudicialmente, o procedimento é mais barato e o tempo médio pode cair para até 3 meses, dependendo do caso.

Além de regulamentar o Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP), trazendo uma perspectiva de facilitação de acesso aos serviços de registros públicos por meio eletrônico, a citada lei alterou uma série de dispositivos da Lei de Registros Públicos (lei 6.015/73).

Na teoria do direito material, a adjudicação compulsória encontra-se prevista nos artigos 1417 e 1418, do Código Civil, a saber:

“Art. 1.417. Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel.”

“Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.”

Ocorre que, de acordo com a súmula 239, do Superior Tribunal de Justiça “o direito à adjudicação compulsória não se condiciona ao registro do compromisso de compra e venda no cartório de imóveis”, ou seja, a existência do instrumento público ou particular, mesmo sem o registro imobiliário, possibilita a adjudicação.

Nesse liame, em termos procedimentais, a nova lei 14.382/22 trouxe à lei dos registros públicos a adjudicação compulsória extrajudicial, inserida no artigo 216-B:

“Art. 216-B. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo.

§ 1º São legitimados a requerer a adjudicação o promitente comprador ou qualquer dos seus cessionários ou promitentes cessionários, ou seus sucessores, bem como o promitente vendedor, representados por advogado, e o pedido deverá ser instruído com os seguintes documentos:

  1. instrumento de promessa de compra e venda ou de cessão ou de sucessão, quando for o caso;
  2. prova do inadimplemento, caracterizado pela não celebração do título de transmissão da propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, contado da entrega de notificação extrajudicial pelo oficial do registro de imóveis da situação do imóvel, que poderá delegar a diligência ao oficial do registro de títulos e documentos;
  3. ata notarial lavrada por tabelião de notas da qual constem a identificação do imóvel, o nome e a qualificação do promitente comprador ou de seus sucessores constantes do contrato de promessa, a prova do pagamento do respectivo preço e da caracterização do inadimplemento da obrigação de outorgar ou receber o título de propriedade;
  4. certidões dos distribuidores forenses da comarca da situação do imóvel e do domicílio do requerente que demonstrem a inexistência de litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;
  5. comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
  6. procuração com poderes específicos.”

A adjudicação compulsória extrajudicial pode ser feita em qualquer cartório de notas, tendo como documento inicial a elaboração de uma Ata Notarial (feita pelo tabelião de notas).

Tem cabimento nos casos em que há uma promessa de compra e venda de imóvel e o vendedor se recusa a cumprir um contrato pactuado e já quitado, ou que tenha ocorrido sua morte ou declarada sua ausência, existindo incapacidade civil ou localização incerta, casos em que a construtora faliu, desapareceu ou encerrou suas atividades, tendo o comprador quitado o imóvel e não consegue ter o título de propriedade, ou seja, não consegue dispor do bem por completo, seja para alugar, vender ou dar como garantia.

Numa dessas hipóteses, o interessado deve iniciar por contratar um advogado de sua confiança, pois a lei exige a assistência jurídica e assinatura do mesmo, dirigir-se ao cartório de notas, e dar entrada ao procedimento, visando a lavratura de uma Ata Notarial.

Esse é o documento onde o interessado deverá comprovar que a outra parte contratante está devedora do título de propriedade. Ela pode ser o promitente vendedor (pessoa que prometeu vender) ou promitente cedente (contratos de gaveta).

Um dos requisitos exigidos é que, caso o adquirente do imóvel tenha judicializado uma adjudicação compulsória, deverá postular a desistência/extinção da referida ação, através do respectivo advogado que a patrocina, para que possa iniciar o procedimento administrativo (via cartório).

O interessado deverá fazer prova ao tabelião da quitação do negócio jurídico, mediante a apresentação de diversos documentos, tais como: declaração de imposto de renda, mensagens de e-mails e/ou de mídias digitais trocadas entre os negociantes, além de extratos bancários ou cópias de cheques que indiquem transferências de valores, bem como outras provas que não estejam demonstradas por documentos, que comprovem o recebimento pelo vendedor e sua injusta recusa em outorgar-lhe a escritura definitiva do bem.

Quanto aos documentos necessários, o requerimento de adjudicação compulsória extrajudicial deverá conter:

  1. instrumento particular de compromisso de compra e venda, ou documento que comprove a cessão de direitos ou a sucessão, quando for o caso;
  2. prova da negativa de celebração do título definitivo de propriedade, caracterizado pela inércia ou negativa na celebração do título de transmissão de propriedade plena no prazo de 15 (quinze) dias, a partir de notificação extrajudicial prévia pelo oficial do registro de imóveis, ou de registro de títulos e documentos (o oficial notificará a parte contrária e, após transcorridos 15 dias da notificação, será comprovada a negativa de direito à transmissão da propriedade).
  3.  certidões negativas de ação, emitidas pela comarca de situação do imóvel, que comprovem não haver nenhum litígio envolvendo o contrato de promessa de compra e venda do imóvel objeto da adjudicação;
  4. comprovante de pagamento do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI);
  5. procuração com poderes específicos ao advogado, que será o responsável por apresentar o requerimento e dar o devido andamento ao procedimento, tal como em uma ação judicial;
  6. comprovante de pagamento dos emolumentos de cartório.

Obrigatoriamente, na Ata Notarial deverão constar:

  1. a identificação do imóvel;
  2.  o nome e a qualificação do comprador (ou de seus sucessores que constam no contrato);
  3. a prova do pagamento;
  4. a prova de que o vendedor não cumpriu a obrigação de entregar o título de propriedade.

Além de garantir a autenticidade dos documentos, a ata notarial poderá atestar:

  1. a disponibilidade ou indisponibilidade do bem;
  2. a quitação do negócio jurídico, mediante a apresentação ao tabelião de diversos documentos (Ex.: declaração de Imposto de Renda, e-mails e mensagens entre as partes que comprovem o recebimento pelo vendedor, as tentativas em obter a escritura definitiva e a recusa do vendedor em outorgá-la etc.);
  3. extratos bancários e outros fatos que não estejam demonstrados por documentos.

Preparada toda a documentação, com todas as provas exigidas e lavrada a ata notarial, o processo administrativo estará pronto para ser encaminhado ao registro.

Ressalta-se que o Cartório de Registro de Imóveis OBRIGATORIAMENTE deverá ser o competente da área onde o imóvel está situado.

Nos últimos anos os avanços legislativos no combate à burocracia e desafogamento do Judiciário têm sido notáveis e realmente devem ser alvo de aplausos por parte da sociedade brasileira, sendo que a adjudicação compulsória extrajudicial ora em comento, que se funda no princípio da função social da propriedade, é bom exemplo disso ao alcance das mãos, contribuindo para a paz social e a solução célere dos conflitos.

Richard Franklin Mello d'Avila
Graduado em 1988 pela PUC-Campinas. Sócio da MORELLI & D'AVILA SOCIEDADE DE ADVOGADOS desde 1989. Pós-Graduado em Advocacia Consultiva. Relator da Comissão de Ética da OAB/Subseção-Campinas por 4 anos

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