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A criação do projeto: Fortalecendo a democracia, a lei 14.133/21 e a administração dialógica na reconstrução de Brasília

A mensagem aqui transmitida é de uma lei que tenta modernizar a Administração Pública sem perder eficiência e probidade.

17/1/2023

Antes de iniciarmos este artigo, vale deixar expresso que não há a intenção de analisar penalmente o ataque ocorrido na praça dos três poderes em 8/1/23, mas sim analisar a contribuição e a inovação jurídica trazida pela lei 14.133/21, a nova lei de licitações, que leva oxigenação ao Direito Administrativo, ramo do Direito Público que muito vezes não tem a devida atenção da doutrina, apesar de apresentar capacidade gigantesca de resolver vários problemas atuais do nosso país e é por isso que este artigo nasceu.1

O Direito Administrativo é um ramo do Direito Público que cuida da atividade desenvolvida pelo Estado por meio de seus 3 poderes, um pensamento reducionista acredita que somente o Poder Executivo desenvolve atividade administrativa, mas os 3 Poderes exercem a atividade administrativa, tendo em vista a estrutura interna do Poder Legislativo e do Poder Judiciário.

Nesse sentido, tema que desperta grande interesse é o procedimento licitatório, com repercussão em contratos administrativos e orçamento público. Assim, chegamos a lei 14.133/21 e aos novos dispositivos de uma lei completa e moderna que vai nos ajudar a melhorar a eficiência e transparência dos procedimentos licitatórios. Ganha notoriedade o tema licitações em razão da necessidade de reestruturação física da sede dos 3 poderes em Brasília, de forma rápida, eficiente e vantajosa para a Administração Pública.2

Não vamos abordar aqui a responsabilidade civil pelos atos praticados, mas devemos lembrar que o art. 37, §6º, da CRFB/88, responsabiliza os agentes púbicos de forma regressiva em caso de dolo ou culpa, além disso é de 10 anos o prazo prescricional de crimes contra a Administração Pública, já que os custos serão absorvidos prioritariamente pelo erário, em vista da urgência da volta ao funcionamento total da sede dos poderes, mas os responsáveis devem arcar com os prejuízos causados.3

 Passada a análise preliminar, chegamos ao título do artigo em que há a idealização do Programa Fortalecendo a Democracia, tal programa seria uma atuação conjunta dos 3 Poderes para que fosse lançado uma só ata de registro de preços para compra de bens e serviços comuns das 3 instituições, e a possível compra por meio de pregão eletrônico, assim haveria barateamento em razão da grande quantidade comprada e também poderia haver retribuição em publicidade para tais empresas, que participariam de solenidades apresentando a eficiência das contratações. 

Uma pequena digressão sobre organização administrativa para que a ata de registro de preços seja lançado de maneira técnica e eficaz, temos que levar em conta que o Poder Executivo e o Poder Legislativo da União possuem sede em Brasília e foram atingidos no evento já citado, quanto ao Supremo Tribunal Federal, tal instituição não faz parte da estrutura administrativa da união, mas poderia aderir a ata de registro de preços pelo expediente do art. 86, da lei 14.133/21, com a manifestação de interesse em até 8 dias úteis, “licitação carona” chamada pela doutrina. 

Todo esse planejamento se refere a compra de bens e serviços comuns, ou seja, de descrição usual de mercado, não pode haver a inclusão de serviços técnicos de natureza predominantemente intelectual e também está vedado para obras e serviços de engenharia especiais, por restrições da própria lei 14.133/21, já que em razão da especificidade tais serviços devem seguir o procedimento da concorrência.4

Quanto ao procedimento descrito anteriormente, essa fase do projeto fortalecendo a democracia seria apenas par bens e serviços comuns e tal ata de registro de preços seria lançada após um estudo técnico preliminar, com a devida justificação da contratação fora do plano anual de contratações, além de apresentar as vantagens mercadológicas da compra em grande quantidade e o anúncio de uma sanção premial para o contratado.

 Dessa forma, o referido projeto seria lançado pelas referidas instituições, pois é nítido que há forte apelo emocional envolvido nesse processo licitatório e a Administração Pública deve usar isso a seu favor, fazendo com que os contratados barateiem seus custos com publicidade em espaços públicos e participando de solenidades em que serão apresentados os números do projeto e a economicidade da estratégia jurídica desenvolvida pelas instituições dentro da lei 14.133/21.5

Essa estratégia de publicidade em espaços públicos para contrapartida de contratos com a Administração Pública não é novidade, já que no art. 6º, da lei 11.079/04, lei das Parcerias Público Privadas, em que o retorno com publicidade em espaços públicos garante a modicidade das tarifas em serviços públicos concedidos, mas não é o caso da formação de uma parceria público privada, pois há valores mínimos e máximos, além de tempo de contrato estabelecido na lei 11.079/04.

Na minuta de contrato deve ficar claro que a Administração Pública deseja baratear os custos dos bens e serviços comuns citados por meio da grande quantidade prevista, já que tratamos de ata de registro de preços e além disso haverá contrapartida em publicidade por meio do projeto fortalecendo a democracia.6

Lembrando que no estudo técnico preliminar deve ficar claro o tamanho do prejuízo sofrido, o custo da reposição dos bens e serviços comuns e o quanto será reduzido no custo da licitação por meio da criação de tal projeto, com a ata de registro de preço, gerado pela grande quantidade comprada e pelo retorno às contratadas por meio de publicidade, assim ficará evidente a necessidade de solenidades e menções de agradecimento às contratadas, sem que haja dúvida acerca da publicidade em questão.

A lei 14.133/21 permite a utilização desses expedientes por meio do critério de julgamento, esse critério pode ser o de menor preço ou maior desconto, mas sendo claro que o modo de disputa será aberto e que o tempo de vida útil e a qualidade dos bens e serviços comuns também serão analisadas, conforme o art. 3 da lei 14.133/21.

É bom deixar claro que o critério de vida útil dos bens ou serviços comuns adquiridos serão critérios analisados, pois em vários momentos a lei 8666/93 foi silente nesse sentido e por isso administradores públicos se viam obrigados a adquirir bens ou serviços mais baratos, mas que não teriam a mesma qualidade e vida útil de outros bens com preços minimamente mais caros.7

Aqui faz-se necessária a reverência à lei 14.133/21, pois inclui dentre os objetivos da licitação o resultado mais vantajoso para a Administração Pública, levando em conta o ciclo de vida útil do objeto, assim deve ficar claro no edital que o contratado deve estar disposto a baratear o custo dos bens e serviços comuns em troca da grande quantidade vendida e da publicidade do projeto citado e não diminuindo a qualidade do produto ofertado.

Pela complexidade de tal procedimento licitatório fica clara a necessidade da formação de uma comissão de licitação, para que juntos avaliem todos esses detalhes, sendo uma tarefa descomunal para somente um agente de contratação, mesmo que com uma equipe de apoio, integrando tal comissão um servidor público de cada instituição participante, conforme previsto pela lei 14.133/21. 8

Há a necessidade também de uma comissão de fiscalização, conforme previsto pelo art. 117, da lei 14.133/21, pois a urgência para o recebimento dos bens ou serviços adquiridos obrigará a Administração a emitir termos detalhados de forma sumária, com posterior avaliação dos mesmos e emissão do termo detalhado definitivo, garantindo o atendimento das exigências do edital.9

Talvez essa seja a parte mais importante dessa contratação, já que deve ficar claro entre Administração Pública e contratado que o projeto fortalecendo a democracia busca o maior desconto ou o menor preço oferecendo como contrapartida a publicidade já citada e a grande quantidade comprada, para que não haja surpresa posterior com a qualidade inferior dos bens ou serviços adquiridos, evitando possível desequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

É claro que tudo que foi dito aqui até agora pode ser adequado ao art. 75 da lei 14.133/21, licitação dispensável, se a Administração pública optar pelo uso do fundamento de compra emergencial, mas haverá justificativa do preço e em nada será alterado o apelo emocional desse processo licitatório, podendo se utilizar dos mesmos argumentos para lançar o projeto citado aqui.

Ainda não paramos por aqui, pois ainda há a restauração de obras de arte e a reforma de estruturas dos prédios que foram atingidas, nesse caso creio que melhor a opção seja a nova modalidade chamada diálogo competitivo, trazido pela lei 14133/21, em que a Administração Pública poderá apresentar tal projeto e também poderá buscar um serviço técnico especializado no mercado, com a obrigatoriedade de uma proposta ao fim e, ainda, a manifestação de vários interessados.

O serviço de restauração de obra de arte e obra de reforma é um serviço técnico especializado que exige a modalidade diálogo competitivo ou concorrência, mas que não exclui o procedimento auxiliar de registro de preços, sendo assim persiste a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal fazer parte desse procedimento, aproveitando tal negociação vantajosa.

A lei 14.133/21 criou uma série de instrumentos importante para que a Administração Pública se modernize e atue de modo menos espinhoso, mais eficiente e transparente com o setor privado, sendo assim também é interessante que estejam em contrato a previsão de modos alternativos de disputa para que qualquer impasse seja resolvida de maneira rápida e econômica, sem que haja o acionamento judicial no curso do contrato, já que trata-se de trâmite emergencial e o tempo é objeto essencial desse contrato.10

Por fim, a mensagem aqui transmitida é de uma lei que tenta modernizar a Administração Pública sem perder eficiência e probidade, assim a lei 14.1333/21 busca a concretização da Administração Pública dialógica, com modos alternativos de resolução de disputa e com o uso de todos os recursos possíveis para uma contratação vantajosa, transparente e segura, como deve ser a Gestão Púbica.11

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1 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. São Paulo: SaraivaJur, 2017. 

2 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm?origin=instituicao Acesso em 10/01/2023.

3 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm Acesso em 10/01/2023.

4 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm?origin=instituicao Acesso em 10/01/2023.. 

5 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14133.htm?origin=instituicao Acesso em 10/01/2023.. 

6 OLIVEIRA, Rafael. Licitações e Contratos Administrativos - Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Forense, 2022.   

7 OLIVEIRA, Rafael. Licitações e Contratos Administrativos - Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Forense, 2022.        

8 Saadi, Mario.  Nova Lei de Licitações Lei N 14.133/2021 Sistematizada. São Paulo. Fórum, 2021. 

9 Saadi, Mario.  Nova Lei de Licitações Lei N 14.133/2021 Sistematizada. São Paulo. Fórum, 2021.

10 Ribeiro Lima, Raimundo Márcio. Administração Pública Dialógica. São Paulo: Juruá, 2013.

11 Ribeiro Lima, Raimundo Márcio. Administração Pública Dialógica. São Paulo: Juruá, 2013. 

Luiz Felipe Nascimento
Graduado pela UFRJ - FND, Faculdade Nacional de Direito, pós graduado em direito público lato sensu, Processo civil e Direito Civil, Direito Penal e Direito e Cidadania. Advogado.

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