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Aprovado o marco legal do mercado de criptoativos, com previsão de punição para casos de fraude

Devido à rejeição da proposta de segregação patrimonial dos recursos aportados pelos clientes como uma das diretrizes da atividade de prestação de serviços virtuais, existe o risco de confusão dos bens dos clientes com os da prestadora

26/12/2022

Após anos de discussão legislativa, foi publicada neste dia 21 de dezembro a lei 14.478, que estabelece as diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais, que incluem os serviços prestados por exchanges, wallets e outros players envolvidos na negociação de criptoativos, inclusive de criptomoedas como o Bitcoin.

Uma das novidades trazidas pela lei, que entrará em vigor em 180 dias e ainda precisa ser regulamentada, é a exigência de autorização prévia para o exercício da atividade por órgão ou entidade da Administração Pública Federal ainda a ser definido. Especula-se que a CVM será a responsável por autorizar as atividades relacionadas a ativos virtuais que sejam considerados valores mobiliários e que o Banco Central será o responsável pela autorização das demais atividades.

A lei também estabelece que a prestação de serviços de ativos virtuais deverá observar certos requisitos mínimos, à semelhança das instituições de pagamento. Já a supervisão da atividade será responsabilidade da Administração Pública Federal.

Pela norma, é considerado ativo virtual a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para pagamentos ou com propósito de investimento, como as criptomoedas (Bitcoin, Ethereum, entre outras). Assim, o conceito não compreende moeda eletrônica, nacional ou estrangeira, nem pontos de programa de fidelidade.

A atividade deve observar, entre outras, as diretrizes da livre iniciativa, a proteção de dados pessoais, a proteção e defesa de consumidores e a prevenção à lavagem de dinheiro, sempre de acordo com parâmetros definidos pelo regulador.

Por prestador de serviços de ativos virtuais, talvez o conceito mais importante trazido pela lei, entende-se a pessoa jurídica que executa, em nome de terceiros, a troca de ativos virtuais em moeda nacional ou estrangeira entre um ou mais ativos virtuais, a transferência entre esses ativos, a custódia ou administração dos ativos ou de instrumentos que possibilitem o seu controle, a participação em serviços financeiros e a prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais. Assim, a definição inclui diversos tipos de agentes que já hoje atuam no mercado de criptoativos.

Importante notar que a norma prevê a possibilidade de instituições autorizadas pelo Banco Central do Brasil prestarem serviços de ativos virtuais e reforça que, no que diz respeito às relações de consumo de serviços de ativos virtuais, o Código de Defesa do Consumidor será aplicável. Ainda no intuito de proteger os clientes de tais empresas, a lei modifica o Código Penal para prever que a fraude com a utilização de ativos virtuais é crime sujeito à pena de reclusão de 4 a 8 anos e multa.

A lei também endereçou a questão do uso reiterado de ativos virtuais para cometimento de crimes de lavagem de dinheiro, prevendo que, para tais casos, a pena de tais crimes será aumentada de um a dois terços.

A aprovação deste marco legal ocorreu após mais de 7 anos de discussão legislativa, tendo origem no Projeto de Lei 2.303, apresentado em julho de 2015 pelo deputado Federal Aureo Ribeiro, que passou por modificações substanciais até a remessa da redação final ao Senado Federal em dezembro de 2021.

Nesse processo, o Senado sugeriu algumas mudanças referentes a pontos sensíveis, como o cancelamento e suspensão das autorizações, a segregação patrimonial dos recursos dos clientes, a continuidade das atividades pelas empresas que já atuam no mercado e benefícios fiscais para  uso de energia renovável em operações de mineração e preservação de ativos virtuais.

Em relação ao cancelamento de autorizações, ficou definido que o regulador poderá cancelar a autorização de funcionamento de determinada empresa, de ofício ou a pedido.

Devido à rejeição da proposta de segregação patrimonial dos recursos aportados pelos clientes como uma das diretrizes da atividade de prestação de serviços virtuais – talvez o ponto mais controverso da nova lei – , existe o risco de confusão dos bens dos clientes com os da prestadora, o que pode culminar na apropriação indevida de tais recursos e na constrição dos bens dos clientes em razão de condutas da prestadora.

Também foi rejeitada pela Câmara a proposta de zerar as alíquotas de certos tributos incidentes sobre importação, industrialização ou comercialização de hardware e software para mineração e preservação de ativos virtuais nos casos em que tais ferramentas fossem destinadas a empreendimentos que utilizassem apenas energia renovável ou neutralizassem suas emissões de gases de efeito estufa, com a justificativa de não causar implicação financeira ou orçamentária da matéria em aumento ou diminuição da receita e da despesa pública.

Por fim, a rejeição da inclusão de dispositivo que autorizava que as prestadoras de serviços de ativos virtuais continuassem exercendo suas atividades enquanto não tivesse sido proferida decisão final acerca de seus respectivos processos de autorização pelo regulador que vier a ser definido, desde que estivessem regularmente cadastradas no SISCOAF - Sistema de Controle de Atividades Financeiras e na Receita Federal, implica na permanência de relativa insegurança jurídica quanto à continuidade das atividades dos agentes que atuam no setor. Espera-se, contudo, que essa questão seja sanada quando da edição da regulamentação da norma.

Karine Oliveira
Advogada da área de Bancário, Meios de Pagamento e Fintechs do FAS Advogados.

Hiago de A. Castilhejo
Advogado na área de Bancário, Meios de Pagamento e Fintechs do FAS Advogados

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