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Da ausência de responsabilidade civil em caso de veiculação de matéria jornalística sobre fato ocorrido e narrado na perspectiva do repórter

Da ausência de responsabilidade civil em caso de veiculação de matéria jornalística sobre fato ocorrido e narrado na perspectiva do repórter.

13/12/2022

Expressamente inserida na Constituição Federal de 1988 (CF/88), o direito de livre manifestação do pensamento é previsto em seu art. 5°, IV, que assim prevê, nestas palavras:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

No mesmo caminhar é o disposto no art. 220, caput, da CF/88, pois indica que “[a] manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.

Conforme amplamente conhecido no meio doutrinário e jurídico, não cabe ao Poder Judiciário censurar manifestações de pensamento, porquanto essa é a máxima prevista no atual estado democrático de direito, que corrobora com o movimento garantidor do direito fundamental de livre manifestação de pensamento.

Apesar de existir previsão constitucional que assegura a liberdade de expressão, eventuais indivíduos não podem se valer absolutamente de tal proteção, em especial quando os fatos manifestados são inverídicos e constituídos de verdadeira calúnia.

O Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIn 5.136 DF, chegou a discorrer sobre a necessidade de preservação do princípio constitucional que assegura a livre manifestação do pensamento, desde que aplicada em consonância com princípio da proporcionalidade e razoabilidade.

A garantia constitucional de livre manifestação não é absoluta, de sorte que a livre expressão não pode abrigar manifestações de conteúdo imoral que implicam em ilicitude penal.

Em suma, o direito à livre expressão deve ser exercido de forma harmônica com os demais princípios constitucionais, sendo estes: legalidade, moralidade, razoabilidade e proporcionalidade.

Como exemplo, vejamos o seguinte julgado:

DIREITO CONSTITUCIONAL E PENAL. ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. CRIME DE DESACATO. ART. 331 DO CP. CONFORMIDADE COM A CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988.

1. Trata-se de arguição de descumprimento de preceito fundamental em que se questiona a conformidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como a recepção pela Constituição de 1988, do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato.

2. De acordo com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do Supremo Tribunal Federal, a liberdade de expressão não é um direito absoluto e, em casos de grave abuso, faz-se legítima a utilização do direito penal para a proteção de outros interesses e direitos relevantes. (grifos meu).

3. A diversidade de regime jurídico – inclusive penal – existente entre agentes públicos e particulares é uma via de mão dupla: as consequências previstas para as condutas típicas são diversas não somente quando os agentes públicos são autores dos delitos, mas, de igual modo, quando deles são vítimas. 4. A criminalização do desacato não configura tratamento privilegiado ao agente estatal, mas proteção da função pública por ele exercida. 5. Dado que os agentes públicos em geral estão mais expostos ao escrutínio e à crítica dos cidadãos, deles se exige maior tolerância à reprovação e à insatisfação, limitando-se o crime de desacato a casos graves e evidentes de menosprezo à função pública. 6. Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente. Fixação da seguinte tese: “Foi recepcionada pela Constituição de 1988 a norma do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato”.

(STF - ADPF: 496 DF 0012916-84.2017.1.00.0000, Relator: ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 22/06/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 24/09/2020)

Em consonância com os direitos e garantias fundamentais até então expostos, em meados de agosto do ano de 2022, iniciou-se discussão no âmbito da 4ª (terceira) turma do Superior Tribunal de Justiça quanto a possibilidade ou não de responsabilização civil em caso de veiculação de matéria jornalística sobre fato ocorrido e narrado pelo ponto de visto do profissional da área de jornalismo.

Apesar do processo encontrar-se em segredo de justiça, houve a divulgação de parte do trecho do acórdão que corroborou com a inexistência de reparação civil quando for o caso de veiculação de matéria com fatos verídicos ou verossímeis.

O supracitado entendimento ratifica o conhecido chamado direito constitucional fundamental de livre manifestação de pensamento, em conjunto também com o direito de informação e liberdade de imprensa.

Por outro ângulo, é importante relembrar que a Constituição Pátria assegura o direito de resposta, já que é uma garantia inviolável e possibilita a retificação de equívocos.

Sem sombras de dúvidas, “a manifestação do pensamento é um dos atributos da liberdade de expressão, entretanto deve ser realizado de maneira responsável”.

Desse diapasão, “o direito de receber informações verdadeiras é um direito de liberdade e caracteriza-se essencialmente por estar dirigido a todos os cidadãos, independentemente de raça, credo ou convicção político-filosófica, com a finalidade de fornecimento de subsídios para a formação de convicções relativas a assuntos públicos”.

Diante disso, fica a lição que a liberdade de expressão não é absolutamente protegida, de maneira em que na sua aplicação devem ser observados os princípios da legalidade, moralidade, razoabilidade e proporcionalidade.

Assim, não há que se falar em responsabilidade civil quando for o caso de veiculação de matéria jornalística sobre fato verídico ou que aparenta ser verdadeiro, sem a presença de qualquer intuito de difamação, injúria ou calúnia.

_____________________

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Informativo de Jurisprudência nº 748. Disponível em: https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/. Acesso em: 12 set. 2022.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5136/DF. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4589278. Acesso em: 12 set. 2022.

BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 496/DF. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5300439. Acesso em: 12 set. 2022.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.html. Acesso em 12 set. 2022.

MARTINS, Flávia Bahia. Descomplicando direito constitucional. 3º ed. Recife: Armador, 2017, p. 120.

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional

33ª ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 616.

Caio Almeida Monteiro Rego
Advogado do escritório Barreto Dolabella Advogados. Pós-graduando em Direito Civil pela PUC/MG.

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