Recentemente foi noticiado1 o projeto de lei (PLS) 68/13 teve encaminhamento com parecer de aprovação pelo relator da Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor do Senado e, se aprovado, seguirá para a Câmara dos Deputados.
A norma pretende reconhecer força executiva nos acordos celebrados em órgãos de defesa do consumidor da Administração Pública e na sua exposição de motivos ficou registrado que o propósito da alteração à lei 8.078/902 seria conferir celeridade na solução de litígios e contribuir para desafogar o judiciário.
É inegável que o fim pretendido é bem-vindo e urgente, mas não se pode deixar de lembrar que o Código de Processo Civil de 2015 prevê que são títulos executivos extrajudiciais o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas (art. 784, III). Logo, basta que a representação do órgão ou entidade administrativa aponha a assinatura de duas testemunhas no termo de acordo para que se alcance o objetivo do PLS que se encontra em tramitação desde 2013.
Acresce-se o fato de que, em volume muito representativo, as pretensões nas ações judiciais em matéria de consumo, além da obrigação de fazer (troca do bem ou revogação do negócio jurídico), buscam a indenização a título de danos morais, o que quase nunca entra em composições extrajudiciais; por isso é que se pode supor que o hipotético descumprimento do acordo tende a continuar a integrar ação de conhecimento que terá como objeto principal não o desenlace do problema originário, mas a reparação de dano extrapatrimonial.
Por sua vez ponto positivo é que o reconhecimento do acordo celebrado entre fornecedor e consumidor perante a Administração Pública como título executivo compreenderá as demandas tratadas em plataformas virtuais (a principal está no Consumidor.gov.br3), contexto no qual seria mais complexo materializar o documento na forma prevista no C.P.C. por se tratar de mediação por manifestações em sistema informatizado.
Outra questão que deve estar em perspectiva é que eventual inclusão de pequenas indenizações por danos morais em acordos extrajudiciais pode vir a servir como meio de controverter um outro pedido de indenização em futura ação judicial, caso haja o descumprimento do acordo.
Por último, a eventual conversão do projeto em lei provavelmente não desafogará o judiciário e pouco afetará na celeridade das ações baseadas em descumprimento de acordos, mas, ao alcançar documentos eletrônicos provenientes de plataformas de solução consensuais de litígios mantidos pela administração pública, por via transversal, promoverá o alcance de um dos pilares da defesa do consumidor que é a facilitação da defesa dos direitos do hipossuficiente (art. 6º, VIII do CDC), uma vez que ele poderá recorrer aos canais mais atualizados de solução de conflitos sem a necessidade de deslocamentos para registro de reclamação e comparecimento em audiências e, se a solução acordada não se confirmar, poderá imediatamente buscar a execução forçada recorrendo ao Juizado Especial Cível.
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1 Notícia do site Telesíntese publicada em 8/11/22 em: https://www.telesintese.com.br/pl-que-da-forca-extrajudicial-para-acordos-firmados-em-procons avanca/. Consulta realizada em 9/11/22.
2 PLS 68/13: Dê-se a seguinte redação ao art. 89-A da lei 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor), na forma do art. 1º do projeto de lei do Senado 68, de 2013:
“Art. 1º ...........................................................................
‘Art. 89-A. O acordo celebrado entre fornecedor e consumidor perante órgãos ou entidades da Administração Pública com atribuições referentes a proteção e defesa do consumidor consistirá em título executivo extrajudicial.’”
3 “O Consumidor.gov.br é um serviço público que permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução de conflitos de consumo pela internet.
Monitorada pela Secretaria Nacional do Consumidor - Senacon - do Ministério da Justiça, Procons, Defensorias, Ministérios Públicos e também por toda a sociedade, esta ferramenta possibilita a resolução de conflitos de consumo de forma rápida e desburocratizada: atualmente, 80% das reclamações registradas no Consumidor.gov.br são solucionadas pelas empresas, que respondem as demandas dos consumidores em um prazo médio de 7 dias”. Consulta realizada em 9/11/22. Disponível em: https://www.consumidor.gov.br/pages/conteudo/sobre-servico.