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O dano pela privação de uso na economia do compartilhamento

Há mais de uma década, vivemos um período de intensas transformações tecnológicas que propiciaram a criação e fomento da chamada “economia do compartilhamento".

10/11/2022

1. Introdução

A humanidade vive um período de intensas transformações motivadas pela revolução tecnológica. O impacto nas relações jurídicas é evidente. Novas situações, novos bens e novos direitos surgem e trazem consigo questionamentos sobre o merecimento de tutela dos interesses envolvidos.

A utilização de aplicativos para a contratação temporária de bens e serviços, tais como Uber e Airbnb, tem modificado o eixo das relações, que antes repousava em direitos mais estáticos, tais como o direito de propriedade, para direitos mais dinâmicos, tais como o direito de uso.

Logo, o direito de uso e os demais institutos jurídicos que o circundam adquirem novas feições e funções. Surgem questionamentos acerca da forma de tutela das restrições e/ou impedimento de exercício do direito de uso, e de como classificar e ressarcir eventuais prejuízos causados.

Como será explorado mais à frente, ainda se discute a viabilidade da aplicação autônoma do dano pela privação de uso. Porém, para além disso, vale refletir se caberia o ressarcimento do referido dano para os usuários temporários de propriedade alheia, ou para o proprietário que tem o uso limitado em decorrência de atos praticados pelo usuário temporário do seu bem.

Com efeito, o presente trabalho tem por escopo analisar a possibilidade de aplicação do dano pela privação do uso no atual contexto social, econômico e tecnológico representado pela economia de compartilhamento.

2. O direito de uso no código civil

O direito de uso se apresenta de duas formas no código civil:

i) como faculdade inerente ao direito de propriedade, inserida na regra do art. 1.228, caput;

ii) como direito real autônomo listado no art. 1.225, V.

O direito de usar  como requisito do pleno exercício do direito de propriedade (ius utendi), que pode se dar em benefício do proprietário ou de terceiros a quem aquele confere tal prerrogativa, “consiste em dar à coisa a destinação econômica que lhe é própria, isto é, utilizar-se dela sem alteração de sua substância”1.  

Intrínseco à faculdade de usar, está o direito de não usar a coisa, “deixar de usá-la, guardando-a ou mantendo-a inerte. Usar não é somente extrair efeito benéfico, mas também ter a coisa em condições de servir”2. Este é um argumento que, como se verá adiante, serve de justificativa para aqueles que defendem a autonomia do dano pela privação do uso do proprietário ainda que ele deixe de comprovar a necessidade do uso.

Já o direito real de uso, que “autoriza uma pessoa a retirar, temporariamente, de coisa alheia (móvel ou imóvel), toda as utilidades (frutos) para atender às suas próprias necessidades e às de sua família”3, encontra-se definido no texto dos arts. 1.412 e 1.413 do código civil. Para Caio Mário, o direito real de uso, nos termos propostos em tais artigos, seria um “usufruto em miniatura”4.

Por conseguinte, nos termos do código civil, a proteção do direito de uso pode se dar de forma individualizada, per se, como:

i) faculdade do proprietário do bem;

ii) atribuição a terceiro da faculdade de usar pelo proprietário do bem;

iii) direito real autônomo.

 3. O dano pela privação de uso no ordenamento pátrio

Apesar de pouco conhecida, há no ordenamento jurídico brasileiro uma hipótese positivada de reparação do dano pela privação do uso contida na regra do art. 276, IV do Código Brasileiro de Aeronáutica (lei  7.565/86), que prevê, em caso de abalroamento, a reparação dos “prejuízos decorrentes da privação de uso da aeronave abalroada”5.

A jurisprudência e literatura jurídica, por sua vez, apresentam uma certa oscilação sobre o tema no que se refere à existência e possibilidade de reconhecimento do dano pela privação do uso como um tipo de dano autônomo6; ao seu enquadramento como dano material e/ou moral7; ao seu enquadramento como instituto jurídico diverso do dano, fora da esfera da responsabilidade civil8.

Aline de Miranda Valverde Terra defende a restrição da aplicação do dano pela privação de uso nos casos em que o proprietário não está utilizando a coisa ou não tem perspectiva de utilizá-la, pois entende que a responsabilidade civil não resolve a questão.9

Sugere, nesse contexto, solução na esfera do enriquecimento sem causa por meio da figura do enriquecimento por intervenção, no qual há incremento no patrimônio do enriquecido por intervenção em direitos ou bens jurídicos alheios10.

Assim, o enriquecimento por intervenção se daria às custas de outrem, no caso, o proprietário, que não necessariamente sofreu empobrecimento11, e a quem caberia a restituição do incremento patrimonial obtido pelo enriquecido.

Há no Superior Tribunal de Justiça (STJ) precedente qualificado sobre o reconhecimento e reparabilidade do dano por privação de uso. Por meio do julgamento do Tema nº 512 do Recurso Repetitivo nº 996, relativo ao REsp nº 1.729.593-SP, julgado em 11.09.2019, a corte reconheceu a indenização por injusta privação do uso do bem ao adquirente de unidade habitacional por meio do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) devido ao atraso na entrega do imóvel13.

Para tanto, a 3ª turma do STJ entendeu que o não recebimento da unidade habitacional na data contratada pelo adquirente “evidencia e expõe o dano a ser reparado, independentemente da comprovação de ter efetuado gasto com a locação de imóvel para residir”14.

Destarte, o STJ confirmou entendimento, que já vinha adotando em casos de aquisição de imóvel no âmbito do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), de que o dano é presumido pela simples impossibilidade de utilização plena da propriedade. Contudo, diferentemente dos casos envolvendo SFH, entendeu que “no âmbito do PMCMV, o prejuízo material decorrente do atraso na entrega de imóvel está mais próximo de um dano emergente do que de lucros cessantes”15

Com efeito, mesmo reconhecendo a autonomia do dano pela privação de uso, o STJ tem se utilizado de outros instrumentos reparatórios para justificar a sua aplicação, ora classificando-o como dano emergente, ora como lucros cessantes.

Feitas essas breves considerações, necessárias para a contextualização do dano pela privação de uso na literatura jurídica e jurisprudência nacional, passa-se à análise da possibilidade de aplicação do referido instrumento na economia de compartilhamento.

 4. O dano pela privação de uso na economia do compartilhamento

O mundo tem vivenciado evidentes e relevantes transformações motivadas, principalmente, pelo uso das novas tecnologias que se multiplicam em uma velocidade sem precedentes no que Klaus Schwab define como a “Quarta Revolução Industrial” 16.

Em tal contexto, a chamada economia do compartilhamento17 na qual “a aquisição de bens e a contratação de serviços de forma permanente dá lugar ao seu uso e prestação apenas quando necessário”18, é impulsionada.

Em 2007, nasceu o Airbnb19. Em março de 2009, foi criado o app da Uber20. Ambas as empresas, fundadas em São Francisco, na Califórnia – EUA, rapidamente, se espalharam pelos continentes, passando a fazer parte do cotidiano de uma coletividade que abrange tanto proprietários de bens móveis e imóveis e prestadores de serviço, quanto intermediários e usuários.

Essas plataformas são um bom exemplo das transformações nas relações privadas ocorridas na última década e acarretadas pelo uso em larga escala da tecnologia, e de como a hegemonia do direito de propriedade vem sendo ameaçada por essa nova dinâmica econômica e social, na qual o objeto das transações repousa no direito de usar temporariamente propriedade e serviço alheios.

Tendo em vista uma menor flexibilidade do direito de uso na seara do direito imobiliário, o afunilamento da discussão para tratar de questões relativas ao uso de imóveis na economia de compartilhamento se mostra interessante. Imagine-se, assim, uma situação hipotética envolvendo um caso de hospedagem via Airbnb:

Um hóspede reserva uma casa de praia para uso no verão durante as férias em família. Como requisito, seleciona uma casa com piscina de fácil acesso e vista para o mar para que alguns dos membros da família, que têm dificuldade de locomoção, possam aproveitar o sol e nadar sem ter que se deslocar na areia.

O hóspede se certifica da viabilidade do uso da piscina com o anfitrião, que, por sua vez, assegura que ela estaria em plenas condições de fruição durante a estadia e que atenderia às necessidades do hóspede e seus convidados. Contudo, no primeiro dia de hospedagem (seriam dez dias no total), a piscina apresenta um vazamento que torna inviável a sua utilização.

Assim, a destinação do bem nos moldes pretendidos restou impossibilitada, tendo sido limitado o direito de uso pleno da propriedade pelo hóspede no período contratado. A questão será levada a litígio. Seguindo-se a jurisprudência tradicional, caberia talvez um pedido de abatimento proporcional do preço a título de danos materiais, e/ou um pedido de reparação moral pelos transtornos e aborrecimentos sofridos.

Porém, além desses mecanismos de ressarcimento corriqueiramente utilizados, poderia o hóspede pleitear o ressarcimento do dano pela privação do uso? Tal interesse seria merecedor de tutela específica?

Durante aquele período de dez dias, o proprietário do bem atribuiu ao hóspede o pleno uso e fruição da coisa, sendo que, na fase de tratativas, deixou claro que a piscina funcional seria condição sine qua non para a contratação. Portanto, naquele negócio específico, o pleno uso da casa perpassava pelo pleno uso da piscina.

Considerando-se a essencialidade do uso da piscina nas férias do hóspede e da sua família, as questões existenciais envolvidas na dificuldade de locomoção das pessoas, e o curto lapso temporal de uso e fruição da propriedade, que impedia novos arranjos, vislumbra-se a possibilidade de cabimento de ressarcimento do dano pela privação do uso.

Há, na Alemanha e Brasil, casos em que a jurisprudência deferiu o ressarcimento do dano pela privação de uso por falha na prestação de serviço de internet por um determinado período21 Assim, por considerarem a internet serviço essencial, tanto a Corte Federal de Karlsruhe na Alemanha, quanto o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, entenderam que, além de prejuízos materiais, caberia a reparação pelo dano de privação de uso.

Portanto, a evolução tecnológica fez surgir uma nova categoria de serviço considerado essencial, acesso à internet, que tem repercussão na esfera do direito de uso. Para Gustavo Tepedino e Rodrigo da Guia Silva, “novos bens jurídicos” conduzem a “novos danos” que merecem tutela ante a sua injustiça que, na “cena contemporânea”, está ligada às “utilidades proporcionadas pela coisa”22.

É de se considerar ainda que o direito de uso está mais atrelado à ideia de “ser”, “usufruir” e “desfrutar” do que “ter”, “deter” ou “possuir”, o que remete à importância das questões existenciais presentes na situação hipotética narrada, que envolve pessoas com dificuldade de locomoção.

Com efeito, a individualização desse novo direito de uso temporário, a depender do caso concreto, pode permear os princípios constitucionais da dignidade humana e solidariedade, dando nova dimensão à tutela do direito de uso.

Seguindo-se a linha de pensamento de Maria Celina Bodin de Moraes, há que se refletir sobre como o direito pode agir de modo a adaptar tais mudanças à ordem constitucional vigente, exercendo, assim, a sua “tarefa civilizatória”23.

5. Conclusão

À medida em que a tecnologia evolui, novas situações jurídicas, bem como novas categorias de bens e direitos surgem seguidas de questionamentos acerca do merecimento de tutela dos interesses a elas atreladas.

O direito de uso, anteriormente mais ligado e dependente do direito de propriedade, adquire diferentes dimensões e perspectivas em uma sociedade que se relaciona e se movimenta de forma significativa por meio da economia de compartilhamento.

Pretender tutelar o direito de uso e as suas repercussões, tais como o ressarcimento dos danos decorrentes da impossibilidade do seu pleno exercício, somente com os institutos tradicionalmente aplicados é negar a evolução da sociedade e, consequentemente, da ciência do direito.

Há, tanto na lei, quanto na literatura jurídica e jurisprudência pátrias, indícios de reconhecimento da autonomia do dano pela privação do uso. Porém, ainda de forma tímida e de certa maneira como extensão de outros institutos reparatórios, tais como o dano emergente ou o lucro cessante.

O merecimento de tutela de um direito deve ser analisado caso a caso. Considerando-se o tipo de relação travada na economia de compartilhamento, mais especificamente no exemplo trabalhado no texto, a individualização do dano pela privação de uso e consequente reparação autônoma parece atender à função promocional do direito.

________________________

1 TEPEDINO, Gustavo; MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo; RENTERIA, Pablo. Fundamentos do direito civil: direitos reais. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021, e-book n.p., Capítulo VI – Propriedade, 1. Estrutura do direito de propriedade.

2 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: volume IV. 25 ed. Atual. Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho. Rio de Janeiro: Forense, 2017, p. 96.

DINIZ, Maria Helena. Código civil anotado. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 1081.

4 “O usuário usará da coisa e perceberá os seus frutos, quando o exigirem as necessidades pessoais suas e de sua família (art. 1.412). No que diz respeito às necessidades pessoais, deve-se ter em consideração a condição social do usuário, bem como o lugar onde vive. Em verdade, o direito real de uso não se diferencia substancialmente do usufruto, distinguindo-se dele pela intensidade ou profundidade do direito: enquanto o usufrutuário aufere toda a fruição da coisa, ao usuário não é concedida senão a utilização reduzida aos limites das necessidades. Isto leva os autores a dizer que o uso e a habitação constituem um usufruto limitado ou diminutivos do usufruto, ou ainda que são um usufruto em miniatura.” PEREIRA, 2017, p. 280.

Art. 273. Consideram-se provenientes de abalroamento os danos produzidos pela colisão de 2 (duas) ou mais aeronaves, em vôo ou em manobra na superfície, e os produzidos às pessoas ou coisas a bordo, por outra aeronave em vôo.

Art. 274. A responsabilidade pela reparação dos danos resultantes do abalroamento cabe ao explorador ou proprietário da aeronave causadora, quer a utilize pessoalmente, quer por preposto.

Art. 275. No abalroamento em que haja culpa concorrente, a responsabilidade dos exploradores é solidária, mas proporcional à gravidade da falta.

Parágrafo único. Não se podendo determinar a proporcionalidade, responde cada um dos exploradores em partes iguais.

Art. 276. Constituem danos de abalroamento, sujeitos à indenização:

I - os causados a pessoas e coisas a bordo das aeronaves envolvidas;

II - os sofridos pela aeronave abalroada;

III - os prejuízos decorrentes da privação de uso da aeronave abalroada;

IV - os danos causados a terceiros, na superfície.

Parágrafo único. Incluem-se no ressarcimento dos danos as despesas, inclusive judiciais, assumidas pelo explorador da aeronave abalroada, em conseqüência do evento danoso.

6 “Uma das mais acirradas controvérsias em torno do tema reside na existência, ou não, de dano pela mera privação do uso. Em Portugal, identifica-se tendência de conceber a mera privação do uso como causadora de dano de natureza patrimonial. Nesse sentido, afirma-se que o simples uso do bem constitui vantagem susceptível de avaliação pecuniária, pelo que sua privação acarreta naturalmente um dano, já que representa “o corte definitivo e irrecuperável de uma ‘fatia’ dos poderes inerentes ao proprietário”, a configurar causa adequada de modificação negativa na relação entre o lesado e seu patrimônio.” TEPEDINO, Gustavo; TERRA, Aline de Miranda Valverde; GUEDES, Gisela Sampaio da Cruz. Fundamentos do direito civil: responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2021, 2. ed., e-book n.p., Capítulo VI – Os chamados novos danos, 2. Privação do uso: entre o dano e o enriquecimento por intervenção.

7 “Encontram-se também em Portugal orientações segundo as quais a simples privação do uso gera dano de natureza moral, porque impõe ao lesado a alteração da sua rotina diária para atingir os mesmos resultados alcançados antes da privação. Nesse sentido, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça daquele país que a ‘simples impossibilidade de dispor do veículo constitui para o lesado um dano não patrimonial, sendo certo que a regra é assente em direito que a privação ilícita do uso de qualquer bem constitui um dano de que o lesado deve ser compensado”. TEPEDINO, [et. al]. Fundamentos do direito civil: responsabilidade civil, 2021.

8 “Nada obstante, embora algumas hipóteses de privação do uso não encontrem na responsabilidade civil a tutela adequada, isso não significa que o ordenamento jurídico não contemple solução satisfatória para o caso; de regra, tais hipóteses promovem o enriquecimento sem causa do agente que causou a privação, a permitir o manejo da actio in rem verso pelo titular do bem, a qual não se confunde com o dever de reparar, circunscrevendo-se à parcela relativa ao lucro obtido pelo agente com a intervenção no bem alheio.” TEPEDINO, [et. al]. Fundamentos do direito civil: responsabilidade civil, 2021.

9“Algumas privações do uso não encontram na responsabilidade civil a tutela adequada, já que nem sempre há dano a ser indenizado. Nesse sentido, conforme já se destacou, quando o titular do bem já não o usa e tampouco pretende fazê-lo, a eventual privação do uso não causa, de regra, dano ressarcível. Com efeito, afigura-se indispensável analisar as peculiaridades presentes nas diversas situações em que ocorre a privação do uso, a fim de identificar o correto enquadramento dogmático do suporte fático.” TERRA, Aline de Miranda Valverde. Privação do uso: dano ou enriquecimento por intervenção. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v.9, n.3, 3º quadrimestre de 2014. Disponível em: www.univali.br/direitoepolitica - ISSN 1980-7791, p. 1632.

10 “O enriquecimento por intervenção consiste no incremento patrimonial obtido pela exploração de bens, trabalho e direitos alheios, e pode resultar tanto de efetivo aumento do ativo, quanto de diminuição do passivo ou poupança de certa despesa. O amigo que usa a casa de veraneio enquanto seu proprietário viaja com a família para o exterior poupa despesa que incorreria caso alugasse uma casa para passar suas férias.” TERRA, 2014, p. 1634.

11 “[...] a expressão ‘à custa de outrem’ deve ser entendida como ‘a necessidade de que haja um suporte do enriquecimento por outrem, que se produza um locupletamento à custa alheia, ou seja, com bens jurídicos pertencentes a pessoa diversa’, não já como a imprescindibilidade de um correspondente empobrecimento.” TERRA, 2014, p. 1635.

12 A tese firmada no Tema 5 no âmbito do PMCMV, foi a seguinte: “No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.” STJ, 3ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, REsp 1.729.593/SP, j. 25.09.2019, p. 42-43.

13 “Embora a regra geral, prevista no art. 402 do CC, disponha que o dano não pode ser presumido, existem situações excepcionais, tanto nas relações contratuais quanto nas extracontratuais, em que tal presunção é admitida por este Tribunal. É o que se verifica, por exemplo, na hipótese de inclusão indevida do nome do devedor em órgãos de restrição do crédito, de insucesso em procedimentos cirúrgicos de resultado, de assédio moral ou sexual, e, ao que interessa ao presente julgamento, no caso de atraso na entrega de imóvel em contrato de promessa de compra e venda, já considerado o decurso do prazo de tolerância. Diante disso, ao contrário do que sustentam os recorrentes, o fato de o imóvel ter sido adquirido sob a disciplina do PMCMV não afasta a presunção de prejuízo, mesmo porque, na linha dos precedentes desta Corte Superior, a condenação da vendedora por lucros cessantes independe, até mesmo, da demonstração da finalidade negocial da transação (EREsp n. 1.341.138/SP, Relatora a Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, DJe de 22/5/2018). No mesmo sentido: REsp n. 1.804.663/SP, desta relatoria, DJe de 2/5/2019; REsp n. 1.785.911/SP, Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, DJe de 22/4/2019; AgInt nos EDcl no AREsp n. 921.095/SP, Relator o Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe de 14/2/2019; REsp n. 1.698.420/SP, Relator o Ministro Antonio Carlos Ferreira, DJe de 6/3/2019, entre outros. No caso, a obrigação de indenizar decorre do prejuízo, que se presume ter o titular sofrido, por não ter se apossado do imóvel na data aprazada. É evidente que a previsão contratual criou a justa expectativa de que o adquirente pudesse usufruir o bem, daí que, se não o faz por razões oponíveis à incorporadora, surge o dever de reparar, independentemente da realização de prova específica do prejuízo. A indenização deve corresponder, por isso, à privação injusta do uso do bem e encontra fundamento não necessariamente na interrupção da percepção dos frutos ou pela frustração daquilo que razoavelmente poderia lucrar, mas na própria demora pelo cumprimento da obrigação (CC, art. 389). Isso porque a moradia é fato dotado de expressão econômica aferível, ainda que o beneficiário não tenha que, diretamente, despender recursos para tal.” STJ, 3ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, REsp 1.729.593/SP, j. 25.09.2019, p. 38-39.

14 STJ, 3ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, REsp 1.729.593/SP, j. 25.09.2019, p. 39.

15 “Por suas peculiaridades, no âmbito do PMCMV, o prejuízo material decorrente do atraso na entrega de imóvel está mais próximo de um dano emergente do que de lucros cessantes, embora essa questão, todavia, não se afigure de maior relevância, dado que, sob o ponto de vista pragmático, conforme sublinhou a Ministra Maria Isabel Gallotti, são ambos ‘as duas faces da mesma moeda’, pois ‘o dano, seja em qual dessas rubricas for classificado, será o mesmo: a privação da fruição do imóvel’ (AgInt no AgRg no AREsp n. 795.125/RJ, Quarta Turma, DJe de 19/11/2018)”. STJ, 3ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, REsp 1.729.593/SP, j. 25.09.2019, p. 39.

16 “A Quarta Revolução Industrial é algo fabricado por nós mesmos e está sob o nosso controle, e como as novas formas de colaboração e governança, acompanhadas por uma narrativa positiva e compartilhada, podem dar forma à nova Revolução Industrial para o benefício de todos. Se aceitarmos a responsabilidade coletiva para a criação de um futuro em que a inovação e a tecnologia servem às pessoas, elevaremos a humanidade a novos níveis de consciência moral.” SCHWAB, Klaus. A quarta revolução industrial. Trad. Daniel Moreira Miranda. São Paulo: Edipro, 2016, p. 11.

17 “A chamada economia do compartilhamento constitui o que diversos autores caracterizam como uma nova etapa no processo de desenvolvimento econômico, simbolizado pela superação da lógica de consumo em massa e visando ao acúmulo de bens, típica do final do último século, por um momento em que o mercado, já saturado por crises financeiras e pautado por necessidades ligadas à sustentabilidade e ao uso racional dos bens, passa a privilegiar novas formas de acesso a bens e a serviços. Em última instância, a economia do compartilhamento está baseada no uso de tecnologia da informação em prol da otimização do uso de recursos através de sua redistribuição, compartilhamento e aproveitamento de suas capacidades excedentes.” SOUZA, Carlos Affonso Pereira de Souza; LEMOS, Ronaldo. Aspectos jurídicos da economia do compartilhamento: função social e tutela da confiança. Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721 pp. 1757-1777, p. 1758-1759.

18 SOUZA, Carlos Affonso Pereira de Souza; LEMOS, Ronaldo, p. 1761.

19 NEWS AIRBNB. Sobre nós. Disponível em: < https://news.airbnb.com/br/about-us/>. Acesso em: 03.08.2022.

20 UBER NEWSROOM. Lançamento da Uber em San Francisco. Disponível em: < https://www.uber.com/pt-BR/newsroom/history/>. Acesso em: 03.08.2022.

21 Em janeiro de 2013, a Corte Federal de Karlsruhe, na Alemanha, proferiu decisão segundo a qual os consumidores têm direito à indenização perante provedores de internet pela privação do uso do serviço, sob o argumento de a internet consistir em bem essencial à vida. O tribunal alemão julgava o caso de usuário que ficou impossibilitado de usar sua conexão DSL, que incluía telefone e fax, por dois meses. O consumidor já havia sido indenizado pelos danos materiais consistentes nos gastos com celular, mas buscava reparação também pela privação do uso da internet, uma vez que a legislação alemã admite que a privação do uso de bens essenciais seja objeto de compensação. Segundo afirmou o porta-voz da Corte à emissora alemã ARD, ‘a internet desempenha um importante papel hoje e afeta a vida privada de um indivíduo de diversas maneiras decisivas. Portanto, a privação do uso da internet é comparável à privação do uso de um automóvel’. Em sentido semelhante, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por exemplo, já decidira, em 2012, que telefonia e internet encerram serviço essencial, razão pela qual a privação do uso deve ser indenizada.” TEPEDINO, [et. al]. Fundamentos do direito civil: responsabilidade civil, 2021.

22 “A rigor, mais do que de novos danos, pode-se falar de novos bens jurídicos, funcionalmente identificáveis, cuja tutela se associa, conseguintemente, ao reconhecimento de danos injustos, seja pela adequação, por parte do intérprete, dos padrões de comportamento compatíveis com os interesses tutelados (evolução da culpa normativa), seja pela alocação, por parte do legislador, dos riscos decorrentes dos danos produzidos por certas atividades ou por certas pessoas, que protagonizam inexoravelmente a cena contemporânea.[...] No que tange às coisas corpóreas, tal compreensão afigura-se de especial importância, por revelar que o dano injusto não se refere apenas e necessariamente à integridade da sua substância, mas igualmente às utilidades proporcionadas pela coisa e que sejam reputadas merecedoras de tutela.” TEPEDINO, Gustavo; SILVA, Rodrigo da Guia. Novos bens jurídicos, novos danos ressarcíveis: análise dos danos decorrentes da privação do uso. Revista de Direito do Consumidor | vol. 129/2020 | p. 133-156 | Maio – Jun / 2020. DTR\20207460, p. 4.

23 “Nos Estados democráticos, porém, é na esfera política que são reconhecidos os valores comuns e estabelecidos os princípios fundamentais. O direito constitucional representa o conjunto de valores sobre os quais se constrói, na atualidade, o pacto da convivência coletiva, função outrora exercida pelos códigos civis. A primazia da ordem jurídica consubstancia-se na primazia das decisões políticas em face da natureza das coisas, devendo o legislador não só se esforçar por refletir a realidade, mas também, conscientemente, buscar a sua transformação. O direito é justamente isto, uma força de transformação da realidade. É sua a tarefa ‘civilizatória’, reconhecida através de uma intrínseca função promocional, a par da tradicional função repressiva, mantenedora do status quo.” BODIN DE MORAES, Maria Celina. Princípios do direito civil contemporâneo. Coord. Maria Celina Bodin de Moraes. Rio deJaneiro: Renovar, 2006, p. 5.

Rúbia Viegas Schmall
Advogada atuante nas áreas cível e trabalhista. Mestranda em Direito Civil Contemporâneo e Prática Jurídica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC - Rio). Pós-graduada em Direito Processual Civil e do Trabalho pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Bacharela em Direito pela UFBA.

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