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Ferramentas de pesquisa e as marcas

Diante deste cenário, a utilização, por terceiros, de marcas registradas, como palavras-chave em links patrocinados, com indiscutível desvio de clientela, caracteriza ato de concorrência desleal

21/10/2022

Com o crescimento do e-commerce, as ferramentas de pesquisas desenvolveram diversos mecanismos capazes de direcionar os consumidores aos produtos e serviços desejados. Conhecidos como link patrocinado, anunciantes podem cadastrar “palavras-chaves” que serão utilizados para relacionar produtos ou serviços a determinadas empresas, que aparecerão de forma privilegiada durante pesquisas.

Essa utilidade se torna cada vez mais comum, e não encontra proibição legal, pois não contraria o disposto na lei 12.965/14, conhecida como Marco Civil da Internet. A referida lei, garante o direito a livre iniciativa, livre concorrência, bem como a proteção aos direitos do Consumidor na internet, ou seja, além de não infringir tais preceitos a prática é totalmente favorável ao desenvolvimento comercial das empresas.

Entretanto, alguns usuários da ferramenta passaram a utilizar como palavra-chave, marca registrada de terceiros. Assim, ao pesquisar determinada marca, o consumidor seria direcionado ao e-commerce de quem realizou o cadastro e não a quem realmente é proprietário da marca.

Existem dois pontos principais a serem analisados diante de tal prática. A LPI garante direitos aos proprietários das marcas, ao mesmo passo que estabelece limites a proteção conferida. Assim, quem comercializa determinado produto ou serviço inerentes a determinada marca é garantido o direito de realizar a promoção e comercialização desta, independentemente de autorização do proprietário.

Art. 132. O titular da marca não poderá:

I - impedir que comerciantes ou distribuidores utilizem sinais distintivos que lhes são próprios, juntamente com a marca do produto, na sua promoção e comercialização;

Por certo, quem utiliza o link patrocinado para promover marca de terceiros que comercializa, não cometerá ilícito, pois se trata de comerciante ou distribuidor da marca e não de concorrente. Entretanto, terceiro que é concorrente deste, ou seja, comercializa produtos e serviços no mesmo ramo, e utiliza a marca registrada de outrem como palavra-chave em link patrocinado, comete defraudação ao direito de marca registrada. 

O desvio de clientes pela utilização da marca registrada de terceiros é considerado afronta aos princípios gerais da atividade econômica, previstas no art.170 da CF/8832, em especial aos incisos IV e V, que versam sobre o princípio da livre concorrência e da defesa do consumidor. Além disso, é considerada concorrência desleal, de acordo com a lei 9279/96. 

Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem:

II - emprega meio fraudulento, para desviar, em proveito próprio ou alheio, clientela de outrem;

Um importante dado é que o Google, maior ferramenta de pesquisa do mundo, não realiza nenhum tipo de bloqueio a esta prática. De acordo com os termos de utilização do Google “Não investigamos nem restringimos marcas registradas quando elas são usadas como palavras-chave”.

Assim, a ausência de controle sobre a utilização de marcas registradas como palavra-chave, passou a ser alvo de ações judiciais, não somente com o intuito de frear o uso indevido, mas também para o defraudador indenizar o proprietário em danos materiais e morais.

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. VEICULAÇÃO PUBLICITÁRIA. LINK PATROCINADO DO GOOGLE. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DA MARCA DA AUTORA. REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. Empresa ré que ao cadastrar seu anúncio junto ao Google, em link patrocinado, citou como palavra-chave de busca a marca registrada em nome da autora. Por ocasião de buscas feitas por usuários, constava o registro da autora, titular da marca, e, em destaque, como um dos primeiros apontamentos, a publicidade da ré, que buscava atrair, portanto, clientela antes direcionada exclusivamente à autora. Uso indevido da marca da autora e desvio de clientela. Concorrência desleal caracterizada. Danos morais. O ato ilícito ofendeu direitos intangíveis da empresa, como a clientela, independentemente da prova de qualquer diminuição patrimonial da vítima. Dano moral "in re ipsa". Ilícito lucrativo. Valor de reparação adequadamente fixado (R$ 12.000,00). Correção monetária desde a data da sentença, nos termos da Súmula 362 do STJ. Juros de mora a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ). RECURSO DESPROVIDO, COM CORREÇÃO, DE OFÍCIO, DOS TERMOS INICIAIS DA CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. 

(TJ-SP 10070815620168260152 SP 1007081-56.2016.8.26.0152, Relator: Alexandre Marcondes, Data de Julgamento: 13/08/18, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 13/08/18).

A aludida jurisprudência demonstra que o defraudador, ao cadastrar a marca registrada de outrem como palavra-chave, passava a desviar para si clientela. Limitando o proprietário da marca, que seria o real destino dos consumidores. Assim, recentemente, por meio do REsp 1.937.989-SP, julgado em 23/08/22, o STJ compreendeu que a utilização de marca registrada em link patrocinado sem autorização é considerado concorrência desleal.

Diante deste cenário, a utilização, por terceiros, de marcas registradas, como palavras-chave em links patrocinados, com indiscutível desvio de clientela, caracteriza ato de concorrência desleal. A utilização da marca de um concorrente como palavra-chave para direcionar o consumidor do produto ou serviço para o link do concorrente usurpador, é capaz de causar confusão quanto aos produtos oferecidos ou a atividade exercida pelos concorrentes. A deslealdade, aqui, estaria na forma de captação de clientela, por recurso ardil, sem a dispensa de investimentos condizentes. Ainda, a prática desleal conduz a processo de diluição da marca no mercado, que perde posição de destaque e prejuízo à função publicitária, pela redução da visibilidade.

Assim, os danos causados pela utilização indevida de marca é extenso, pois o consumidor poderá ser levado ao erro, ao considerar que determinada empresa possui ligação com o produto ou serviço que pretende consumir e o proprietário da marca será lesado quando ocorre o desvio de clientela e, consequentemente, a redução de seu faturamento. 

Dessa forma, o controle dos links patrocinados ainda será alvo de muitas polemicas, especialmente porque os e-commerces se tornaram importantes meios de faturamento das empresas, qualquer atividade prejudicial a marca poderá causar sérios danos patrimoniais e morais ao proprietário da marca. 

_________________

TJ/SP. APELAÇÃO: 1007081-56.2016.8.26.0152. Relator: Alexandre Marcondes. DJ: 13/08/2018. JusBrasil. 2018. Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/612561391/10070815620168260152-sp-1007081-5620168260152/inteiro-teor-612561420. Acesso em: 12 set. 2021.

BRASIL. Lei nº 9279 de 14 de maio de 1996. Regula os direitos e obrigações relativos à Propriedade Industrial. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 de maio de 1996.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

GOOGLE POLITICS ADS. Google, 2021. Marcas registradas. Disponível em: https://support.google.com/adspolicy/answer/6118?hl=pt-BR. Acesso em: 11 de set. 2021.

BRASIL. Lei nº 12.965 de 23 de maio de 2014. Estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 23 de abril de 2014.

Lorena Marques Magalhães
Advogada na Barreto Dolabella advogados, mestranda em propriedade intelectual e transferência de tecnologia na UNB

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