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Os requisitos para a validade da cláusula contratual que transfere ao comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem

Recentemente, o STJ reafirmou o entendimento de que a validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda.

7/10/2022

Na intermediação de unidades autônomas em estande de vendas, há prestação de serviço de corretagem para a venda de imóveis, sendo que a contratação do profissional (corretor de imóveis) é feita pelas incorporadoras.

Nesse sentido, o cerne da questão aqui em debate é a possibilidade de transferência pela incorporadora (vendedor) ao comprador (consumidor), mediante cláusula contratual, da obrigação de pagar a comissão de corretagem.

A validade dessa cláusula deve ser aferida na perspectiva do Direito do Consumidor, eis que se trata, em regra, de relação de consumo (arts. 2º e 3º do CDC1), porquanto as incorporadoras são pessoas jurídicas que prestam serviços volvidos a comercialização de apartamentos na planta e, por sua vez, o comprador é pessoa física que pretende se valer do que contratou (recebendo a unidade adquirida) na condição de destinatário final.

Pois bem, o Código de Defesa do Consumidor dispõe entre suas garantias, a obrigatoriedade de informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços à disposição do consumidor, com especificação correta de quantidade, características, composição. Vejamos:

“Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:

(...)

III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.

Assim, no âmbito das relações de consumo, a informação adequada sobre os produtos e serviços não é apenas um direito do consumidor, mas um dever imposto ao fornecedor, conforme se pode extrair, dentre outros, dos seguintes enunciados normativos do Código de Defesa do Consumidor, verbis:

“Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”.

“Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido e alcance”.

“Art. 52. No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:

I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;

II - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros;

III - acréscimos legalmente previstos;

IV - número e periodicidade das prestações;

V - soma total a pagar, com e sem financiamento”.

Para o Ministro Humberto Martins, "mais do que obrigação decorrente de lei, o dever de informar é uma forma de cooperação, uma necessidade social. Na atividade de fomento ao consumo e na cadeia fornecedora, o dever de informar tornou-se autêntico ônus proativo incumbido aos fornecedores (parceiros comerciais, ou não, do consumidor), pondo fim à antiga e injusta obrigação que o consumidor tinha de se acautelar (caveat emptor)"2.

Da mesma forma, se é direito do consumidor ser informado (art. 6.º, III), e dever do fornecedor prestar a informação de forma clara, a cláusula ou prática que considere o silêncio do consumidor como aceitação, mesmo com falha da informação, não pode prevalecer, acarretando a nulidade da cláusula3.

Repita-se que a obrigação de bem explicar o plano, o contrato, o preço, o serviço ou o uso do objeto é do fornecedor, assim como a obrigação de entregar cópia do contrato redigido de forma clara.

Por ser assim, o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o REsp 1.599.511/SP, julgado sob a sistemática dos repetitivos (Tema 938), firmou o entendimento no sentido de que a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, somente terá validade se previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma ao consumidor, com o destaque do valor da comissão de corretagem4.

Desse modo, para ser considerada válida, a referida cláusula deve prever de forma clara e expressa que a obrigação do pagamento da comissão de corretagem é do comprador (consumidor), indicando, ainda, qual o valor que será pago a esse título, de forma que havendo omissão quanto ao valor que será redirecionado para o pagamento da comissão, a cláusula será considerada nula.

Recentemente, houve a reafirmação desse entendimento pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 2020138/SP (2022/0254142-2), de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, a saber:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AC¸A~O DECLARATO'RIA DE RESILIC¸A~O DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA COM RESTITUIC¸A~O DE VALORES. VENDA DE UNIDADES AUTO^NOMAS. EXTINC¸A~O DO VI'NCULO CONTRATUAL. INICIATIVA DO CONSUMIDOR. RETENC¸A~O. POSSIBILIDADE. NATUREZA INDENIZATO'RIA E COMINATO'RIA. COMISSA~O DE CORRETAGEM. INFORMAC¸A~O DESTACADA. AUSE^NCIA. INADMISSIBILIDADE. SU'MULA 7/STJ. DISSI'DIO JURISPRUDENCIAL. PREJUDICADO.

1. Ac¸a~o declaratória de resilição de promessa de compra e venda com restituição de valores.

2. Segundo a orientação da Segunda Seção, nos contratos firmados antes da Lei 13.786/2018, o percentual de retenção pela extinção do vínculo contratual de compra e venda de imóveis por culpa do consumidor e' de 25% (vinte e cinco por cento) das parcelas pagas, adequado e suficiente para indenizar o construtor pelas despesas gerais e pelo rompimento unilateral ou pelo inadimplemento do consumidor, independentemente das circunstâncias de cada hipótese concreta. Precedente.

3. Referido percentual possui natureza indenizatória e cominatória, de forma que abrange, portanto, de uma só' vez, todos os valores que devem ser ressarcidos ao vendedor pela extinção do contrato por culpa do consumidor e, ainda, um reforço da garantia de que o pacto deve ser cumprido em sua integralidade.

4."Validade da cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda de unidade autônoma em regime de incorporação imobiliária, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem" (REsp 1.599.511/SP).

5. O reexame de fatos e provas, bem como a interpretação de cláusulas contratuais em sede de recurso especial são inadmissíveis.

6. A incidência da Súmula 7 do STJ prejudica a análise do dissídio jurisprudencial pretendido. Precedentes desta Corte.

7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido”5.

Portanto, há o reconhecimento da necessidade de clareza e transparência na previsão contratual acerca da transferência para o comprador ou promitente-comprador (consumidor) do dever de pagar a comissão de corretagem.

Para cumprir essa obrigação, deve a incorporadora informar ao consumidor, até o momento da celebração do contrato de promessa de compra e venda, o preço total de aquisição da unidade imobiliária, especificando o valor da comissão de corretagem, ainda que esta venha a ser paga destacadamente.

Desse modo, o dever de informação é cumprido quando o consumidor é informado até o momento da celebração do contrato, sobre o preço total da unidade imobiliária e o valor da correspondente comissão de corretagem, devendo esta constar de forma expressa e clara no contrato celebrado entre as partes.

Vê-se, assim, que o Direito do Consumidor, apesar de seu marcado caráter protetivo, não chega ao ponto de subverter a natureza onerosa das relações negociais no mercado de consumo, exigindo apenas transparência no seu conteúdo.

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1 “Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.

Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”.

“Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.

2 STJ. Recurso Especial 1.364.915/MG, j. 14.5.2013. Segunda Turma, rel. Min. Humberto Martins.

3 MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor [livro eletrônico]. 4. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021.RL-1.4.

4 STJ. Recurso Especial 1.599.511/SP, j. 9.5.2016. Tema 938 julgado sob a sistemática dos repetitivos. Segunda Seção.

5 STJ. Recurso Especial 2020138/SP, j. 6.9.2022. Terceira Turma, rel. Min. Nancy Andrighi

Mayara Barretti
Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Nove de Julho - UNINOVE. Pós-graduada em Direito Empresarial pela Universidade Nove de Julho - UNINOVE. Pós-graduada em Direito Processual Civil pelo Instituto Brasiliense de Direito Público - IDP

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