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Cinco motivos para a ANS convocar audiência pública sobre o rito de atualização do rol de procedimentos

Há alguns pontos cegos na proposta da ANS que justificam a ampliação da participação social, seja na definição de competências, seja na construção dos fluxos do processo ou na explicitação dos valores que serão contemplados na normativa.

6/9/2022

A ANS convocou a Consulta Pública 99/22, para colher sugestões da sociedade civil, sobre a proposta de resolução normativa que irá disciplinar o novo rito de atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde. A normativa vai nortear a escolha dos medicamentos, exames e procedimentos que serão incluídos no rol de procedimentos da agência. A consulta pública terminou no último sábado, dia 03/09.

A resolução é necessária, para regulamentar a lei 14.307/21, que introduziu alterações significativas no procedimento: mudou os prazos de análise, introduziu uma nova modalidade de incorporação de tecnologias, exigiu a definição de parâmetros e critérios para as avaliações e criou uma comissão para assessorar a agência nas decisões.

Há alguns pontos cegos na proposta da ANS que justificam a ampliação da participação social, seja na definição de competências, seja na construção dos fluxos do processo ou na explicitação dos valores que serão contemplados na normativa. Procurei sintetizar cinco pontos que a meu ver justificam a convocação de audiência pública:

1. Explicitação da diretriz da participação social

A Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) é fundamental para a eficiência do sistema, mas ela não soluciona todos os problemas se apresentam no processo de atualização do rol, principalmente, quando as questões éticas são mais pronunciadas. Nestas situações, a participação social é fundamental para estimular o debate acerca dos valores que devem nortear a decisão. Portanto, é importante que a nova normativa explicite a participação da sociedade civil, como diretriz do processo de atualização do rol de procedimentos.

2. Protagonismo da COSAÚDE

A Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos em Saúde Suplementar foi criada pela lei 14.307/21, para exercer competências semelhantes às da CONITEC. Porém, a proposta submetida à consulta pública reduz a comissão quase a uma instância de participação social, atribuindo muito mais relevância à Diretoria de Normas e Habilitação de Produtos – DIPRO. É preciso, portanto, restaurar a primazia da comissão, de modo que a futura resolução normativa esteja de acordo com a lei 14.307/21.

3. Inclusão de tecnologias incorporadas ao SUS

As tecnologias introduzidas no SUS devem ser incorporadas ao rol de procedimentos da ANS, sem exceção. Isto é fundamental para a harmonização dos sistemas de saúde. Entretanto, a proposta submetida à consulta pública procura excluir, do âmbito desta nova modalidade de incorporação, as ampliações de uso em geral e as incorporações de tecnologias de uso domiciliar. Entendo que a lei 14.307/21 não dá respaldo a estas duas exceções e que é preciso ampliar a discussão a este respeito.

4. Transparência das reuniões da COSAÚDE

As reuniões da COSAÚDE devem ser transmitidas, gravadas, disponibilizadas e amplamente divulgadas ao público. A transparência é essencial para a legitimidade das decisões havidas no processo de atualização do rol de procedimentos.

5. Participação social na elaboração das NTRPs

A participação social deve acontecer em vários momentos, inclusive, nas etapas mais remotas do processo de atualização do rol de procedimentos, quando são adotados critérios e métricas que condicionam toda a análise. Por exemplo, em análises de custo-utilidade, é preciso que os pacientes, as sociedades médicas e a sociedade civil em geral ajudem os metodologistas a construir métricas de qualidade de vida válidas, para o grupo de pacientes afetado pela decisão. A futura resolução normativa deve prever a participação social na elaboração das Notas Técnicas de Recomendação Preliminar (NTRPs), para evitar que pacientes sejam discriminados por critérios e métricas inadequadas para a patologia que lhes acomete.

Paulo J. Benevento
Advogado sanitarista e consultor em advocacy. Especialista em Direito Sanitário pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Sócio-diretor de Benevento Sociedade de Advogados.

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