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Reforma Tributária - O teor das propostas apresentadas

É importante analisarmos a viabilidade da unificação do ISS dos Municípios com ICMS dos Estados, vez que estes já vivem em constante conflito de competência, cada qual querendo puxar a arrecadação para si, sobre o que deve ser tributado pelo ISS e o que deve ser tributado pelo ICMS, vez que a letra “s” de ICMS também engloba serviços.

2/9/2022

As propostas de reforma tributária atualmente em tramitação, não tem o foco na efetiva redução da carga tributária. O objetivo declarado de ambos os projetos é a simplificação e racionalização da apuração dos impostos. O que não deixa de ser importante, mas não ataca o problema de frente.  

Sabemos que tanto Estados quanto União e Municípios no Brasil, tem seu caixa deficitário, e não podem renunciar a arrecadação, por isso os projetos de reforma tributária que visem a reduzir a carga tributária são inviáveis. Melhor focar mesmo na simplificação, e cada qual sair a vender seu peixe, querendo ser o salvador da nação ou o pai da criança.

Sem o aceno de uma redução da carga tributária estas propostas acabam perdendo a sua força. Vez que a maior mudança prevista é a redução dos custos para apuração dos impostos e não a redução dos impostos em si.  Ficando estes para uma segunda etapa dou sendo consequência da racionalização proposta neste momento.

Em síntese, as propostas em trâmite têm a previsão de unificação de tributos federais, com tributos estaduais e tributos municipais, centralizando esta apuração em um tributo só, a ser arrecadado pela União, ou por um fundo único que depois irá redistribuir tudo novamente entre União, Estados e Municípios.  O novo tributo teria o nome de IVA ou IBS, de acordo com cada proposta.

Enquanto a PEC 45/19, que está na Câmara dos Deputados, pretende unificar PIS, COFINS, ICMS e ISS, criando em substituição a este o IBS.    a PEC 110/19 que está no Senado Federal acrescenta nesta unificação também o IPI, IOF e o CIDE, criando o IVA.

Não há dúvidas que precisamos simplificar o sistema de apuração, com regras claras que tragam segurança jurídica, vez que as questões tributárias levam muitas vezes décadas para a justiça proferir um pronunciamento final.

Há mais de 30 anos, que se fala em reforma tributária no Brasil, e tudo o que vemos neste período é o aumento progressivo da carga tributária.  A carga tributária oficialmente admitida era de 25% do PIB em 1990, agora em 2022 está em 40%.

Mas não é apenas a carga tributária que aumentou nestes 30 anos, diversos estudos também apontam o aumento da desigualdade social, embora os benefícios sociais, bolsa família, auxílio emergencial etc., vem sendo pagos e ampliados, também aumentaram.

Se temos aumento da carga tributária em conjunto com aumento da desigualdade social, é hora sim, de revermos alguns conceitos. O primeiro conceito, pregado por um grupo de defensores da reforma tributária é de que ela deve ser reformulada de formas que combata a desigualdade social.

Este argumento cai por terra justamente pelo fato de que tanto a carga tributária, quanto a desigualdade social andaram juntas nas últimas décadas, crescendo de mãos dadas.  Paradoxalmente, quanto maior a carga tributária, maior ainda a desigualdade social.

Os números a história nos mostram que não é, portanto, aumentando a carga tributária que vai se resolver o problema da desigualdade social, como alguns entusiastas dos projetos de reforma tributária pregam, que devemos aumentar a   tributação do imposto de renda das empresas, aumentar o imposto sobre herança e criando o imposto sobre grandes fortunas, que vai se resolver o problema da desigualdade social.   O pretexto destes entusiastas é de os ricos pagam pouco imposto e deveriam por pagar mais, para termos um país mais justo.

Este conceito é equivocado, pois a única forma de combater a pobreza não é apenas distribuindo a riqueza existente.  Distribuir a riqueza existente, só vai trocar a pobreza de lugar, permanecendo o todo inalterado.

A única forma de resolver o problema da pobreza é criando a riqueza.  Riqueza se cria através da educação e capacitação, fornecendo o Estado as condições mínimas para tal. Pois hoje grande parcela da população está mais preocupada em colocar comida na mesa do que em ter educação.  Logo os benefícios sociais, devem ser uma via de mão dupla, o fornecimento de bolsa e auxílio devem ter em contrapartida a educação.  É o famoso “dar a vara e ensinar a pescar” sob pena de, se assim não o fizer: “ter que dar o peixe sempre”. 

Os defensores desta carga tributária supostamente mais justa, defendem um imposto maior sobre a riqueza gerada pela produção, são os entusiastas da turma do “dar o peixe sempre”.  São os entusiastas de um Estado forte, que detenha todo o controle da riqueza gerada pela nação. 

Alertamos para os riscos contidos nas propostas de reforma tributária ao centralizar a arrecadação de Impostos Municipais com Impostos Estaduais e Federais, levando tudo para o gerenciamento da União, para posterior distribuição entre os Estados e Municípios da parte que lhes cabe.

Já vimos este filme na histórica  falta de pagamento pela União aos Estados das perdas com a Lei Kandir no campo no ICMS,  e na marcha anual dos Prefeitos a Brasília de chapéu na mão em busca de recursos.

Precisamos nos ater a estas propostas de centralização da arrecadação, disfarçada de “IVA dos países desenvolvidos”, bem como nos riscos desta fusão de impostos aumentar ainda mais a carga tributária brasileira.

É importante analisarmos a viabilidade da unificação do ISS dos Municípios com ICMS dos Estados, vez que estes já vivem em constante conflito de competência, cada qual querendo puxar a arrecadação para si, sobre o que deve ser tributado pelo ISS e o que deve ser tributado pelo ICMS, vez que a letra “s” de ICMS também engloba serviços.

Ao reivindicar a arrecadação dos Municípios e Estados para sua alçada, a União, estaria respeitando o conceito de Federação, bem como os princípios da independência e autonomia dos Estados estabelecidos em nossa Constituição Federal?

Será que precisamos de mais reforma? Não seria hora de pensarmos em construir um novo sistema tributário, a partir do estabelecimento de bases conceituais de consenso, que começam discutindo o verdadeiro papel do Estado, se mero distribuidor ou facilitador e criador de riqueza.

Para arrumar o armário é preciso tirar tudo para fora, e depois arrumar novamente guardando só o que interessa. Vamos falar de reforma administrativa e de redução de gastos com a máquina pública, cortando mordomias parlamentares e assim, com uma reforma administrativa e redução de custos, se possa criar espaço para uma reforma tributária de verdade, que possa acenar com a diminuição da carga tributária, que é o que realmente interessa ao país?

Ivo Ricardo Lozekam
Tributarista. Diretor do Grupo Lz Fiscal. Articulista da IOB, Thomson Reuters entre outras. Membro da Associação Paulista de Estudos Tributários e do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário.

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