A agenda ESG e sua suposta ideologização

A expressão ESG tem sido largamente utilizada no ambiente corporativo, e não por acaso. Ela desponta ao ressaltar importantes e atuais questões relacionadas aos eixos que integram o seu acrônimo. Mas o crescimento da agenda não tem ocorrido sem resistências e riscos.

Oriunda da junção das expressões de língua inglesa Enviromental, Social e Governance, a premissa do movimento ESG é de que o setor produtivo e os negócios em geral precisam seguir critérios mínimos de responsabilidade ambiental, social e de governança. Afinal, todas as pessoas estão diretas ou indiretamente ligadas à atividade empresarial, seja como agentes de produção ou como consumidores. Portanto, ao mirar no ambiente corporativo, o paradigma de ESG pretende atingir a toda a coletividade, potencializando cada um de seus eixos.

Se, por um lado, há consenso de que os benefícios de negócios ambientalmente sustentáveis, humanizados e mais organizados ultrapassam os limites das empresas, por outro despontam divergência acerca de como esse paradigma deve ser executado e quais os limites de sua aplicação.

Recentemente, o Governador do Estado da Flórida, Ron DeSantis, fez uma campanha contra investimentos vinculados à agenda ESG, sob o argumento de se tratar de uma “agenda ideológica”¹. Nessa linha, o Conselho de Administração do Estado da Flórida, que tem DeSanctis como um de seus membros, aceitou a proposta defendida pelo Governador de proibir a vinculação de investimentos para o fundo de pensão do Estado a interesses ideológicos ou políticos. De acordo com a lógica de DeSantis, investimentos dessa natureza precisam priorizar “o maior retorno do investimento para os beneficiários, sem considerar crenças não pecuniárias ou fatores políticos”.

Sair do campo narrativo de que suas pautas são ideológicas, será um importante desafio para que a agenda ESG se consolide e ganhe musculatura. Sem adentrar no filosófico (e não menos importante) debate acerca do que é ou não é ideológico, o fato é que o paradigma ESG precisa não apenas encontrar espaço entre os já entendidos e convencidos de sua relevância, mas precisa ecoar entre aqueles que se seduzem pelo discurso do “nós contra eles” ou “farinha pouca, meu pirão primeiro”, cuja aplicação não se restringe ao Brasil.

Falar de responsabilidade em nada tem a ver com renunciar a direitos, mas em equilibrar os ganhos (financeiros, políticos, econômicos e sociais) com os custos que qualquer empreitada exige. Talvez uma maneira interessante de dialogar com Ron DeSantis e seus muitos seguidores a respeito de ESG, caso eles assim aceitassem, seria propor uma medida simples e que está na base da agenda ESG: transparência.

Se um cidadão da Flórida ou beneficiário de qualquer outro fundo de investimento soubesse que seus dividendos estão sendo obtidos a partir do assassinato de crianças escravizadas, por meio de guerras civis sangrentas, pela poluição de mananciais ou pelo desmatamento de áreas nativas. Ou, ainda, pelo assédio moral e sexual praticado às claras em algumas empresas, assim mesmo aprovariam o aporte de suas remessas?

Não temos essa resposta, que demandaria uma pesquisa empírica séria. Mas temos uma pista: conhecer os motivos e motivações de uma pretensa “neutralidade decisória” mostraria que ela não é neutra, e mais, apontaria para eventuais perversidades que essa narrativa tenta ocultar.

Concordem ou não com as premissas da agenda ESG, uma coisa é inquestionável: como a transparência faz bem. Se começarmos por aí, já colaboraremos diretamente para a melhoria da governança e, ainda que timidamente, para a evolução das pautas ambientais e sociais dentro e fora das empresas. Sem muito alarde, é possível que o paradigma siga em frente. Afinal, amanhã há de ser um outro dia!

Jovacy Peter Filho
Sócio e advogado Criminalista do escritório Peter Filho, Sodré, Rebouças, Sardenberg Advocacia.