Com a coercitiva migração para o home office daqueles personagens que integram o sistema da Justiça, em decorrência da pandemia do Coronavírus, o Judiciário foi forçado a se reorganizar para continuar prestando a tutela jurisdicional e atender aos interesses da população durante o período de isolamento.
A mudança repentina dos advogados, promotores, magistrados e serventuários para o teletrabalho, no primeiro momento, foi realizada sem muito planejamento ou organização, em razão da necessidade urgente de praticar o isolamento social.
Nesse cenário, e apesar de todas as dificuldades de adaptação, as tecnologias à disposição do Judiciário, principalmente o processo eletrônico, foram fundamentais para garantir a continuidade dos trabalhos forenses.
O estado de calamidade pública experimentado pela população acabou sendo um marco importante para o avanço tecnológico ocorrido no Judiciário, com a digitalização dos processos físicos, agendamento para despachos virtual com juízes e realização de audiências por videoconferência. Tudo isso em decorrência da adoção do teletrabalho, visando evitar a paralisação do Judiciário, o que vem se mostrando ser eficiente.
Alguns meses após o início da pandemia, o CNJ publicou relatório com a avaliação dos impactos da pandemia nos tribunais, onde foi constatado que a grande maioria dos tribunais editaram normas para regulamentação do trabalho remoto e, desses que editaram normas, alguns ainda fixaram critérios para medir a produtividade.
A conclusão do relatório foi de que a gestão administrativa dos tribunais, apesar dos impactos da pandemia, se adaptou muito bem diante da crise, com a grande maioria dos servidores em regime de trabalho remoto. Com relação a gestão processual, constatou-se que, àquela época, 27% dos processos judiciais tramitavam na forma física dentre os tribunais que participaram do estudo.
Pois bem, já no período pós-pandêmico e utilizando as experiências obtidas e vivenciadas, os Tribunais passaram a editar os regulamentos de trabalho remoto criados, aperfeiçoando o que havia sido editado anteriormente de forma a melhor atender ao interesse público.
Em complemento, o CNJ também editou, em 29/9/21, a resolução 420, que dispõe sobre a adoção do processo eletrônico e o planejamento nacional da conversão e digitalização do acervo processual físico remanescente de todos os órgãos do Poder Judiciário, fixando metas e prazos a serem cumpridos.
Como forma de garantir ainda mais a transparência, tornando público o desempenho e a produtividade dos tribunais, o Conselho Nacional de Justiça lançou em fevereiro de 2022 o painel de Estatísticas do Poder Judiciário. Esse painel permite que qualquer pessoa tenha acesso às informações sobre os processos que tramitam na Justiça brasileira.
Não é surpresa constatar que a maioria dos colegas preferem realizar as audiências por meio de videoconferência, o que lhes permite poupar tempo que seria desnecessariamente gasto com deslocamento pela cidade, além do fato de que, não raras vezes, acaba-se perdendo quase um dia inteiro de trabalho com trânsito e eventuais atrasos na pauta de audiências.
Além da questão de economia de tempo com deslocamento, o trabalho sob regime de home office ainda proporciona outras vantagens, como a possibilidade de trabalhar com roupa casual, mais facilidade para manter uma dieta saudável, maior contato com a família, menos gastos com combustíveis e redução do trânsito de pessoas pelas cidades.
Os advogados, promotores e juízes puderam sair de seus escritórios e gabinetes para trabalhar no aconchego de suas casas de veraneio, por exemplo. Essas mudanças na rotina proporcionaram muito mais qualidade de vida a todos, que possuem uma rotina exaustiva (física e mentalmente) em razão da responsabilidade que a função demanda.
Talvez o único ponto que pode ser visto como “negativo” em toda essa evolução do Judiciário diz respeito ao atendimento de todos os brasileiros com essa nova forma de prestação de tutela, principalmente durante o período de isolamento.
Mesmo em cidades grandes como São Paulo, não são todas as pessoas que possuem equipamento ou até mesmo uma conexão boa e estável para participar de audiência por videoconferência, o que deverá ser alvo de estudos e adequações para poder garantir o acesso à justiça para todos.
Mas é fato que o procedimento virtualizado tem trazido muitos benefícios que não podem ser ignorados. Portanto, a problemática da inclusão e acessibilidade pelo meio virtual trata-se de novo desafio para o Judiciário. Enquanto isso, os casos que se enquadrem nessas condições deverão ser acolhidos pelo meio tradicional, sendo-lhes prestada a tutela da forma que vinha sendo prestada até então.
A bem da verdade, parece que a catástrofe acabou gerando uma oportunidade para ocorrer a evolução do Judiciário, que não foi desperdiçada. Acaso não tivesse ocorrido a pandemia, certamente ainda estaríamos temerários com a adoção do regime de teletrabalho em larga escala de proporção, sem saber ao certo sobre os benefícios e a produtividade que este regime poderia proporcionar.
Apenas à título explicativo, audiência tele presencial ou presencial, como o próprio nome já diz, são audiências realizadas via videoconferência ou presencialmente no fórum, respectivamente. Já a forma híbrida é aquela onde algumas das partes se encontram presencialmente na sala de audiência e outras se fazem presentes por meio de aplicativo de reunião virtual.
Pois bem, com o fim da pandemia, os Tribunais vêm editando Portarias sobre o reestabelecimento das atividades de forma presencial. Por exemplo, o TRT-15 editou a Portaria GP-CR 2/22 que determinou que as audiências serão realizadas, preferencialmente, de forma presencial.
De igual forma, o TJ/MG editou a Portaria Conjunta 1340/22, que retomou as atividades presenciais em todas as unidades judiciárias e administrativas do estado. A referida Portaria ainda faculta ao magistrado a escolha pela realização da audiência ou sessão de julgamento pela forma presencial ou por meio de videoconferência.
Já no TRT-12, foi a Portaria Conjunta SEAP/GVP/SECOR/ 136/22 que encerrou o retorno gradual às atividades presenciais, deixando também à critério dos magistrados a realização de audiências e sessões de julgamento de forma tele presencial, híbrida ou presencial.
Aliás, os Tribunais que estão editando Portarias sobre o retorno das atividades presenciais estão seguindo os mesmos entendimentos, deixando a critério do magistrado a escolha do meio a ser utilizado, mediante justificativa. Outros exemplos de Tribunais que editaram Portarias nesse sentido são: o TJ/MT (Portaria Conjunta 428/20, 1039/21) e o TJ/DFT (Portaria Conjunta 64/22).
Diante desse cenário, é bem provável que as futuras audiências e sessões de julgamento continuem sendo realizadas de todas as formas possíveis (presencialmente, híbrida ou por videoconferência), vez que facilita o acesso à Justiça, dependendo apenas de escolha pelo magistrado ou manifestação e requerimento das partes, devidamente justificados.