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Fraude em cartão de crédito

É direito do consumidor ver cancelados e creditados valores indevidamente lançados na sua conta, mormente quando o consumidor contesta as transações em referência e indica que se trata de fraude.

13/7/2022

Frequentemente, são vistos consumidores, nos termos do artigo 2º da lei 8.078/90 e sob a regência do trato relacional do Código de Defesa do Consumidor, que têm sofrido fraude em cartão de crédito.

São pessoas surpreendidas com diversas compras que simplesmente não realizaram, procedendo oportunamente com a contestação dos valores junto ao banco emissor do cartão de crédito, bem como realizado boletim de ocorrência, para documentar a atuação fraudulenta de clonagem do cartão de crédito e reclamação administrativa no Procon,  para que pudessem resolver amigavelmente o impasse. Mas sem sucesso na efetiva resolução.

O resultado mais comum é que, a despeito da efetiva tentativa de resolução amigável, as operadoras recusam-se a cancelar a parte mais substancial dos débitos indevidamente  lançados na fatura do cartão de crédito. 

Estipulação de prazo de 90 dias ou semelhante para contestar a fatura é abusivo 

Especificamente, há certas emissoras que se recusam ao estorno dos lançamentos, caso os consumidores não façam a contestação no prazo de 90 dias, o que é abusivo. Cuida-se então de hipótese em que a operadora chega a reconhecer que houve cobrança indevida na fatura, tanto que confirma valor lançado de modo incorreto, mas não admite o estorno da despesa, negando-se ao reembolso do efetivamente devido .

É irrazoável, abusivo e ilegal que se alegue o exíguo prazo de 90 dias ou semelhante para contestação de compras no cartão de crédito, sob pena de perda do direito de fazê-lo. Eventual remessa do impasse da contestação à solução judicial é avolumar o Poder Judiciário, quando ainda, sabidamente, trata-se de reclamação que é feita ao Banco de modo reiterado por diversos consumidores

Inequívoco, portanto, que a cláusula que determina a impugnação da compra em 90 dias é abusiva, sendo de rigor o reconhecimento da sua nulidade, para que se possa reaver o quantum indevidamente lançado na  fatura de cartão de crédito.

Seria como se a instituição financeira se subrrogasse no poder de escolher qual o débito será cobrado do consumidor ou não, a seu bel prazer, ignorando a existência de fraude e de efetiva contestação, fixando um prazo de dias para impugnação da despesa, num contrato de adesão, via de regra, sem qualquer cláusula de destaque a respeito da limitação administrativa efetivamente praticada em desvantagem  ao consumidor. 

Modo de realização da fraude no cartão de crédito 

Por meio de atuação completamente atípica, irregular e fraudulenta, são realizadas compras no cartão de crédito, estranhas ao conhecimento do consumidor ou sem a sua anuência. São compras realizadas de modo a fugir do perfil dos consumidores. 

É de conhecimento público que a realização de transações que foge aos padrões habituais dos clientes costuma gerar alerta para a adoção de medidas pelas empresas, que variam do contato com o cliente para confirmação das transações ao bloqueio imediato da conta. Trata-se de procedimento padrão de qualquer empresa que atue com seriedade no mercado e controles preventivos de fraude adequados.

De certo que é inadmissível que uma operadora de cartão de crédito se recuse a tomar providências efetivas acerca do cancelamento de débitos indevidos efetivamente lançados na fatura. É direito do consumidor ver cancelados e creditados valores indevidamente lançados na sua conta, mormente quando o consumidor contesta as transações em referência e indica que se trata de fraude. 

Fraude em cartão de crédito é fortuito interno

Costumeiramente, a fraude em cartão de crédito é fortuito interno, ou seja, risco da própria atividade desenvolvida pelas operados de cartão de crédito, que têm conhecimento da sua ocorrência.

De toda sorte que é aplicável à situação o artigo 14, Código de Defesa do Consumidor:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Ressalta-se que a responsabilidade da operadora de cartão de crédito é objetiva, na qualidade de prestadora de serviços. Referido entendimento advém da teoria do risco do negócio adotada pelo Código de Defesa do Consumidor, colacionando-se as palavras de Carlos Roberto Gonçalves: “A responsabilidade deve recair sobre aquele que aufere os cômodos (lucros) da atividade, segundo o basilar princípio da teoria objetiva: Ubi emolumento, ibi ônus”1. 

O que fazer em caso de cartão de crédito clonado? 

Caso em que houve cartão de crédito clonado

"No caso de utilização de cartão de crédito para compras na rede mundial de computadores, em razão das peculiaridades do ambiente virtual e da ampla facilidade de acesso a dados, como nos casos de clonagem de cartões e obtenção de informações mediante a utilização de programas específicos e criados com tal finalidade fraudulenta, há que se atentar para a circunstância de que as instituições bancárias têm motivos para, ao menor sinal de utilização de dados fora de um determinado padrão do cliente, bloquear cartões e senhas para posteriormente averiguar a regularidade das transações". JFSC, Processo 5016175-62.2020.4.047201/SC 

Danos morais

Ainda, caso o consumidor venha a ser negativado indevidamente por não pagar os lançamentos indevidos da sua fatura, remanesce o direito de pleitear judicialmente danos morais, nos termos do artigo 927, Código Civil, que assim dispõe:

“Aquele que por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Especificamente, versam os artigos 186 e 187 do mesmo Diploma Legal:

“Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”

“Artigo 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.” 

Inequívoco que o consumidor está amparado na legislação e na jurisprudência, para que possa exercer seus direitos e contestar lançamentos indevidos na fatura do cartão de crédito, sem prejuízo de pleitear danos morais, caso venha a ser negativado indevidamente por referida cobrança.

____________

1 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 8ª Edição. SãoPaulo: 2003, p. 339.

Fernanda Giorno de Campos
Sócia do escritório Lopes & Giorno Advogados. Pós-graduada em Setores Regulados pela Fundação Getúlio Vargas e em Direito Processual pela EPM.

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