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Principais aspectos do ordenamento jurídico trabalhista norteamericano

Breve comparativo Brasil vs. Eua.

29/6/2022

O ordenamento jurídico brasileiro difere do norteamericano desde sua origem. Nosso regramento funda-se no sistema romano-germânico – Civil Law – o qual conserva por supedâneo a lei positivada e codificada; o norteamericano, por sua vez, funda-se no sistema anglo-saxão – Common Law – , sustentando-se nos costumes e direito jurisprudencial.

A organização judiciária estadunidense é, outrossim, distinta de nossa realidade. Enquanto no Brasil há um poder Judiciário nacionalmente estruturado e controlado por um único órgão (Conselho Nacional de Justiça), a Justiça americana não é uniforme e inexiste organismo nacional controlador. Se em nosso país há um ordenamento jurídico Federal – a exemplo da CF/88, CC/02, CPC, CP, CPP, CLT e considerável série de leis extravagantes – nos Estados Unidos cada um dos 50 estados possui autonomia para regular a Justiça, ou seja, são as Constituições Estaduais que se dedicam a regular a organização dos tribunais e os procedimentos processuais, dentre outros aspectos.

Partindo-se desta brevíssima noção, certo é que o ordenamento jurídico trabalhista norteamericano difere estruturalmente do brasileiro. No Brasil, os direitos dos trabalhadores estão basicamente previstos e garantidos pela CF/88, CLT, leis extravagantes, não se pode olvidar portarias do Ministério do Trabalho e Previdência, normativas do MP do Trabalho, acordos e convenções coletivas de trabalho; já nos EUA, o principal regramento é a FLSA – Fair Labor Standards Act, editada pelo presidente Franklin Delano Roosevelt em 1938.

Reiterando o fato de que cada Estado norteamericano conserva competência própria, a FLSA traz diretrizes fundamentais. Passamos a destacar, pois, os pontos que consideramos mais relevantes em relação ao direito trabalhista estadunidense, quais sejam; a) jornada de trabalho; b) atuação dos sindicatos; c) período de férias; d) modos de pagamento de salários; d) procedimentos de demissão; e) regras sobre atestados médicos; f) licença-maternidade e g) décimo-terceiro salário.

No Brasil, a jornada padrão de trabalho é de oito horas diárias e 44h semanais; nos Estados Unidos a jornada é de 40h semanais com limite de oito horas por dia. Se no Brasil a regra geral em relação à sobrejornada de trabalho é o adicional de 50% sobre o valor-hora normal e 100% na hipótese de sobrelabor aos domingos e feriados, naquele país o adicional é de 150%, independentemente se exercido o labor em dia útil ou não. Importante destacar que o trabalhador norteamericano apenas terá direito à percepção de horas extras caso seu labor ultrapasse as 40h semanais; assim, se trabalhar 12h em um dia e sete horas nos demais dias da semana – perfazendo 40h – não terá direito ao adicional.

Nos EUA as atividades dos sindicatos (Unions) são regulamentadas por uma lei específica NLRA – National Labor Relations Act – cabendo a cada trabalhador decidir se deseja ou não ser representado. No Brasil, os sindicatos representam a categoria dos trabalhadores, não podendo um trabalhador optar por não ser representado – o que não se confunde a liberdade de se sindicalizar ou não se sindicalizar. Em verdade, os direitos trabalhistas naquele país são menos afetados pelas normas sindicais, propiciando contratos negociados com menor intervenção da entidade e mais flexibilidade entre o empregado e o empregador.

Em nosso país estamos acostumados a usufruir 30 dias de férias após alcançado o período aquisitivo de 12 meses, não se olvidando a possibilidade de fracionamento, nos termos da lei, e de venda de um terço do período integral e o fato de que, em razão das férias, há antecipação de salário e o pagamento do adicional de um terço sobre tal valor. Todavia, nos Estados Unidos inexiste tal direito, cabendo às empresas estabelecer suas próprias normas. Quando o trabalhador desejar usufruir alguns dias de descanso, há de pleiteá-lo junto ao empregador, nos termos estabelecidos pela empresa, geralmente negociados no ato da contratação.

Em relação à remuneração, em nosso país há a figura do salário-mínimo (hodiernamente, R$ 1.212,00)  e do piso salarial da categoria, considerando-se – em regra mais comum – o período mensal. Nos EUA, o salário-mínimo é estabelecido por hora e cada estado pode definir valores próprios, respeitado o mínimo Federal (hodiernamente, US$ 7.25), havendo dois modelos de pagamento: o nonexempt (não isento) e o exempt (isento). No primeiro, mais comum, o trabalhador recebe conforme as horas trabalhadas, inclusive extras, ou um valor certo fixado pelo empregador; no segundo, a empresa oferece um salário anual, sem vinculação às horas trabalhadas e, portanto, sem direito ao adicional de horas extras. O exempt (isento) exige sejam atendidos os seguintes requisitos: a) o empregado deve ganhar pelo menos US$ 455 por semana ou US$ 23.600 ao ano; b) pagamento fixado em valor de salário, não por hora; e c) o cargo precisa fazer parte das funções permitidas pelo governo, sendo que a FLSA prevê a possibilidade de contratação no regime não isento para cargos executivos, profissionais e administrativos, o que torna a norma bastante ampla. Ainda, há leis que estendem este modelo a outras categorias a exemplo de estagiários, estrangeiros e temporários.

Uma das principais diferenças entre Brasil e EUA é o fato de que neste país não existe o aviso-prévio, fundo de garantia e indenizações de distintas naturezas – excetuando-se a hipótese de práticas discriminatórias por parte do empregador ou fatos que possam ensejar danos material ou moral. Como não há aviso prévio é comum ocorrer a cena com a qual nos deparamos em filmes: o empregado é demitido, arruma seus pertences em caixas e deixa a empresa de imediato. Geralmente, o ato de demissão é acompanhado por um gestor de recursos humanos (sobretudo em grandes companhias) ao qual caberá explicar os motivos da rescisão contratual.

Importante salientar, pode empregado e empregador ajustar no ato da contratação formas distintas de rescisão contratual, inclusive combinando eventual valor indenizatório ou outras condições.

Nada obstante haver casos em que seja imperioso o empregado ausentar-se em razão de problemas de saúde, há apenas uma recomendação médica Federal em relação à concessão de “folga remunerada”, não se tratando de regra que obrigue os empregadores. O trabalhador apenas receberá pelas horas não trabalhadas, neste caso de problemas de saúde, caso haja previsão contratual ou o Estado em que se dá a prestação de serviços possuir normativa a respeito.

Ao ensejo, aproveitando o tema, a licença-maternidade nos EUA é de 12 semanas e não é remunerada, garantindo a lei Federal apenas a manutenção do emprego. Certo é, muitos Estados possuem um ordenamento jurídico mais favorável à parturiente, excepcionando-se a regra geral.

Por fim, se no Brasil o trabalhador recebe um 13º salário (gratificação natalina), nos EUA não há previsão deste direito. Entretanto, não raro as empresas prevejam uma gratificação anual sob critérios preestabelecidos; trata-se de um bônus, não havendo – pela lei geral – obrigação por parte do empregador.

Como visto, o ordenamento jurídico trabalhista estadunidense e o brasileiro diferem em sua essência, sendo estes os aspectos que julgo mais relevantes em tratar neste breve artigo, recomendando conheçam as normas trabalhistas estaduais para um conhecimento mais específico. 

Fernando Borges Vieira
Advogado desde 1997 - OAB/SP 147.519, OAB/MG 189.867, OAB/PR 94.745, OAB/RJ 213.221 - Sócio Administrador de Fernando Borges Vieira Sociedade de Advogados, Mestre em Direito (Mackenzie).

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