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Uso de precatórios nas privatizações e no pagamento de outorgas de concessões

O credor de um precatório tem o direito de receber o valor de face dele em dinheiro. A EC 113 apenas antecipa esse efeito do precatório ao permitir o seu uso como equivalente a dinheiro em certos casos.

29/6/2022

1. Introdução

Recentemente, no âmbito de licitação de grande importância, levantou-se questão acerca da possibilidade de utilização de precatório para pagamento de outorga em concessão e para a aquisição de participação acionária de empresa estatal em processo de privatização.

A possibilidade de utilização de precatório para esses fins, introduzida no ordenamento por meio da EC 113/21, suscita questões interessantes. Afinal, essa possibilidade depende de regulamentação e outras medidas preparatórias para que seja efetivamente aplicada? Quais os limites e as decorrências dessa possibilidade do ponto de vista do orçamento público e da própria dinâmica das licitações e dos contratos de concessão e similares?

2. Breve histórico

A existência de diversas “moedas” aceitas para aquisição de bens e direitos no âmbito das privatizações não é uma preocupação recente.

2.1. As previsões da lei 8.031/90

A lei 8.031/90, que criou o Programa Nacional de Desestatização – PND, foi um marco das privatizações. Produto da conversão da MP 155 do mesmo ano, a lei estabeleceu um programa consistente de redução da participação direta do Estado na economia.

O art. 16 da lei 8.031 previa que, para o pagamento das alienações previstas no PND, poderiam ser adotadas três formas operacionais diversas: (1) financiamento pelas instituições financeiras privadas credoras das empresas depositantes de ações junto ao Fundo Nacional de Desestatização, (2) pagamento por meio de títulos da dívida interna vencidos, emitidos pelo alienante das ações ou dos bens e que contivessem cláusula de coobrigação de pagamento por parte do Tesouro Nacional, e (3) mediante transferência de titularidade dos depósitos e outros valores retidos junto ao Banco Central em decorrência do plano de estabilização econômica então em vigor (art. 16, incisos I a III).

Cabia ao Gestor do Fundo Nacional de Desestatização recomendar à Comissão Diretora do PND a forma de pagamento das alienações (art. 21).

Portanto, já se previa a possibilidade de pagamento das alienações de ações de titularidade do Estado por meio de outros meios que não apenas moeda corrente.

2.2. As “moedas” previstas na lei 9.491

Essa possibilidade ampliou-se ainda mais com a edição da nova lei de desestatizações (lei 9.491/97, produto da conversão da MP 1.481-52).

A então nova lei instituiu um novo programa nacional de desestatização. Em relação aos meios de pagamento das alienações pelo Estado, estabeleceu-se que o presidente da República, por recomendação do Conselho Nacional de Desestatização, ficava autorizado a definir os meios de pagamento aceitos para aquisição de bens e direitos no âmbito do PND.

Desde logo, entretanto, a lei 9.491 previa a admissão de pagamento por meio de três grupos de mecanismos (art. 14, incisos I a III).

O primeiro era moeda corrente – algo óbvio, que inclusive dispensava previsão legal expressa.

O segundo era o das Obrigações do Fundo Nacional de Desenvolvimento (OFND), das Letras Hipotecárias da Caixa Econômica Federal (LH-CEF) e dos títulos e créditos já renegociados e que, no momento da renegociação, eram passíveis dessa utilização.

Rafael Wallbach Schwind
Doutor e Mestre em Direito do Estado pela USP. Visiting scholar na Universidade de Nottingham. Sócio de Justen, Pereira, Oliveira & Talamini Advogados Associados.

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