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Planejamento sucessório o caminho mais eficaz

Por que a sucessão planejada é medida cada dia mais benéfica e inteligente na transmissão do patrimônio aos herdeiros.

31/5/2022

Antes de começarmos é de bom tom esclarecer o termo sucessão vem do latim sucessio, do verbo sucedere (sub+cedere), significando substituição, com a ideia subjacente de uma coisa ou de uma pessoa que vem depois da outra'.

Muitas vezes, o tema do planejamento sucessório surge em conversas sobre a sucessão hereditária, todavia, por um preconceito grande é muito mau visto conversar sobre o tema, pois envolve conversar sobre a morte de ente querido, via de regra um ascendente, e a transmissão do seu patrimônio. A grande maioria nesse aspecto, só conhece muito a distância o testamento, mas não entende as modalidades, e os procedimentos legais para tal. E a pessoa que traz o tema a conversa, e vista como uma pessoa gananciosa, ou pior, avarenta.     

Suceder é fato da vida, que vale dizer é finita. Observamos a utilização do termo sucessão na política, como, por exemplo, quando se trata de sucessão presidencial. Nessa oportunidade, inclusive, grande parcela da população ainda acredita que parte apenas do poder Executivo a transformação da realidade brasileira e, ao mesmo tempo, elege sempre os mesmos (ou seus sucessores!) para a criação de leis, ou, infelizmente, acredita em promessas de “novas políticas”, quando, em verdade, depois da posse, normalmente, tal “novo” é mero “mais do mesmo”. Com uma nova decepção, onde residirá a esperança? Na sucessão! Que, pela realidade recente, poderá acontecer não necessariamente por sufrágio, mas, em verdade, por impeachment ou golpe - a depender do gosto do leitor e de sua visão política.

No direito, a sucessão trata de um fenômeno que se observa em várias disciplinas do direito civil, como, por exemplo, no instituto da cessão, no contexto do direito das obrigações', e em um contrato de compra e venda, oportunidade em que o comprador sucede o vendedor. No direito das coisas, de igual forma, a possibilidade da usucapião também expressa sucessão. Todas essas são modalidades de sucessão intervivos'.

Não é preciso ser pessoa de carreira jurídica, nem mesmo ter grandes conhecimentos, para perceber que o inventário virou sinônimo de “processo infinito”, de “dor de cabeça”, de brigas entre herdeiros. Mesmo sabendo que, ordinariamente, a tramitação não dura um século, não há dúvida de que a demora na divisão dos bens deixados pelo falecido, considerando a formação de condomínio entre os coerdeiros até a conclusão da partilha1

No entanto, nosso tema aqui será diverso, tendo como norte a sucessão causa mortis, ou seja, aquela que se inaugura com o falecimento de alguém.

A Constituição da República garante o direito de herança, em seu art. 5°, inciso XXX, do título II, concernente aos direitos e garantias fundamentais. Assegura-se, assim, a sucessão mortis causa privada, não havendo a apropriação pelo Estado dos bens de uma pessoa após a sua morte. Tais bens deverão ser transmitidos aos sucessores do finado, conforme as prescrições da lei civil, só passando para o ente público na ausência dos sucessores legais ou testamentários, hipótese em que se considera a herança vacante2. Há, pois, uma relevante função social no direito sucessório. Isso porque a transmissão patrimonial de alguém que faleceu gera a conservação das unidades econômicas, em prol da proteção de seu núcleo familiar.

O direito de herança constitui-se em corolário do direito à propriedade privada (CF, art. 5°, caput, XXII e XXIII). De fato, a sucessão causa mortis encontra fundamento em dois institutos do direito civil, a saber, a propriedade e a família. Isso porque as situações jurídicas de conteúdo patrimonial, em regra, são passíveis de transmissão hereditária, sendo a família a fornecer os critérios para a escolha dos sucessores legais. Aliás, a transferência da propriedade explicita a relevância prática do direito.

Portanto, trata-se de uma “providência preventiva”, permitindo ao titular de um patrimônio definir, ainda vivo, o modo como deve se concretizar a transmissão dos bens aos sucessores, com vistas a precaver conflitos, cujos reflexos deletérios podem ocasionar, até mesmo, a perda ou deterioração de bens e de pessoas jurídicas.”3

E hoje existe um patrimônio muito mais amplo, sites, e operações digitais monetizadas, rede sociais que geram royalties e comissões, a chamada herança digital. E assim a busca nas gavetas, e documentos ou cofre de alguém quando de sua morte, cada vez mais, vem deixando de fazer sentido. Sem dúvidas, um celular e, principalmente, arquivos em nuvem é que efetivamente, os sucessores poderão ter acesso aos documentos de que irão necessitar para o início do processo de inventário.

Faz muito sentido discutir abertamente com todos os interessados no assunto e, assim, por meio de um planejamento bem elaborado, com regras apropriadas, garantir, em caso de falecimento, não só a sobrevivência do patrimônio, como da própria família, na pessoa dos sucessores. A relevância do planejamento sucessório contemporaneamente se dá por sua inserção em um contexto muito mais amplo, buscando atender anseios de uma nova realidade social que o direito das sucessões por si só não alcança, por ser um “instrumento jurídico multidisciplinar”, pois envolve várias áreas de direito (família, contratos, obrigações, empresarial e tributário).

Por outro lado, algumas vantagens podem ser apontadas ao se optar pelo planejamento sucessório, como a busca por uma maior autonomia pelo autor da herança, para organizar, da melhor forma, o destino de seus bens após sua morte (respeitando-se, claro, os limites da legítima e parâmetros legais), minimizando o risco de litígios judiciais, e exercendo a deliberação de vontade própria do autor da herança de forma mais eficiente. Em contrapartida, a ausência ou um planejamento sucessório ineficaz “pode acarretar uma instabilidade em razão da multiplicidade de critérios utilizados pelos julgadores, com decisões judiciais muitas vezes contrariando a vontade do autor da herança”.

O foco deve ser, portanto, uma personalização caso a caso, vale dizer, na adequação dos instrumentos às necessidades específicas dos interessados profissionais procurados para executar essa complexa tarefa.

Um exemplo é a tributação incidente no testamento é semelhante à do processo de inventário. O principal tributo incidente no processo de inventário e partilha é o ITCMD, cuja alíquota vigente no Estado de São Paulo é de 4% sobre o valor da base de cálculo da herança, em Pernambuco varia de 4% a 8 % de acordo com o valor do quinhão percebido pelo herdeiro. Cada herdeiro é responsável pelo pagamento do imposto incidente sobre a quota parte recebida.

No caso de inventário judicial, o imposto deverá ser recolhido no prazo de até 30 dias após a decisão homologatória do cálculo ou do despacho que determinar seu pagamento. Entretanto, o STF já sumulou o entendimento de que a contagem de prazo para o pagamento do imposto deverá iniciar apenas com a homologação do cálculo “súmula 114: O imposto de transmissão “causa mortis” não é exigível antes da homologação do cálculo.”.

Em virtude da instabilidade econômica do país, da alta carga tributária e das diversas possibilidades de reajustes fiscais a serem adotados pelo governo em relação ao ITCMD – Imposto de Transmissão Causa Mortis, em especial, a votação da proposta de emenda à Constituição 96, de 2015, e do Ofício Consefaz 11, de 2015, que buscam a majoração da alíquota do ITCMD, há de se pensar, com urgência, em formas de promover um legítimo planejamento sucessório. Em que pese a maioria das pessoas não gostarem de falar sobre a morte, deve-se levar em consideração que ela é a única certeza do ser humano, razão pela qual o titular do patrimônio deve pensar em adotar medidas preventivas, de modo a planejar a transferência dos seus bens aos herdeiros, independentemente do tamanho do patrimônio.

E se todos somos mortais, nada mais lógico que realizar o planejamento sucessório com calma para o bem de nossos herdeiros, e também elaborar o testamento vital, mas isso é tema para um próximo artigo, pense nisso.

_____

1 (Código Civil) Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.

2 TEPEDINO,Gustavo; NEVARES, Ana Luiza Maia; MEIRELES, Rose Melo Vencelau. Fundamentos do direito civil: direito das sucessões, 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 3.

3 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: sucessão.7.ed. Salvador: Juspodivm, 2021. p.86.

Andre Luiz B Canuto
Advogado e Professor, Mestre em Direito Penal - especializado em crimes financeiros de competência da justiça federal, direito penal médico, e Planejamento Sucessório.

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