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Como a legalização da cannabis poderia impulsionar a economia?

No âmbito legislativo, há o projeto de lei 399/15, que tem como objetivo permitir o cultivo de cannabis por empresas em território nacional para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais.

3/5/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

A criminalização envolvendo o uso da cannabis beira o negacionismo. Apenas na área medicinal, comprovou-se cientificamente o uso do óleo de cannabis, por exemplo, para tratamento de epilepsia, amenização dos sintomas do mal de Parkinson, controle de dor e indutor de apetite para pacientes de doenças crônicas, incluindo o câncer e, recentemente, o potencial da cannabis no controle de dor ganhou destaque por ajudar na recuperação de atletas de alta performance.  

Os benefícios acima já deveriam ser suficientes para que a discussão sobre a descriminalização fosse realizada de forma mais crítica, não apenas pelas autoridades, mas pela população, que, muitas vezes, acredita em diversas falácias sobre a referida planta.  

Apesar de relevantíssimo, a cannabis não é apenas útil para o ramo medicinal. Esta também possui uso industrial, a exemplo do cânhamo, que pode ser utilizado no ramo têxtil e até mesmo na área de construção civil – as fibras do cânhamo são leves e resistentes, oferecendo excelente regulação térmica. O uso no ramo não é recente, os primeiros registros do uso do cânhamo na construção datam do século VI.  

Além dos exemplos acima e do próprio uso recreativo, que é um dos primeiros usos a serem comumente reconhecidos pela população, a cannabis também possui grande potencial na indústria cosmética e alimentícia, sendo considerada um superalimento pelo seu alto valor nutritivo. Nesse caso, até mesmo as sementes da planta são utilizadas.  

Considerando todas as utilidades acima, a legalização do plantio, uso e venda de produtos à base de cannabis vem sendo tendência mundial, principalmente entre países desenvolvidos e democráticos. E os resultados decorrentes da legalização nestes países vão além do bem-estar da população e atingem patamares impressionantes em relação à economia.  

Por exemplo, de acordo com recente projeção estipulada pelo relatório produzido pelo site Leafly e divulgado recentemente pela Forbes, projeta-se que, caso a cannabis seja legalizada em todos os estados norte-americanos, a indústria poderia sustentar até 1,75 milhão de empregos. Além da referida projeção, lembra-se que a indústria da cannabis mantém 428.059 empregos de tempo integral nos EUA, o que também é um número relevante.  

Como resultado do aquecimento dos empregos e do setor de consumo – repita-se, em diversas áreas, observa-se também grande aumento na arrecadação fiscal, o que pode ser revertido em todo tipo de melhoria para a população. Apenas no Estado de Nova York, de acordo com a análise do Controlador Thomas DiNapoli, a arrecadação decorrente do referido mercado atingiu 20 milhões de dólares em receita no ano fiscal de 2021-2022 e deve aumentar para 115 milhões em 2022-2022, 158 milhões em 2023-2024 e 245 milhões em 2024-2025.  

Não há dúvidas de que tais números são surpreendentes e de que o Brasil poderia se tornar expoente no ramo após a legalização. De dimensões continentais e um dos países mais relevantes no mundo quando a assunto é o agronegócio – “em se plantando, tudo dá”, como já dizia Pero Vaz de Caminha, o Brasil teria muito o que oferecer tanto para o abastecimento interno quanto para a exportação.  

Já em 2016, o assunto já estava em pauta na discussão política brasileira, quando um estudo divulgado pela Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados apontou que a legalização da cannabis no brasil poderia render até R$ 1 bilhão em impostos. Nesse ponto, observa-se mais um tipo de negacionismo, o econômico, uma vez que o país seria em muito beneficiado pelo aumento nos empregos, aquecimento da economia e arrecadação de impostos.  

No momento, embora já tenhamos alguns avanços, principalmente na área medicinal, como observou-se pela expedição da RDC 327, em 2019, pela ANVISA, que dispõe sobre os procedimentos envolvendo a concessão de autorização sanitária para a venda de produtos à base cannabis para fins medicinais, bem como por inúmeras decisões judiciais, que permitem o plantio por pacientes e associações de pacientes para tratamento de inúmeras doenças, ainda há muito o que caminhar.  

Primeiramente, embora a RDC 327 seja um avanço relevante, o principal insumo dos produtos deve ser importado, o que já se torna um impedimento para muitos empreendedores pelo alto custo na importação em decorrência da diferença cambial. Em relação a quem recorre ao judiciário, o indivíduo fica a mercê de possíveis variações jurisprudenciais, o que pode atrasar tratamentos. Além da excessiva burocratização, o tempo é inimigo de quem sofre de alguma mazela.  

No âmbito legislativo, há o projeto de lei 399/15, que tem como objetivo permitir o cultivo de cannabis por empresas em território nacional para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais. O referido projeto havia sido aprovado pela Comissão Especial da Câmara de Deputados em junho do ano passado. No entanto, um recurso foi apresentado e atualmente o projeto aguarda deliberação sobre o recurso, que segue na mesa diretora da Câmara dos Deputados. 

De todo modo, por ser um mercado com imenso potencial de crescimento, diversas empresas vêm investindo em pesquisas e é possível encontrar até mesmo fundos de investimento relacionados ao referido mercado. No entanto, para que o tema seja visto com maior seriedade pelas autoridades, é importante que o assunto seja debatido em um nível mais alto pela população, com base em evidências e foco nos potenciais resultados, rechaçando discursos ultrapassados e já refutados cientificamente. Argumentos não faltam. 

Natalia Gigante
Sócia da Daniel Advogados e Mestre em Propriedade Intelectual e Inovação.

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