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Provas digitais na justiça do trabalho

“A revolução 4.0 chegou, e a justiça do trabalho precisa estar atenta a esse momento”. Ministra Cristina Peduzzi.

2/5/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

A justiça do trabalho começou, em 2020, uma ação institucional de formação e especialização de magistrados e servidores na produção de provas por meios digitais. A iniciativa, chamada de Programa Provas Digitais, visa fazer uso de informações tecnológicas para auxiliar magistrados na instrução processual, especialmente na produção de provas para aspectos controvertidos. Como resultado, busca-se maior celeridade à tramitação processual e facilidade para a busca da verdade dos fatos.

A justiça do trabalho não quer ficar mais tão dependente de testemunhas. Além de postagens em redes sociais, já consideradas em processos trabalhistas, registros em sistemas de dados das empresas, ferramentas de geoprocessamento e até biometria passam a ser adotados para provar, por exemplo, a realização de horas extras pelo trabalhador.

O assunto ganhou importância na pandemia da covid-19, com a dificuldade dos juízes para ouvir testemunhas. E levou o CNJ – Conselho Nacional de Justiça – a criar um grupo de trabalho para desenvolver um modelo nacional para as solicitações, uma espécie de Sisbajud, antigo Bacen Jud, da prova digital.

“Muitas pessoas [testemunhas] não têm recurso de informática e tiveram dificuldade para participar de audiência telepresencial. Não tinha computador, tinha dificuldade com o celular. E também surgiu a preocupação pela falta de controle por parte do juiz”, afirma a presidente do TST, ministra Cristina Peduzzi, que complementa: “A revolução 4.0 chegou, e a Justiça do Trabalho precisa estar atenta a esse momento”.

A cooperação entre o CSTJ – conselho superior da justiça do trabalho e a Enamat – escola nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados do trabalho, possibilitou diversas ações de capacitação para o tema. Mas, afinal, o que são provas digitais?

As provas digitais podem ser produzidas em registros nos sistemas de dados de empresas, ferramentas de geoprocessamento, dados publicados em redes sociais e até encontradas por meio de biometria. Qualquer tipo de informação eletrônica, armazenada em bancos de dados, que comprove a efetiva realização de horas extras ou confirme a concessão fraudulenta de afastamento médico pode ser usada como prova digital.

Os dados produzidos podem ser encontrados em fontes abertas, de livre acesso, como pesquisas no Google, sites de transparência, redes sociais, ou fontes fechadas, de acesso restrito, por meio de solicitação judicial, em titularidade de empresas públicas e privadas. Por meio deles, é possível averiguar fatos controversos no curso da instrução processual, ou seja, utiliza-se uma prova digital para chegar mais próximo ao que realmente aconteceu.

Provas digitais e LGPD

Com a vigência da LGPD, surgiu também o questionamento sobre a legalidade e possibilidade do uso desses dados para fins de provas digitais. De acordo com o promotor Fabrício Patury, a LGPD não atrapalha a produção desse tipo de provas. “A lei apenas criou regras mais protetivas para evitar vazamentos e abusos de dados. No caso do Judiciário, sempre há consentimento ou uma base legal para a captura. Já temos mais de um ano de LGPD e, nesse tempo, só vi melhoras na produção probatória”, relata.

Além disso, como foi apresentado na seção “Fundamentos legais”, a própria LGDP faz parte do arcabouço normativo para o uso de provas digitais no Judiciário.

A obtenção de dados por determinação judicial não se enquadra como vazamento de dados, não configurando nenhuma ofensa à nova Lei.

Além disso, o art. 370 do CPC determina que “caberá ao juiz de ofício ou a requerimento da parte determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”. Assim, não haveria qualquer objeção na solicitação por ofício do juiz ou a requerimento da reclamada quanto aos registros da geolocalização do empregado.

Nota-se que o princípio da oralidade na justiça do trabalho possui papel fundamental no processo trabalhista, em especial quanto à prevalência da prova oral, seja pelo depoimento das partes ou pelo depoimento de testemunhas nos casos de matérias fáticas.

Entretanto, a prova testemunhal, mesmo que realizada na presença do magistrado, muitas vezes se apresenta falha por motivos de amizade íntima ao obreiro ou interesse na causa e, assim, a solução é a utilização das provas digitais, as quais, de forma gradual, estão se tornando cada vez mais relevantes ao processo.

Dessa forma, o uso de provas digitais não ofende, nem mesmo viola o direito fundamental da privacidade. Pelo contrário, sua utilização é de extrema importância na comprovação de matérias fáticas dentro do processo trabalhista.

Portanto, a possibilidade de apresentação destas evidências no processo pelas partes ou de ofício dos magistrados representa verdadeira evolução processual e possibilidade real pela busca da verdade.

É possível acontecer a manipulação de provas digitais trabalhistas?

A possibilidade de manipulação existe e vem de um posicionamento de má fé, uma realidade que deve ser levada a sério.

Há sites que simulam conversas em aplicativos de comunicação, como o WhatsApp. Em poucos minutos, é possível criar uma conversa com imagens e o texto desejado.

Essa possibilidade deve deixar os profissionais em constante alerta, para analisar a veracidade até sua introdução aos autos.

Ele é válido para e-mails e imagens. Sem precisar de muito conhecimento, o cliente de má fé pode criar um documento e tentar usá-lo ao seu favor.

Como é possível incluir provas digitais trabalhistas em um caso?

Em uma era na qual os documentos são facilmente manipulados e o conteúdo online pode desaparecer em questão de segundos, é preciso estar especialmente atento ao material fornecido pelo cliente.

Sendo assim, não basta apenas incluir uma prova digital no processo. A inclusão inadequada pode danificar a condução do caso e comprometer também a autoridade do advogado e a palavra do cliente.

Quais são as etapas de coleta e verificação das provas digitais?

Existem normas que recomendam melhores práticas para o tratamento das evidências digitais, para que seja possível ter confiança no conteúdo.

Uma delas é a ABNT ISO/IEC 27037:2013, onde foram estabelecidas algumas diretrizes para identificação, coleta, aquisição e preservação de evidência digital.

Entenda as etapas de coleta e verificação das provas digitais

Ao falar sobre coleta e preservação das provas digitais, é possível resumir as recomendações em três etapas importantes, que devem ser executadas em sua totalidade, para obter confiança no conteúdo registrado.

A norma ABNT é completa e com maior abrangência, no entanto, as etapas específicas da coleta e da preservação foi um resumo para que fosse possível uma compreensão mais simples.

As etapas devem ser cumpridas com agilidade, garantindo a preservação do material a fim de evitar que ele seja descartado e perca o papel de consulta posterior.

Felizmente, com a importância cada vez maior das provas digitais trabalhistas, o mercado já se desenvolveu para fornecer soluções inovadoras, confiáveis e com validade jurídica para o advogado.

Com isso, o advogado consegue capturar e preservar as provas digitais auditáveis para que as mesmas possam ser utilizadas em tribunal, economizando tempo e preservando sua autoridade.

O que protege a inclusão de provas digitais trabalhistas em um processo para que ele seja aceito em tribunal? Já existem casos de sucesso?

Veja exemplos de casos de sucesso com provas digitais trabalhistas

Conforme foi ressaltado acima, as provas digitais são excelentes aliadas de clientes e advogados, desde que tenham sua veracidade comprovada.

Portanto, é isso que torna uma prova digital apta para inclusão em processo: ter a certeza de que o material corresponde ao fato ocorrido na Internet, não foi manipulado e que é possível auditar a sua procedência.

Um simples print screen de um e-mail ou conversa no WhatsApp pode ter o seu crédito questionado. Em contrapartida, ao investir em soluções que preservam a auditoria do material, o profissional tem em mãos evidências poderosas e que podem impactar na resolução do caso.

Em 2019, uma empresa demitiu a empregada por ter ido a uma festa, e ter postado nas redes sociais, estando de atestado médico. Contudo, a funcionária apresentou o atestado para o período de 05 a 10 de Junho de 2019, devido a cervicalgia, mas, no dia 07 de junho, ela fez uma postagem na rede social, indicando que estava em casa noturna. Tal fato foi admitido pela empregada no processo administrativo disciplinar instaurado e ao final, a empregada foi despedida por justa causa.

Outro caso que pode ser citado, é referente a uma auxiliar financeira, que foi dispensada por justa causa devido aos comentários depreciativos realizados contra o empregador em uma postagem no facebook. A 17ª turma entendeu que foi praticado ato lesivo da honra e da boa fama de seu superior hierárquico.

Como é possível registrar provas digitais trabalhistas com alta confiança?

Em março de 2021, o juízo da 7ª vara do Trabalho de Florianópolis sugeriu o uso de serviços digitais de preservação de evidências para obter alta confiança nas provas digitais.

No processo em questão, a reclamante afirma ter trabalhado para um consultório odontológico como recepcionista pelo período de quatro anos. Porém, ela não tinha registro em carteira de trabalho e não recebia tudo o que tinha direito.

Para comprovar o vínculo empregatício e valores de salários que recebia, a reclamante juntou arquivos de mídia, como capturas de tela e áudios de WhatsApp.

A defesa fez pedido de impugnação das mídias devido ao fato de que elas não foram acompanhadas de ata notarial.

O pedido foi aceito pelo juízo da vara de trabalho, que, no dia 25 de fevereiro do mesmo ano, intimou a reclamante a apresentar: “validação dos arquivos de mídia por meio da ata notarial ou aplicativo Verifact”.

Há casos de aceitação de provas digitais capturadas por meio do serviço na Instância superior do STJ, em 1° e 2° graus, abrindo precedente para este novo formato digital das evidências e fortalecendo a execução do processo trabalhista.

Com os serviços digitais desenvolvidos para o segmento trabalhista, há possibilidade da preservação da integridade e caráter auditável das provas digitais trabalhistas.

Mesmo que a parte contrária conteste a prova, o profissional consegue auditar o material, via perícia técnica, como direito de ampla defesa.

Cristina Simões Vieira
Membro ANPPD® | Direito | Planejamento em Engenharia 4D | Power BI | Tecnologias | Gestão jurídica

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