Migalhas de Peso

A não cumulatividade tributária nas importações

Entenda o que é a não cumulatividade, quais são os impostos não cumulativos e como a aplicação desse princípio pode trazer benefícios para a sua empresa.

25/4/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

É certo que nas operações de importações são cobrados diversos impostos, sendo esse o interesse fundamental do direito tributário, seu foco de estudo. Dessa forma, um tema extremamente recorrente são os princípios. Neste artigo, abordaremos o princípio da não cumulatividade, um tema importante para as empresas.

São princípios como esse que oferecem uma estrutura teórica para, ao mesmo tempo, possibilitar e limitar o poder do Estado de tributar. Tais tributos são imprescindíveis para a arrecadação de recursos para o país.

Esses diversos impostos geram altos custos para a importação, visto que nessa operação a excessiva carga tributária acaba deixando o produto final mais caro e consequentemente dificulta o crescimento de empresas, principalmente as de pequeno e médio porte.

Considerando que esse tema é de alta complexidade, podendo confundir e atrapalhar muitos importadores, é interessante para as empresas entender um pouco mais sobre esse princípio norteador do direito tributário e como o preço do seu produto poderia variar em função disso.

Por isso, nesse artigo explicaremos sobre o princípio da não cumulatividade tributária. Também, especificamos quais os impostos são não cumulativos, destacando o ICMS e quais os futuros dos tributos.

Falaremos também sobre o sistema de crédito e débito e como funciona a não cumulatividade do ICMS, cumulada com o benefício fiscal de Alagoas.

Cumulatividade

Antes de entendermos sobre a não cumulatividade, primeiramente iremos compreender o que é a cumulatividade. A cumulatividade é um princípio que se refere somente aos tributos incidentes sobre a produção e comercialização de bens e serviços.

 Assim, a cumulatividade de impostos é a cobrança de impostos durante cada fase das etapas de produção. Nesse sentido, haverá o pagamento cumulativo de tributos para os produtos que passam por diversas etapas de cadeia de produção, sem a possibilidade de compensação do crédito, essa forma de tributação é denominada de cascata.

Como exemplo, imaginemos a produção de um vestido. Inicialmente, tem-se a produção de algodão por um pequeno agricultor, que vende esse produto para um negociante, que irá vender posteriormente para uma indústria. Esta por sua vez irá modificar a matéria prima, transformando em tecido.

Por conseguinte, o tecido é vendido para outra empresa fabricante de roupas, que vende o vestido para uma loja de departamento. Por fim, o vestido é comprado pelo consumidor final.

Sobre cada venda nesse processo, são cobrados impostos, essa ocorrência é a cumulatividade, princípio que determina que o tributo seja cobrado de forma integral em cada saída.

Princípio da não cumulatividade

De outra forma, o princípio da não-cumulatividade afirma exatamente o contrário, consiste no acréscimo do valor do tributo para não haver sobreposição de tributos, com isso, não há o pagamento duplicado de um mesmo valor que se refere ao imposto.

O que acontece na situação em que se aplica a não cumulatividade é que o imposto pago na etapa anterior será descontado na etapa posterior, devendo a empresa pagar somente o valor diferencial. Para que o pagamento não seja duplicado, esse valor a mais pago torna-se um crédito tributário para as empresas, desse modo, as empresas podem compensar em outra operação pelo valor já pago.

Trazendo uma fonte doutrinária, Paulo Barros de Carvalho conceitua esse princípio assim:

O princípio da não cumulatividade é do tipo limite objetivo: impõe técnica segundo a qual o valor de tributo devido em cada operação será compensado com a quantia incidente sobre as anteriores, mas preordena-se à concretização de valores como o da justiça da tributação, respeito à capacidade contributiva e uniformidade na distribuição da carga tributária sobre as etapas de circulação e de industrialização de produtos. (CARVALHO, 2018)

Historicamente, os tributos não cumulativos surgiram como uma solução para toda a dificuldade econômica que a cumulatividade gerava, uma vez que deixava os produtos caros e isso era um obstáculo para a circulação, uma vez que onerava excessivamente o consumidor final.

A principal diferença na aplicação da cumulatividade e na não cumulativa diz respeito ao cálculo. Quando há a incidência da cumulatividade, devido ao efeito cascata de tributação ocorre a maior arrecadação para os cofres públicos em comparação com a não cumulatividade.

Desde 1988, esse princípio está na Constituição Federal, sendo portanto o seu uso legal conforme o direito. Posto a conceituação do princípio, a seguir, falaremos sobre a aplicação dele nas espécies de tributos do direito tributário brasileiro.

Para elucidar melhor a compreensão sobre a diferença, suponhamos a seguinte situação: existe a cadeia de um produto:

Industrialização ? Distribuidor ? Atacadista ? Varejista.

Vamos imaginar que nos dois casos há um imposto que é não cumulativo e outro cumulativo em uma alíquota fixa de 10%.

Imaginemos ainda que esse produto seja vendido pela indústria por R$ 100,00.

Para o tributo de regime cumulativo teríamos o seguinte:

Contribuinte      Valor do Produto             Débito (10%)     Crédito Saldo do Tributo

indústria              R$ 100,00            R$ 10,00              0             R$ 10,00

Distribuidor        R$ 200,00            R$ 20,00              0             R$ 20,00

Atacadista          R$ 300,00            R$ 30,00              0             R$ 30,00

Varejista             R$ 400,00            R$ 40,00              0             R$ 40,00

Totais                   R$ 100,00            0             R$ 100,00

Agora, vejamos o que acontece quando o tributo é regido pela não cumulatividade:

Contribuinte      Valor do Produto             Débito (10%)

(D)         Crédito

(C)          Saldo do Tributo (D-C)

indústria              R$ 100,00            R$ 10,00              0             R$ 10,00

Distribuidor        R$ 200,00            R$ 20,00              R$ 10,00               R$ 10,00

Atacadista          R$ 300,00            R$ 30,00              R$ 20,00               R$ 10,00

Varejista             R$ 400,00            R$ 40,00              R$ 30,00               R$ 10,00

Totais                   R$ 100,00                            R$ 40,00

Assim, vemos que enquanto o que está sob o regime da cumulatividade gastou R$ 100,00 com tributos, a empresa sob a não cumulatividade gastou apenas R$ 40,00, que corresponde aos 10% ao valor final de venda ao contribuinte.

Dessa forma, fica claro que é extremamente vantajoso para as empresas a utilização de um regime não cumulativo, diminuindo os gastos com a operação, que por conseguinte poderá proporcionar a maior lucratividade e competitividade de sua empresa.

Impostos não cumulativo

A criação e a regulação de tributos são determinados pela Constituição Federal de 1988. Em seu texto trata sobre quais os impostos são não-cumulativos, o primeiro deles é o IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados – que é o imposto que incide sobre operações realizadas por importador, industrial ou a este equiparado, art. 153, IV, §3º, II.

Outro imposto que a Constituição afirma ser não cumulativo é o ICMS – Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação – que é um imposto de competência dos estados – art. 155, II, §2º, I.

Além desses, a CF trata como não cumulativos os impostos residuais, que são aqueles que não tenham sido previstos ou não possuam fato gerador determinado, art. 154, I.

De outra forma, a CF versa também sobre a não-cumulatividade das contribuições para a seguridade social de competência residual da União, que seguem os mesmos ditames dos impostos residuais, art. 195, §4º c/c art. 154, I.

No mesmo sentido, há a não cumulatividade das contribuições para a seguridade social, COFINS, caso incidam sobre a receita ou faturamento das empresas, assim como sobre a importação de bens e serviços, art. 195, I, b¸ IV e §§ 9º, 11 e 12”.

No texto original de 1988, as duas últimas situações, PIS e COFINS, não estavam previstas. Somente ganharam status constitucional quando foram introduzidas a partir da Emenda Constitucional 42/03.

Em suma, os impostos referentes a não cumulatividade são: PIS/ COFINS; IPI;

ICMS e Impostos residuais. Paralelamente a essas espécies, há a discussão legislativa sobre a criação de um tributo unificado não cumulativo.

A ideia é que esse tributo, denominado IBS – Imposto sobre Bens e Serviços, através de reforma tributária, atue no mesmo sentido dos outros e seja de cobrança única.

A proposta é que esse imposto seja cobrado sobre o valor agregado, como já é o funcionamento dos impostos vigentes. Ele é baseado no IVA – Imposto de Valor Agregado – aplicado em outros países.

O projeto de Emenda Constitucional foi sugerido tanto pela Câmara dos Deputados, quanto pelo Senado e ainda espera por votação.

Sabendo quais os impostos não cumulativos, neste momento, discutiremos especificamente sobre o ICMS.

Sistema de crédito e débitos

O sistema de crédito tributário é derivado do princípio da não cumulatividade, assim, para impedir que ocorra o efeito cascata da cumulatividade. Dessa forma, nas etapas de circulação da mercadoria, quando há o pagamento dos impostos, o contribuinte terá o direito à compensação sobre o valor que já foi tributado anteriormente.

Esse princípio constitucional permite que o contribuinte possa compensar o valor devido em imposto com os créditos de operações já realizadas, nas quais o valor pago foi superior ao que deveria ser pago, concretizando com isso a não cumulatividade.

A título de exemplo, na situação anterior se o vestido é vendido para a loja no valor de R$ 100,00, desse valor 1% é de impostos, assim, o valor original equivale a R$ 99,00 e o restante deve ser pago de tributo.  Essa loja oferece o vestido a 150,00 reais, com a mesma alíquota, equivale o valor do imposto a R$ 1,50.

A loja, pagará o valor de R$ 1,50, no entanto, somente tem saldo devedor equivalente a diferença entre o que já foi pago antes e o valor correspondente ao de venda, ou seja R$ 0,50.

O valor que foi pago de forma integral passa a representar um montante e não será debitado pelo Estado. Fica assim como crédito para que a empresa possa utilizar em outra operação, formando o sistema de débitos e créditos.

ICMS

É o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, que foi adotado no sistema tributário brasileiro, a partir da Constituição de 1988, substituindo outro imposto, o ICM.

Para os estados brasileiro é um imposto de imensa importância, possuindo essa competência para regular de acordo com o art. 155, II da Constituição. Esse tributo tem uma função fiscal, por isso tem o objetivo de arrecadar recursos para as unidades federativas. A regulação é feita através das leis complementares, Lei Kandir, lei complementar 87/96 e LC 24/75.

As hipóteses de incidência desse tributos são expressas na LC 87/96 são:

1. Circulação de mercadoria, isto é, quando há a transferência de titularidade da mercadoria de uma pessoa ou estabelecimento para outro novo titular;

2. Prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal;

3. Fornecimento de mercadoria com prestação de serviço;

4. Entrada de mercadoria bem ou serviço do exterior;

5. Serviço prestado no exterior ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior;

6. A entrada, no território do Estado destinatário, de petróleo e de energia elétrica, quando não destinados à comercialização ou à industrialização, decorrentes de operações interestaduais.

Sobre a incidência, destaca Paulo Barros de Carvalho:

“a descrição do fato de um comerciante, industrial ou produtor, traduzida por verbo e seu complemento vir a praticar operação jurídica que transfira, física ou simbolicamente, a propriedade de mercadoria ou implique sua importação”.

Sobre as características desse tributo, destacamos que é um imposto indireto e plurifásico. Indireto, pois o seu pagamento não é feito de forma direta, desse modo, o ICMS é pago através do valor pago na mercadoria. Assim é ainda plurifásico, visto que o imposto é cobrado em todas as etapas da cadeia de produção.

Nesse mesmo sentido, o ICMS é cobrado, em regra, quando há a saída de mercadoria, com a troca de titularidade. Exceção a isso é o ICMS-Importação, pois, não é possível tributar a saída, visto ser o vendedor uma pessoa do exterior. Dessa maneira, é tributado o ICMS na entrada da mercadoria

Essa situação de incidência tem suporte do STF na Súmula Vinculante 48, que afirma: “Na entrada de mercadoria importada do exterior, é legítima a cobrança do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro”.

 A partir do entendimento dos aspectos gerais do ICMS, seguiremos o texto com o foco no ICMS-Importação.

ICMS-Importação e a não cumulatividade

Anteriormente, vimos que o ICMS será cobrado quando houver a entrada de mercadoria ou bem de origem do exterior, podendo essa entrada ser física ou somente simbólica.

Nessa hipótese do ICMS-Importação é desconsiderada a necessidade de transferência de titularidade da mercadoria para que possa se efetivar o princípio da não cumulatividade, na situação de importação, assim, portanto a transferência da mercadoria deixa de ser um requisito essencial para a incidência de ICMS e consequentemente do mencionado princípio.

A vista disso, conforme afirmado pela Súmula Vinculante, para que haja a incidência do ICMS-Importação somente é preciso que a mercadoria entre no país, por meio do desembaraço aduaneiro.

Dessa forma, quando o legislador menciona a circulação de mercadoria quando se trata de importação, diz respeito à aquisição da mercadoria estrangeira.

Afirmando-se a hipótese de incidência, resta a dúvida: se houver a incidência do ICMS nas operações de importações automaticamente também haverá a aplicação do princípio da não-cumulatividade?

Para responder essa pergunta, faz-se preciso uma análise atenta do texto constitucional que trata da não cumulatividade. Desse modo, a Constituição Federal traz no art. 155, §2º, I sobre a não cumulatividade :

“Será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal”.

Para a doutrina, além da questão da circulação, nas importações surge outra controvérsia a respeito da expressão “montante cobrado”. No ICMS que incide sobre a circulação de mercadorias e prestação de serviços no país, esse montante aparece em cada transferência ao longo da cadeia de produção.

Diferentemente, na importação, o ciclo se inicia com a compra e aquisição da mercadoria estrangeira e finaliza com a venda no mercado nacional, correspondendo a uma operação.

Segundo os doutrinadores, nessa situação não existem dois contribuintes, como nas operações habituais em que cobra-se o ICMS, existe somente um contribuinte e uma operação.

Logo, o montante cobrado na importação é derivado da própria aquisição da mercadoria, por isso é preciso que haja o pagamento do tributo, não bastando só a cobrança.

“O importador, por ter arcado economicamente com o tributo incidente na única operação realizada, a de importação, teria o direito, quando da aquisição de mercadorias transacionadas do exterior, de abater tal montante a título de crédito do posterior imposto a ser devido na sequência do ciclo operacional”.

Outra diferença diz respeito aos contribuintes, como vimos anteriormente, nas operações comuns de ICMS, ao longo da cadeia, há sujeitos diversos, todos eles são responsáveis pela circulação da mercadoria em determinadas etapas de produção.

Enquanto na importação, só existe um responsável, que deve ser o sujeito que terá direito ao crédito decorrente da aplicação da não cumulatividade.

O que acontece nessa situação é que muitas vezes confundem-se na mesma pessoa aquele que é responsável por pagar o ICMS, quem deu causa à importação, e o destinatário final da mercadoria, dificultando a atribuição do crédito.

A Emenda Constitucional 33/01 acrescentou à Constituição no art. 152, IX, “a”, o seguinte texto que trata sobre o sujeito passivo:

sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço;

Assim, a depender do tipo de importação, o sujeito que será aplicado o princípio da não-cumulatividade e terá direito a crédito pode variar, dessa forma é importante entender quem é o responsável pela operação, com isso, recomendamos realizar um planejamento tributário para evitar qualquer prejuízo para a sua empresa.

Redução de custos: conheça o benefício fiscal de Alagoas

Todo importador sabe que a alta carga tributária é um fator que dificulta e atrapalha as importações. Acima, tratamos um pouco da importância do princípio da não cumulatividade e do objetivo da aplicação dele para diminuir os custos das operações.

Além da aplicação desse princípio, é possível ainda ter uma redução maior dos custos com as importações, utilizando Benefícios Fiscais.

Sendo assim, os benefícios fiscais garantem às empresas envolvidas na operação de importação a oportunidade para reduzir esses custos, principalmente referentes ao ICMS-Importação.

É o caso do Estado de Alagoas, que com a utilização do benefício concedido por esse Estado pode-se alcançar uma redução de até 90% do ICMS, reduzindo até 20% dos custos totais da operação.

Dessa forma, com um sistema de crédito e débitos derivado do princípio da não cumulatividade, somado ao benefício fiscal de Alagoas, o importador pode reduzir significativamente os custos com a operação, tornando seu produto mais barato e conquistando para sua empresa um diferencial competitivo.

Cícero Costa
Especialista em planejamento tributário de ICMS normal e em operação de importação por Alagoas, em regimes especiais de tributação e em benefícios fiscais de ICMS em Alagoas.

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