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Projeto de lei das "fake news": uma fraude legislativa

É preciso manter a liberdade à custa de constante vigilância, não permitir que os “inimigos íntimos da democracia” a corroam por dentro, não se render a seduções baratas e nem se deixar levar por manipulações e outros processos insidiosos.

18/4/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

O Projeto de lei 2.630/20 que ganhou o epíteto de “Projeto da Lei das ‘fake news’”, foi apresentado pelo Senador Alessandro Vieira em sua redação inicial, contando agora com novo formato dado pelo Relator, Deputado Federal Orlando Silva.1

A legislação projetada tem uma ementa e um artigo 1º.,  que nos remete, como tem sido muito comum hoje em dia, a Stendhal [Henry Beyle] quando este afirma o seguinte:

“Ao homem foi dada a palavra para esconder seu pensamento”.2

Não existe referência à censura e nem mesmo à imposição de limites ou relativizações da liberdade de expressão, informação e pensamento. Ao reverso, a legislação se autointitula como um diploma protetor da “Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet”. Ora, diante dessa exposição dos fins da legislação em projeto certamente ninguém seria capaz de se posicionar contra a promoção e proteção da “liberdade”, da “responsabilidade” e da “transparência”. Seria muito fácil rotular de autoritária qualquer pessoa que pretendesse criticar essas garantias que refletem cernes do sistema democrático e até mesmo de um referencial ético razoável.

A legislação projetada não reduz essa técnica de apresentação de propostas totalmente palatáveis à sua ementa e ao seu primeiro artigo. Há no corpo do texto algumas disposições indiscutivelmente virtuosas, causando sempre o efeito paralisante de qualquer crítica.

Por exemplo, o artigo 8º. estabelece obrigação aos provedores de disponibilização, de forma acessível, em língua nacional, de informações claras, públicas e objetivas sobre os “Termos e Políticas de Uso”. Quem iria se opor à devida informação do consumidor ou usuário de serviços de internet? Acontece que esse direito do consumidor ou usuário já é garantido pelo Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90) em seu artigo 6º., inciso III, ainda constando do mesmo dispositivo, agora em seu Parágrafo Único, a necessária extensão desse direito de informação com acessibilidade às pessoas deficientes.

Clique aqui para conferir a íntegra do artigo.

____________

1 Cf. PROJETO de Lei 2.630, de 2020. Disponível em https://www.camara.leg.br/midias/file/2022/03/fake.pdf , acesso em 09.04.2022.

STENDHAL [Henry Beyle]. O Vermelho e o Negro. Trad. Maria Cristina F. da Silva. São Paulo: Nova Cultural, 1995, p. 147.

Eduardo Luiz Santos Cabette
Delegado de Polícia aposentado, Mestre em Direito social, Pós - graduado em Direito Penal e Criminologia, Parecerista e Consultor Jurídico, Professor de Direito Penal, Processo Penal, Medicina Legal, Criminologia e Legislação Penal e Processual Penal Especial na graduação e na pós - graduação do Unisal e Membro do Grupo de Pesquisa de Ética e Direitos Fundamentais do Programa de Mestrado do Unisal.

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