A propensão à litigiosidade é um dos fatores a interferir no nível de progresso de um país: quanto mais atrasado este, menos condições tem a sua população de resolver conflitos por si mesma – o que leva à alta recorrência ao Poder Judiciário e ao seu inevitável congestionamento. A busca da desjudicialização compõe, portanto, um movimento abrangente, que contribui, ao fim, para o próprio desenvolvimento da nação.
Desjudicializar equivale, em certa medida, a civilizar: a obtenção de soluções satisfatórias para disputas sem a intermediação de um ente estatal, responsável por fixar obrigações e penalidades, depende da evolução e do amadurecimento institucional dos polos envolvidos. A dispensa da figura do juiz, assim como a desnecessidade das cortes, não deve significar, todavia, ausência de Justiça. Daí a imprescindibilidade da advocacia – guardiã primeira da soberania das leis.
Ciente dessa relevância, o conselho Federal da OAB criou, neste ano, a comissão especial de desjudicialização, cujo propósito é contribuir para a redução dos estoques de processos, os quais, em decorrência do amplo acesso ao Poder Judiciário previsto na CF/88, passaram por um paulatino crescimento desde a década de 1990. Tal inchaço acarretou o aumento da máquina burocrática e a criação de metas e padrões rígidos para controle da produção jurisdicional – medidas que, contudo, pouco refrearam a litigiosidade.
O acúmulo de acervo nas unidades jurisdicionais gera gastos abissais para os cofres públicos, além de prejudicar o direito dos cidadãos à razoável duração do processo – porquanto obriga juízes e demais servidores a empenharem um tempo desmedido em demandas que poderiam ser objeto de entendimento por vias extrajudiciais.
De acordo com o levantamento da Justiça em números, do CNJ - Conselho Nacional de Justiça, publicado em setembro último, havia, no final de 2020, 75,4 milhões de processos em aberto no país. Considerando que, no mesmo ano, a despesa total do Poder Judiciário foi de R$ 100,6 bilhões, em uma situação hipotética de redução de 20 milhões de processos, por exemplo, a economia aos cofres públicos pode superar R$ 26 bilhões.
Felizmente, nos últimos anos, assistimos ao surgimento de diversas ferramentas para a promoção da desjudicialização, como as plataformas de ODR (online dispute resolution) e outras políticas adotadas por empresas que perceberam os ganhos advindos da eliminação ou diminuição drástica de suas carteiras de processos. Embora muitas companhias mantenham posições nos rankings da litigiosidade, tornam-se cada vez mais perceptíveis as vantagens da resolução consensual.
Com a implementação da comissão especial de desjudicialização, a OAB concorre para o cumprimento da meta 16 dos ODS - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da agenda 2030 da ONU - Organização das Nações Unidas. A disseminação e reprodução de práticas bem sucedidas é urgente – esforço que só alcançará êxito se contar com a cooperação dos órgãos de defesa do consumidor, dos cartórios, das agências reguladoras e entidades da sociedade civil organizada.
A OAB está preparada para auxiliar a advocacia a tomar parte nesse cenário de transformação. A presença do advogado é essencial para que o diálogo entre os atores envolvidos na negociação se dê de modo igualitário. Somente os operadores do Direito conseguem pacificar as divergências com eficiência, segurança jurídica e respeito às garantias estabelecidas pelos marcos vigentes.