No fim do ano passado, a primeira seção do STJ aprovou a súmula 650, dispondo que “a autoridade administrativa não dispõe de discricionariedade para aplicar ao servidor pena diversa de demissão quando caraterizadas as hipóteses previstas no art. 132 da lei 8.112/90”1. Isto significa que se a conduta se subsumir a uma das hipóteses de demissão, a administração não pode aplicar pena mais branda.
Entretanto, princípio básico do direito sancionatório é a proporcionalidade. O STF já decidiu que a aplicação da pena de demissão a servidor público federal (RMS 35121/DF)2 deve observar proporcionalidade e considerar as circunstâncias atenuantes.
Por isso, o entendimento sumular não pode ser aplicado acriticamente, tanto pela administração como pelo judiciário. Deve ser temperado com o princípio da proporcionalidade. Afinal, o STF entendeu assim, ainda que em recurso em mandado de segurança.
Caso a caso
A princípio, o verbete representa um raciocínio lógico e simples. Se a lei diz que a demissão “será aplicada” nas situações arroladas ao invés de “poderá ser aplicada”, a constatação de que o servidor praticou aquela conduta a pena demissional é obrigatória.
Para algumas condutas, efetivamente não há espaço para decisão diferente. Por exemplo, inassiduidade habitual é um conceito definido na própria lei. Restando comprovado que o servidor faltou injustificadamente 60 dias num período de 12 meses, a pena de demissão é inevitável.
Existe aquelas que, a rigor, a definição se a conduta ocorreu não deve (ou não deveria) ocorrer no âmbito da administração. É o caso, por exemplo, de “crime contra a administração pública”, pois apenas o Poder Judiciário pode concluir pela existência de conduta criminosa. O mesmo raciocínio vale para o tipo disciplinar “improbidade administrativa”, ainda que existam entendimentos contrários. Nestes casos, se o Judiciário concluiu pela existência do fato punível, a administração fica sem margem para não aplicar a pena de demissão. A propósito, um problema surgirá na questão da demissão por prática de ato de improbidade: A Lei de Improbidade não autoriza a sanção de perda do cargo público para as condutas do art. 11 (infração a princípios), mas, de acordo com a súmula 650, a demissão é obrigatória. É uma grande contradição.
Há tipos disciplinares demissionais que são mais abertos. O que caracteriza proceder de forma desidiosa? Quando uma insubordinação é grave? A própria caracterização do fato exige grau de discricionariedade. Nisto, há risco de um evento de pequena gravidade imputar a pena de demissão de forma irrazoável e desproporcional.
A súmula 650 do STJ não retira o dever da administração de observar o princípio da proporcionalidade. Portanto, a administração deve ter muito cuidado nos julgamentos de processos disciplinares ao qualificar a conduta. A proporcionalidade não será exercida na dosimetria da pena, mas na subsunção da conduta. Deve levar em conta os antecedentes do servidor e as circunstâncias atenuantes, imputando o tipo passível de demissão apenas àquelas situações mais graves em que a sanção mais grave se justifica.
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1 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8112cons.htm?utm_source=Manesco%2C+Ramires%2C+Perez%2C+Azevedo+Marques+Sociedade+de+Advogados&utm_campaign=3c038877ae-EMAIL_CAMPAIGN_4_29_2020_14_45_COPY_01&utm_medium=email&utm_term=0_37e0cc97b3-3c038877ae-17082985
2 https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5248917&utm_source=Manesco%2C+Ramires%2C+Perez%2C+Azevedo+Marques+Sociedade+de+Advogados&utm_campaign=3c038877ae-EMAIL_CAMPAIGN_4_29_2020_14_45_COPY_01&utm_medium=email&utm_term=0_37e0cc97b3-3c038877ae-17082985