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Breve análise do metaverso sob a ótica do direito

Você com certeza já ouviu falar sobre o metaverso, mas se tem dificuldade em entender, ou está curioso em saber um pouco mais, esse artigo visa esclarecer as dúvidas mais elementares sobre o tema, sem a pretensão de esgotá-lo.

5/4/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

O que é o Metaverso?

Primeiramente precisamos fazer algumas considerações sobre o que é o metaverso e como ele funciona.

Ainda não existe um conceito definido de consenso sobre Metaverso, portanto, temos que partir da ideia de que o metaverso é um conceito em construção, que se refere ao uso de tecnologia onde será possível interatuar com a realidade virtual ou com realidade aumentada. Portanto, é um universo virtual no qual vamos poder interagir através “avatares” para realizar tarefas da nossa vida cotidiana, como se estivéssemos no mundo real.

Metaverso surgiu em 1992 a partir do livro "Snow Crash" de Neal Stephenson, onde o autor conecta ficção e realidade através de um jogo onde o personagem é um entregador de pizza na vida real, mas quando ingressa no jogo através de seu avatar, se “transforma” em um samurai”.

Esse foi o princípio de uma gama de jogos que passaram a navegar na mesma onda do metaverso, como second life, minecraft, fortnite, the sims, e roblox, dentre tantos outros.

Vale ressaltar que o termo metaverso ganhou grande visibilidade recentemente após o anúncio feito por Mark Zuckerberg que irá mudar o nome da sua plataforma de rede social de Facebook para Meta Plataforms.

Essa corrida ao metaverso não é novidade, pois grandes empresas como Microsoft, Roblox Snap, Tencent, Amazon, Sony e uma centena de empresas menores também já deram seus primeiros movimentos rumo à esta tecnologia, o que demonstra não só mero interesse por uma moda passageira, mas uma forte tendência de mercado e de novas oportunidades em diversas áreas, inclusive para o direito.

Como funciona o metaverso?

Segundo Charlie Fink, executivo da Disney, as tecnologias baseadas na realidade virtual (RV) e realidade aumentada (RA), há muito favoritas da ficção científica, estão se manifestando aqui e agora, apoiadas pelas gigantes da tecnologia e promovidas por empresas e artistas especializados na interatividade.

As tecnologias baseadas na realidade virtual (RV) e realidade aumentada (RA), há muito favoritas da ficção científica, estão se manifestando aqui e agora, apoiadas pelas gigantes da tecnologia e promovidas por empresas e artistas especializados na interatividade.

A RA amplia a realidade – A RA age como uma “ferramenta” na linha de outras ferramentas de aumento. A experiência de RA mescla a simulação digital com ambientes reais, por isso não pode fornecer total imersão do usuário.

A RV substitui a realidade – A RV transporta você para algum outro lugar ou tempo. O usuário usa um fone de ouvido que fornece uma configuração simulada interativa. Os criadores de conteúdo trabalham com a “presença e agência” da RV para criar várias narrativas, sejam elas divertidas, educacionais ou além de qualquer uma delas.

Metaverso não é só jogo.

É importante frisar que o metaverso não trata apenas de jogos, diversão e rede social, pois existe diversos trabalhos, em diversos campos do conhecimento que estão evoluindo rumo a esta tecnologia.

O executivo Dirk Schart e o produtor Samuel Steinberger veem a RA como transformadora para o trabalho e a educação. Eles imaginam, em breve, hologramas infográficos flutuando sobre cidades e reuniões virtuais em carros.

 Especialistas remotos vão oferecer apoio e treinamento através de visualizações interativas sobrepostas por RA. O neurocientista Walter Greenleaf afirma que a redução dos custos vai tornar a RV amplamente acessível na medicina.

Atualmente, aplicações incluem o tratamento do TEPT com o sistema de RV “Bravemind”, o manejo da dor com a RV e a presença virtual de médicos nas residências.

Para se ter ideia do tamanho do desse mercado, em 2017 investidores derramaram US$ 2,3 bilhões na RA/RV em 2017, o mercado do metaverso tem a expectativa de chegar a US$ 800 bilhões (R$ 4,5 trilhões) em 2024 segundo estimativa da Bloomberg Intelligence.

Direito e metaverso.

Primeiramente temos que entender que não basta o advogado se preocupar em marcar sua presença no metaverso para atender as novas tendências de um mundo cada vez mais virtualizado, mas é preciso também saber explorar as oportunidades que estão surgindo com inúmeras questões a serem resolvidas pelos operadores e pelos Tribunais.

O primeiro escritório de advocacia a utilizar a plataforma Second Life foi o Fieldfisher, de Londres, em 2007, sendo que diversos escritórios nos EUA, Inglaterra e Japão também já estão utilizando essa tecnologia para marcar presença no universo virtual, em plataformas como a Decentraland.

Nesses países já é possível ir além das reuniões feitas pelos aplicativos de vídeo conferência como Zoom, Meet e Teams, e utilizar de ferramentas como óculos e tecnologia 3d para realizar os encontros.

Seguindo a previsão de Bill Gates, cofundador da Microsoft, em poucos anos todas as reuniões de negócios acontecerão no metaverso!

No Brasil ainda paira a discussão da possibilidade ou não da fixação da sede do advogado no mundo virtual, muito em função da decisão do TED da OAB/SP em 2007, que impediu a criação de um escritório na plataforma second life.

No entanto, devemos estar atentos as novas necessidades e oportunidade que estão surgindo no mercado em razão das inovações tecnológicas, da transformação digital e do metaverso.

Nesse sentido, cada vez mais as pessoas estão procurando os advogados para resolver problemas ligados a estes temas, e as principais dúvidas que surgem estão ligadas á proteção de dados, utilização de bitcoins, propriedade digital de ativos digitais, implementação de marktplaces de NFTs, mas não é só isso.

Vemos que essa virtualização do mundo real sempre traz questões e indagações de ordem tributária, pois não se trata somente de taxar como ganho de capital, pois é preciso de fato analisar em cada circunstância a incidência de PIS, COFINS e IRPJ.

Como já se disse, esse mundo virtualizado do metaverso traz séries questões sobre o tratamento de dados a serem coletados através dessas redes, cabendo aos operadores do direito solucionar os entraves da Lei Geral de Proteção de Dados e leis correspondentes e cada País.

A questão da propriedade intelectual também é de grande relevância ao mundo real, pois tudo que se cria no metaverso é passível de registro e carece proteção, mas também temos que nos ater que é possível também proteger mesmo dentro de um ambiente virtual a nossa privacidade, pois mesmo no metaverso deve existir limites.

Podemos falar ainda da necessidade de cuidar de temas como contratos e smart contracts no mundo virtual, onde reuniões e negócios serão fechados expressamente e verbalmente, cabendo o questionamento se esses negócios terão obrigatoriedade e força executiva no mundo real.

Não podemos esquecer também de questões relacionadas ao direito penal, e crimes cibernéticos, bem como crimes contra honra, fraudes, perseguição (stalker), etc.

Por fim, podemos citar o direito do consumidor, dentre inúmeras outras situações em que o Direito deverá intervir no mundo digital, pois como fica a situação do consumidor na aquisição de produtos e serviços no metaverso, e qual é a abrangência do Código de Defesa do Consumidor?

Uma das soluções apresentadas por diversos autores é a Resolução de disputas online (ODR – Online Dispute Resolution) que é uma nova tecnologia para a resolução de conflitos, onde não é necessário o deslocamento das pessoas, podendo os interessados se reunirem através de uma plataforma digital, a fim de resolver o litígio.

Flávio Henrique Azevedo Inacarato
Advogado. Sócio do escritório Inacarato e Advogados Associados. Sócio fundador da AvaUnity. Membro do Comitê Consultivo da LV Strategy & Capital Group. Membro do Conselho Consultivo da DDTOTAL GFI. Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUC - Campinas. Pós-graduação em Interesses Difusos pela Escola Superior do Ministério Público de São Paulo. Especialização em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Superior do Ministério Público de Minas Gerais. Curso de Atualização em Biodireito e Bioética pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Curso de Direito da Tecnologia da Informação pela FGV. Especialização em Direito das Novas Tecnologias pelo Centro de Extensão Universitária - CEU. L.LM. em Direito Tributário pelo IBMEC São Paulo (atual Insper).

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