A execução de títulos extrajudiciais e o direito do devedor confesso parcelar o débito: aplicação à execução trabalhista
Francisco das C. Lima Filho*
1 - Do parcelamento
Entre as várias inovações trazidas pela nova Lei, um deles parece chamar mais a atenção, qual seja, a possibilidade de o devedor confesso obter o parcelamento da dívida.
Com efeito, nos termos da norma inserta no art. 745-A do Estatuto Processual Civil, acrescida pela citada Lei uma vez cientificado o devedor dos termos da execução, poderá discutir a dívida, total ou parcialmente, desde que o faça no prazo de 15 dias ou pagá-la de duas formas: à vista, no prazo de três dias ou em até sete prestações, nos termos da previsão constante do art. 652-A combinado com o art. 745-A do CPC (Lei 11.382/2006).
Entretanto, para que possa o devedor usufruir de tal benefício deve, em primeiro lugar reconhecer a existência da dívida, sendo-lhe proibido discutir qualquer aspecto do crédito pretendido e, ao mesmo tempo, apresentar o comprovante do depósito do valor correspondente a 30% do total da execução, acrescido de custas e dos honorários de advogado requerendo o pagamento do restante do débito em até seis parcelas, acrescidas de correção monetária e juros de 1% ao mês.
Na hipótese do pagamento integral do débito no prazo previsto no art. 652-A do CPC (clique aqui), “a verba honorária será reduzida pela metade”, o que pode ser um grande estímulo para que o devedor decida quitar desde logo a dívida.
Embora a nova norma possa constituir um incentivo para o pagamento de débitos objeto de execução e com isso permitindo maior celeridade na prestação jurisdicional diminuindo o grau de litigiosidade existente na sociedade, a Lei peca quando não exige nenhuma garantia do credor para que possa ser contemplado com o aludido benefício, embora para obtê-lo tenha que exibir o pagamento de 30% do valor da execução.
Teria andado melhor o legislador se tivesse exigido além do pagamento de parte da dívida algum tipo de garantia do devedor para que o benefício do parcelamento fosse concedido evitando que maus pagadores possam lançar mão da faculdade legal apenas para protelar a execução com o pagamento de apenas 30% do devido.
Todavia, e apesar dessa omissão legislativa, não se pode deixar de reconhecer que o legislador deu um passo muito importante para facilitar a satisfação do crédito em período de tempo em que provavelmente a execução não atingiria sua finalidade, especialmente nos médios e grandes centros urbanos onde todas as instâncias do Poder Judiciário efetivamente encontram-se abarrotadas de processos sem a menor condição de solucionar os conflitos neles revelados de forma oportuna e efetiva.
De acordo com a nova norma processual, apresentada a proposta de parcelamento pelo devedor e exibido o recolhimento de 30% do valor devido, o juiz poderá deferi-la autorizado desde logo ao credor o levantamento da quantia depositada com a suspensão dos “atos executivos”, e quando indeferida, a execução terá prosseguimento normal mantido o depósito que evidentemente será compensado do valor final devido (art. 745-A, § 1º).
Parece recomendável que se deva ouvir o credor antes de ser deferido o parcelamento, principalmente porque este não pressupõe nenhuma garantia de que seja efetivamente cumprido, podendo o exeqüente não ter interesse que seja concedido optando pela penhora. Afinal, é ele e não o legislador ou o juiz o titular do crédito, máxime porque uma vez deferido o pedido de parcelamento são suspensos todos os atos executivos.
Não sendo cumprida a obrigação com o não pagamento de qualquer parcela, considera-se vencidas as subseqüentes com o imediato início dos atos executivos, impondo-se ao devedor/executado a multa de 10% sobre o valor das prestações não pagas e vedada à oposição de embargos (§ 2º, do art. 745-A)1.
2 – Aplicação da norma ao processo laboral
Parece não mais restar dúvida que a partir da vigência da Emenda Constitucional 45/2005 (clique aqui) a Justiça do Trabalho tem competência para julgar e executar toda e qualquer controvérsia decorrente da prestação de serviço, subordinado ou não e que é perfeitamente possível executar-se perante esse ramo do Poder Judiciário créditos representados por títulos de crédito como contrato de honorários de advogado, de prestação de serviços de empreitada, termo de ajustamento de conduta, de conciliação firmado perante as Comissões de Conciliação Prévia e qualquer outro título representativo de obrigação que tenha como causa debendi uma prestação de serviço humano2.
Levando-se em conta o que previsto no art. 8º, Par. Único, da CLT parece perfeitamente possível a aplicação da norma do art. 745-A do CPC (Lei 11.382/06) à execução trabalhista que de crédito representado instrumentalizado em título extrajudicial de crédito, desde que tenha como causa debendi a prestação de serviço humano ou que a lei tenha reconhecido como sendo da competência da Justiça do Trabalho, como é o caso do termo de ajustamento de conduta firmado pelo Ministério Público do Trabalho.
Com efeito, das condições previstas no art. 769 da Lei Consolidada para aplicação subsidiária das normas do direito processual comum ao direito processual laboral – omissão das normas processuais trabalhistas e compatibilidade com os princípios informativos do direito processual laboral – se extrai um princípio que deve informar essa possível aplicação: a aplicação de normas do Direito Processual Civil no procedimento trabalhista somente se justifica quando for necessária e eficaz para melhorar a efetividade da prestação jurisdicional labora3.
Assim, as normas do Código de Processo Civil não vinculam, de forma automática, o juiz do trabalho porquanto, este somente deve delas se valer quando compatíveis com os princípios específicos e informativos do processo do trabalho que deve ser omisso e ainda assim, se puderem dá maior efetividade à prestação jurisdicional.
Nessa perspectiva, a norma do art. 745-A do CPC advinda com a Lei 11.382/06 parece satisfazer à mencionada exigência contida no art. 769 da CLT (clique aqui), na medida em se mostra compatível com os princípios informativos do Processo Laboral nomeadamente os princípios da celeridade, da conciliação e da proteção ao trabalhador, em regra autor das ações trabalhistas que poderá além de receber desde logo 30% de seu crédito, ver quitado o restante em razoável espaço de tempo (seis parcelas) sem ter que esperar uma longa e não raro morosa execução cheia de percalços que poderá inclusive terminar sem nenhuma efetividade, como a realidade e a experiência forense nos tem mostrado em muitos casos.
3 - Conclusão
Ante o acima exposto, porque compatível com os princípios informativos do processo laboral e sendo este omisso a respeito da matéria nela disciplina, a norma inserta no art. 745-A do CPC, advinda com a Lei 11.382/2006 pode e deve ser aplicada subsidiariamente na execução dos créditos decorrentes da prestação de serviço humano representados pelos títulos executivos extrajudiciais previstos no art. 876 da CLT, pois permite uma maior agilização na efetiva entrega da prestação jurisdicional ao trabalhador.
Devem, pois, o juizes trabalhistas aplicarem a nova regra processual, pelo menos enquanto a reforma da execução trabalhista não foi aprovada.
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1Quer me parecer que a vedação a oposição de embargos fere o direito-garantia de acesso à jurisdição constitucionalmente previsto (art. 5º, inciso XXXV, da Carta de 1988). Até porque nos embargos podem ser discutidas matérias que não digam respeito ao crédito, mas também algum vício processual ou procedimental, como permite o art. 745 do Código de Processo Civil, mesmo após a vigência da nova Lei.
2Art. 114 da Constituição combinado com o art. 876 da CLT.
3LIMA FILHO, Francisco das C. Violação à cláusula constitucional do devido processo legal para Lei 11.277/06. Inaplicabilidade ao processo laboral. In: CHAVES, Luciano Atayde (Coord.). Direito Processual do Trabalho: Reforma e Efetividade. São Paulo: LTr, 2007, p. 359/374. Vide também SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Incompatibilidades – Reflexos das alterações do Código de Processo Civil no Processo do Trabalho. Suplemento Especial “O Trabalho”. Curitiba: n. 115 - setembro/2006, p. 3481-3495.
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*Juiz Titular da 2ª Vara do Trabalho de Dourados. Mestre em Direito e em Direito Social. Doutorando em Direito Social pela UCLM (Espanha). Professor na Unigran (Dourados-MS).
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