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Do direito de resistência frente ao poder diretivo do empregador

Este estudo se propõe a abordar a evolução do direito de resistência até a sua disposição no ordenamento jurídico seja de forma implícita ou explícita, instituto que pode ser utilizado pelo empregado na insurgência contra o empregador para concretização das disposições constitucionais, sobretudo dos direitos fundamentais.

13/3/2007


Do direito de resistência frente ao poder diretivo do empregador

José Humberto Mauad Filho*

INTRODUÇÃO

Este estudo se propõe a abordar a evolução do direito de resistência até a sua disposição no ordenamento jurídico seja de forma implícita ou explícita, instituto que pode ser utilizado pelo empregado na insurgência contra o empregador para concretização das disposições constitucionais, sobretudo dos direitos fundamentais.

É de suma importância a verificação das possibilidades que o obreiro possui de perseguir os direitos fundamentais garantidos constitucionalmente, sem que o empregador abuse de seu Poder Diretivo.

“Prometeu enfrentou a cólera de Zeus para defender os homens. Cristo dava a outra face ao agressor, mas chicoteou os mercadores no templo. Lampião e Maria Bonita guerreavam na caatinga. Luther King e Malcom enfrentavam o ódio branco. Spartacus fez tremer as legiões. O Vietnã respirou bombas napalm até expulsar o inimigo. João dos Santos, pedreiro, 52 anos, perdeu o filho porque não tinha o remédio, não tinha o remédio porque não tinha dinheiro, não tinha dinheiro porque não tinha emprego, não tinha emprego porque reclamou do patrão, e reclamou do patrão porque não tinha dinheiro1”.

Em todas essas historias, há uma só história, a resistência. O mesmo homem que se submete, sente ímpetos de reagir. As mesmas nações que se curvam, podem um dia se reerguer. O próprio planeta, agredido, já responde à agressão.

No mundo do direito, resiste-se contra a violação da lei, e, às vezes, contra a própria lei, violadora do justo. Mas no mesmo mundo do direito e com igual freqüência, os homens se submetem, ora à lei violada, ora à justiça esquecida.

Busca-se abordar as possibilidades de autodefesa do empregado, em face do empregador frente à realidade brasileira onde o empregado se submete a quase tudo para não perder o emprego.

O Direito de Resistência (jus resistentiae) do empregado se contrapõe ao Poder diretivo do empregador (jus variandi), que muita das vezes extrapola, excede o controle (Poder de Fiscalização), a aplicação de sanções (Poder disciplinar) e até mesmo na organização e regulamentação.

É certo que, do equilíbrio desses dois parâmetros é que deve nascer a atividade harmoniosa e concertada da relação de trabalho. A preponderância ou a falta de qualquer deles deturpa, funcional e eticamente, a atividade do empregado e do empregador na relação jurídica que os une.

Por isso é necessário que o Direito do Trabalho, através de suas instituições jurídicas, forneça os instrumentos desse equilíbrio, se é que deseja de fato mudar de roupagem e entrar nos domínios do neocapitalismo com uma nova mensagem para as relações que disciplina. Sem essa pretensão, continuará apenas a ser um momento de equilíbrio instável entre quem produz e empreende, cultivando entre eles o inevitável embate de diferença de classe que socialmente existe e jamais deixará de existir.

CAPÍTULO 1

ASPECTOS GERAIS DA RESISTÊNCIA

É preciso lembrar, inicialmente, que o direito de resistência deve ser exercido e torna-se legítimo quando há abuso do poder diretivo.

1.1. Das Lutas de Resistência;

O desafio da humanidade sempre foi resistir à opressão, em todos os momentos históricos, seja para sobreviver, em razão da desigualdade, ou por outros fatores. Nesse aspecto, o exercício do direito de resistência tem sido o motor de grandes transformações na sociedade.

Na antiguidade e na Idade Média, o direito de resistência era operado com conceitos similares aos existentes na teoria moderna, ligados ao contra poder político, pois se acreditava na idéia de Estado para deduzir as relações entre este e o indivíduo. Na modernidade, o Estado é reconhecido, seja concebida sua origem natural ou contratual, como um meio para obter certas finalidades sociais, em cujo seio o indivíduo é valorado.

Leon Duguit afirma que o poder é e será sempre um mero fato, expressão da existência de homens que se submetem e de outros que são submetidos, considerando prescindível o poder para explicar a ordem social, pois existe nos homens um sentimento de justiça e um sentimento de sociabilidade, dos quais decorre o fato da solidariedade2.

Mesmo nas sociedades tidas como mais prósperas ocorrem conflitos, tornando necessária a intervenção de uma vontade preponderante, para preservar a unidade ordenada em razão do bem comum. Fazendo uma análise histórica, percebe-se que a manifestação de poder se evidencia mais de determinada forma e de acordo com a evolução: nas sociedades primitivas era a força física; nos povos orientais, na antiguidade greco-romana, e no ocidente após o advento do cristianismo (até o século XVIII) era a divindade; a partir da Idade Média, o povo surge como fonte de direitos e de poder; no final do século XIX chegaram a conclusão que o direito e o poder devem ser vistos como fenômenos concomitantes.

Analisando hoje o poder e sua atuação percebe-se que: o reconhecimento dos que se submete ao poder, é que o legitima, tendo sido admitido como necessário; o poder atua concomitante com o direito; não há poder pessoal, mas um processo de objetivação anterior à vontade dos governados ou da lei, sendo, portanto, o poder despersonalizado (do grupo ou sistema), trazendo a coação apenas como forma extrema, buscando meios sutis de atuação.

No neoliberalismo a atenção do Estado se volta para o mercado e não para o social, buscando uma economia de mercado ilimitada, ou seja, se dedica a atividade econômica em detrimento da política social, sendo o maior ponto de tensão social referente aos movimentos sociais pelo reconhecimento de direitos relativo às empresas pelas relações dos blocos econômicos, passando ambos, empresas e movimentos sociais, a defenderem novos caminhos na solução de conflitos.

Os limites da obediência do indivíduo em relação ao Estado são questionados desde o aparecimento do cristianismo que pregava que o homem não se encerra no Estado, vez que existe uma ordem superior divina, sendo essa resistência passiva, no entanto, estas interpretações religiosas não encontram solução definitiva entre Igreja e o Estado, entre o Direito e a Moral. Portanto, foi o cristianismo que opôs pela primeira vez o indivíduo ao Estado, a consciência à lei.

Do resultado da formação do Estado moderno se origina a complexa relação de legitimação e legalidade. As várias posições políticas da resistência operam na busca de fontes formais ou informais que legitimem seu exercício no Estado de Direito.

O direito de resistência, quanto à justificação política, consubstancia-se na teoria liberal (se fundamenta na concepção individualista e liberdade contratual); socialista (transformação social pela ação política, conclamando proletariados a se unirem num ataque ao Estado capitalista); anarquista (idéia da autonomia da liberdade individual que se antepõe a toda forma de poder sobre o homem, especialmente o poder do Estado); e humanista (idéia de salvaguardar a dignidade humana, fundada em razões humanitárias de justiça social e solidariedade dos povos).

Não é unívoco quanto à teoria e à prática política. Da mesma forma não tem um corte ideológico, a priori, porque se podem apresentar contraditório em si mesmo, como as teorias liberais e socialistas. Mantém sua importância política na construção de um Estado moderno, como também na consolidação da democracia na Europa do pós-guerra.

Não é diferente o direito de resistência aplicado no Direito do Trabalho, uma vez que sua história confunde com a própria história do Direito do Trabalho. Os princípios que regem tal direito estão incrustados na Carta magna, em vários artigos, como no artigo 3º quando se refere ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, além do artigo 5º e 7º.

1.2. Direito de Resistência Como Direito Político

Tradicionalmente, a doutrina tem definido o direito de resistência, jus resistentiae, como o direito subjetivo do empregado de se opor ao cumprimento de ordens manifestamente ilegais ou que, por sua abusividade, lhe atinja a dignidade ou prejudicam as condições de emprego já <_st13a_personname w:st="on" productid="em vigor. Cuida-se">em vigor. Cuida-se da faculdade do empregado de não dar cumprimento às ordens que o firam intimamente ou àquelas maculadas por sua origem ou finalidade contrárias à ordem jurídica.

Todavia, data máxima vênia, esta definição está incompleta, afinal, a resistência é interior à própria relação social de poder e, em determinados momentos de crise ou tensão entre as forças envolvidas, se revela como verdadeiro contra poder, possibilitando a consagração de um conjunto de mecanismos jurídicos destinados a impor limites à amplitude do poder do empregador ou a abrandar seus efeitos.

Sendo assim, o direito de resistir conferido ao empregado é a face oposta e implícita do poder diretivo do empregador concebido como parcela do poder político existente na sociedade.

Não é demais lembrar que esta resistência se exerce em um contexto de pluralismo jurídico.

O pluralismo jurídico sugere que se tem que pensar as relações de poder na sociedade em termos de forças e ordens normativas em constante luta e transformação. Portanto, o pluralismo jurídico permite enxergar o direito sob uma nova ótica: um misto paradoxal de recondução do poder às classes dominantes e de instrumento para a sedimentação de mudanças sociais alcançadas pelas classes despossuídas por meio de longas lutas sociais .

Sendo o poder de direção do empregador uma manifestação do poder político e social das classes detentoras dos meios de produção, a resistência que contra ele se exerce deve ser considerada resistência política.

De outra parte, não se pode deixar de frisar que o regime democrático pressupõe a participação dos interessados na solução de seus conflitos e essa atuação não se exaure na esfera política, abraçando também as demais esferas da vida social. Logo, reconhece-se aos envolvidos a possibilidade de criarem normas que regulam suas relações (como os acordos coletivos de trabalhos e convenções coletivas de trabalho) e também o Estado pode intervir para limitar o poder empresarial, por meio da criação de mecanismos de contra poder como a representação e a participação dos trabalhadores na empresa , conforme preceitua a própria Constituição Federal em seu artigo 11 (clique aqui ).

CAPÍTULO 2

DA RESISTÊNCIA

Assunto muito discutido através de toda a história do direito e muito ligado especialmente ao direito natural. Três são as principais teorias sobre o assunto:

“- pela teoria chamada autoritária, não pode o particular resistir a atos ilegais da autoridade em hipótese alguma, respondendo ela por abuso de poder a posteriori e ressalvado ou reconhecido o direito de reclamação ao prejudicado;

- pela teoria liberal, além de ser um direito é um dever a resistência, porque nesse caso o particular é quem defende o direito, pois não existe presunção da legalidade para os atos dos representantes do poder público;

- pela teoria mista existe o direito de resistência sempre que os atos apresentarem ilegalidade flagrante, evidente ou notória, o que ocorrerá quando eles não se basearem em dispositivos legais de forma e de fundo, evitando-se, todavia, confundir ilegalidade com injustiça do ato. Contra ato injusto não há o direito de resistência” .

O direito de resistência do empregado surge da alteridade existente nas relações de emprego, onde o empregador assume o risco de empreendimento e assim sendo, possui o Poder diretivo em suas mãos. Desta forma, pode organizar o seu estabelecimento sempre na busca de melhores resultados, com poderes de até mesmo alterar a própria relação de emprego.

Tais alterações devem ser olhadas sobre o prisma dos Princípios Protecionistas do Direito do trabalho, pois frente tais alterações, surge para o empregado o Direito de Resistência, que só poderá ser exercido caso tais modificações venham a ser prejudiciais ao trabalho.

O jus resistentiae do empregado não é apenas um direito subjetivo deste para resistir contra ordens ilegais, não contratuais ou abusivas, bem assim instrumento para delimitação do exercício do poder diretivo do empregador por meio da normalização conjunta das relações de força inseridas na relação de trabalho subordinado. O jus resistentiae passa a ser conjunto de mecanismos, diretos e indiretos, de oposição do empregado ao exercício do poder diretivo por parte do empregador. O empregado pode resistir ao exercício do poder diretivo que se encontre fora dos seus limites e participar do redimensionamento desses mesmos limites.

Disto resulta que, por ação conjunta de empregado e empregador, ou de ambos representados por seus sindicatos, encontrem-se os instrumentos jurídicos capazes de minimizar os poderes patronais, seja pela participação dos trabalhadores na gestão da empresa, com a colheita de sua opinião, inclusive quanto à regulamentação do trabalho; seja pela atuação dos trabalhadores nos procedimentos disciplinares, com sua integração às comissões de apuração juntamente com o empregador ou seus representantes; seja pelo estabelecimento, por intermédio de normas coletivas, da forma de exercício de determinadas prerrogativas patronais, mitigando-as. Evidente que essa normalização, diante do caráter conflitual latente da relação de emprego, tem sempre caráter precário. Não é demais lembrar o novel principio da Adequação Setorial Negociada, trazido pelo Ilustre Magistrado Mauricio Godinho Delgado.

Ademais, o jus resistentiae continuará a ser exercido, mormente considerando-se as novas limitações impostas pelo acordo. A precariedade das soluções e a continuidade do direito de resistência prestam-se a preservar o caráter dialético da relação de poder envolvida na relação de trabalho subordinado.

A resistência inserida na relação individual de trabalho ao poder patronal, quando vitoriosa, revela que o direito pode ter, indubitavelmente, uma função transformadora da realidade social a que busca regular. Torna claro, assim, que o direito não é somente uma forma de recondução do poder às classes dominantes, uma reprodução constante das estruturas de poder na sociedade, senão, também, um modo de engendrar mudanças sociais. O direito de resistência comprova que a própria relação de poder é dialética, permitindo que a prática social do direito se conforme as novas realidades.

Cumpre assinalar que há autores que negam a existência de um direito de resistência do empregado ao poder diretivo do empregador, sob o argumento de que a oposição do empregado às ordens ilegais ou atentatórias à sua dignidade não está protegida em relação ao risco de ser tido como insubordinado pelo empregador, ficando, por conseqüência, sujeito à aplicação de sanções .

Não há que se negar, contudo, que o direito de resistência do empregado tem, inúmeras vezes, seu exercício condicionado por também incontáveis fatores sociais, que se iniciam na prodigalidade ou não do mercado de trabalho, especialmente em um país que não regulamentou até a presente data a proteção contra despedidas arbitrárias ou não motivadas, e terminam no próprio clima psicológico no interior da empresa, marcado por maior ou menor grau de repressão . Entretanto, vale lembrar que o indigitado direito de resistência está implicitamente incrustado na Constituição Federal e, de um modo geral, em todo o Ordenamento Jurídico.

Tivemos na história vários fatos de resistência principalmente pós revolução industrial onde os trabalhadores foram muito explorados onde então começaram se organizar em sindicatos e lutando pelos seus direitos.

Os sindicatos dos trabalhadores conseguiram conquistar muitos direitos para os mesmos, porém com o capitalismo selvagem que vivemos faz com que estes percam cada vez mais suas forças.

Talvez o resultado mais visível desses anos de atuação da atual reestruturação produtiva seja o golpe dado ao movimento sindical, em todo o mundo. A adoção de políticas neoliberais e a aceitação das novas regras do jogo resultaram na solidão e abandono dos trabalhadores, e na perda de rumos do movimento sindical.

O atual estágio da economia mundial tem apresentado um conjunto de características que influenciam de maneira decisiva na construção de políticas públicas e na organização dos trabalhadores. O fenômeno da ampliação do desemprego, e a sua relação com a redução de postos de trabalho, têm colocado um grande número de pessoas numa condição de trabalho precária, sem acesso a direitos sociais e com baixa perspectiva de retorno à empregabilidade formal. A situação se agrava se centrarmos nossa análise na parcela da população que, por longos períodos, sequer consegue um trabalho temporário e informal. Para esses, o que resta são as campanhas de caridade, esmolas, ou o caminho da criminalidade como alternativa de sobrevivência.

O desemprego, que daí decorre, atinge praticamente todos os países, numa dimensão nunca antes vista. Conforme Relatório da Organização Internacional do Trabalho – OIT - o total de desempregados no mundo é de 1 bilhão e 200 milhões de pessoas, o que corresponde a um terço da população.

Lutar, resistir a imposições, como? Se nesta luta pode o trabalhador perder o emprego? Achar outro nesta época está difícil, a mão de obra é tanta que não importa a qualificação do trabalhador, este para sua sobrevivência e de sua família “faz qualquer negócio” e o empregador se aproveita da situação para assediá-lo moralmente.

O trabalhador hoje vale o seu salário, ou melhor, não vale nem o seu salário, pois com o grande número de desempregado, o trabalhador não tem mais dignidade, ou seja, ter qualquer salário e se submeter a qualquer coisa para garantir a sua família um mínimo de sobrevivência já o satisfaz e o torna um vencedor no meio de milhares.

Mercados inconstantes, patrões gananciosos e chefes despreparados que produzem grandes distúrbios à saúde física e mental do trabalhador prejudicando também como conseqüência toda sua família e ambiente de trabalho. Devido a todos estes problemas a violência moral no trabalho constituiu um fenômeno internacional segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT) onde pesquisas apontam para distúrbios da saúde mental relacionado com as condições de trabalho e ao submetimento a certas ordens muitas vezes desumanas mas consideradas para o bem do trabalho e para conservar o seu emprego.

É difícil de acreditar, mas o trabalhador vem passando por situações caóticas, como trabalhar num ambiente “Big Brother”, ou seja, num show onde ele é a atração principal, fiscalizam quantas vezes vai ao banheiro, quanto tempo gasta para almoçar, se conversa ou não com colega entre outras situações esdrúxulas.

2.1. Introdução ao Estudo da Resistência pelo Empregado

No âmbito do Direito do Trabalho, o direito de resistência é tratado magistralmente pelo Douto Márcio Túlio Viana, sendo sua tese de doutorado. Em suas conclusões o Juiz do Trabalho de Minas Gerais dizia que o direito de resistência “pode-se destinar tanto à defesa do direito posto como à luta para se pôr o direito. No último caso, apenas quando exercido coletivamente”. A primeira afirmativa ilumina e deixa transparente o elevado número dos atores sociais que efetivamente constroem o Direito, sejam as regras, as normas, os princípios ou os valores, principalmente quando se leva em conta a formação das Normas do Direito do Trabalho.

Alerta, Márcio Túlio Viana, que “pode-se discriminar ferindo regras, mas também com as próprias regras” , ou seja, muita das vezes as próprias regras voltam contra o trabalhador.

Ás vezes, “é o próprio jogo que discrimina”. Exatamente, por este motivo tem-se a relevância de providências legislativas em sentido contrário, como a Lei 9.029 de 1995 (clique aqui) contra os atos discriminatórios, a qual está na “mesma direção” da Constituição. Examinando a evolução do Direito do Trabalho e algumas dificuldades atuais, lembra, em âmbito mais geral, que “O Direito não é obra apenas do legislador. Ele vive ou morre a cada dia nas mãos de cada um de nós” , uma vez que cabe ao interprete do direito a sua exegese.

Em caso concreto, examinou-se alegada justa causa de empregado que teria quebrado os vidros de restaurante, no qual trabalhava, após ser despedido por negar-se a prestar horas extras e sofrer insulto qualificável como ato de racismo. Ali, se afirmou que:

“o autor estava diante de dois problemas não completamente resolvidos pelo nosso atual estágio de desenvolvimento social. Nem a superação do racismo e tampouco a exata limitação da jornada de trabalho estão garantidos, nos dias atuais. Os inúmeros avanços sociais do Estado, seja na modalidade de Estado do bem-estar, socialismo ou social, ainda não apagaram as desconfianças contemporâneas aos primeiros passos do Estado democrático, valendo recordar os lamentos e alertas de grande autor norte-americano da primeira metade dos anos de 1.800. THOREAU, ao opor-se a guerra dos EUA contra o México e, exatamente, contra a política escravagista de seu país, ao final de seu discurso sobre a “A Desobediência Civil”, dizia com desconfiança e protesto... “o indivíduo como o poder mais alto e independente...” .

2.2. Dos Deveres e Obrigações do Empregador

A subordinação do empregado encontra seus limites no que foi pactuado entre as partes-jus resistentiae: o dever do empregador vai até onde vai o contrato; sua personalidade não se anula com o contrato de trabalho. É o direito de resistência às alterações e ordens ilegais ou contrarias as clausulas contratuais

O Poder de fiscalizar, espécie do Poder de direção, cada vez se torna mais irrestrito, chegando ao ponto, por exemplo, de fiscalizar correspondências eletrônicas, efetuar revistas íntimas sem roupa, entre outras situações que vem ocorrendo.

Tais deveres e obrigações dos empregadores se contrapõem aos direitos dos empregados, os quais são veneráveis frente à realidade brasileira onde o empregado se submete a quase tudo para não perder o emprego.

2.3. Aspectos Gerais do Poder Diretivo

Consistindo o poder de direção do empregador em uma prática social de poder legitimada pelo direito, a subordinação do empregado comporta sempre resistência por parte deste, dada sua situação de sujeição ou submissão àquele, todavia, cabe ressaltar que tal subordinação ou submissão, deve ser sempre a jurídica e não uma dependência financeira ou pessoal, conforme está consolidado em súmula da mais alta corte trabalhista.

O Poder Diretivo, também chamado de Poder de Direção em sentido amplo, pode ser dividido em três sub-poderes: 1) Poder Diretivo propriamente dito, que é o atributo do empregador de gerir seus negócios, organizar, dirigir e criar Regulamentos de Empresas; 2) Poder de fiscalização, que pode ser caracterizado por sua função de controle; 3) Poder disciplinar, que é a aplicação de seu regulamento sob os empregados na busca de melhores serviços, sem desídia ou pouco caso dos empregados.

É, por assim dizer, um atributo jurídico do empregador. Direito de alterar; direito reconhecido exclusivamente ao empregador no exercício do poder de direção da empresa.

Cabe ressaltar que a doutrina não é pacífica quanto à adoção de um conceito unânime acerca do poder diretivo do empregador. Isto ocorre porque, como já analisado anteriormente, há grandes divergências entre os autores quanto ao seu fundamento e sua natureza jurídica, o que tem, obviamente, forte repercussão nos conceitos apresentados para o fenômeno.

A Consolidação das Leis do Trabalho não apresenta nenhum artigo que conceitue o poder de direção do empregador. As referências a este, contidas no citado diploma legal são, portanto, indiretas. O art. 2º, ao definir a figura do empregador, afirma que este é quem dirige a prestação pessoal dos serviços. Tal preceito é complementado pelo disposto no artigo seguinte que, ao conceituar a figura do empregado, afirma que este presta serviços sob a dependência do empregador. Logicamente, inclusive por interpretação sistemática, o vocábulo “dependência” deve ser entendido como imprecisão técnica do legislador consolidado que o utilizou equivocadamente quando pretendia dizer “subordinação”. Afinal, a outra face do poder de direção reconhecido no art. 2º nada mais é que o estado de subordinação do empregado. Diante da falta de um conceito legal do poder de direção e de uma precisa definição dos limites de seu exercício pelo empregador, coube à doutrina e à jurisprudência a tarefa de demarcar seu campo de atuação. As opiniões não foram e ainda não são unânimes sobre o conceito, os limites e os desdobramentos do poder diretivo do empregador.

Tal como o poder de comando encontra o jus variandi no contrato individual de trabalho um de seus limites. A lei também lhe impõe fronteiras nesse sentido, como o art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho, que proíbe alterações unilaterais no pacto laboral que possam vir a desvirtuar sua substância ou mesmo alterações bilaterais das quais resultem prejuízos ao empregado. A fronteira a não ser ultrapassada na sua utilização é a manutenção da essência do contrato de trabalho primitivo. Nem se argumente que o art. 468 supracitado proíbe o exercício de qualquer alteração unilateral por parte do empregador, porquanto esta posição seria resultado de uma interpretação restritiva do dispositivo que levada a efeito culminaria com a decretação da inexistência do contrato de trabalho, porquanto o poder de direção restaria de todo abalado dado à impossibilidade do empregador determinar o conteúdo prático da relação de trabalho que, como já se afirmou, é uma relação jurídica de trato sucessivo.

Critérios que autorizam a aplicação do Jus Variandi: a) alterações referentes ao modo e as circunstâncias sob as quais se dá a prestação de serviços, b) alteração referentes a cláusulas contratuais, mas desde que isto signifique elevação das condições anteriormente pactuadas, c) alterações permitidas pela ordem jurídica heterônoma (lei). Ex: Art. 61, §1º, CLT - sobrejornada em caso se força maior, d) alterações contratuais claramente lesivas ao empregado, mas autorizadas por lei. Ex: Arts. 468, 461, §4º, 450, CLT, e) alterações autorizadas pelos instrumentos coletivos e f) alterações permitidas pela CR/88, Art. 7º, VI, XIII e XIV.

2.4. Limitações ao Poder de Direção

Muitas são as limitações ao Poder do empregador, a primeira delas tem origem na legislação cogente (norma de interesse público, que não pode ser renunciadas pelas partes) do trabalho que assinala as fronteiras para seu exercício. O poder diretivo encontra limite na lei trabalhista, não podendo afastar o empregador, por ato unilateral, as normas de caráter cogente e aplicável ao contrato individual de trabalho. A intangibilidade e a irrenunciabilidade de certos direitos trabalhistas funcionam assim como verdadeira linha divisória entre o exercício legítimo e o exercício abusivo do poder diretivo.

Delimitações importantes também podem constar de cláusulas contratuais ajustadas desde o início da relação de trabalho subordinado ou mesmo de cláusulas implícitas. Nada impede que empregado e empregador estabeleçam, de comum acordo, expressa ou tacitamente, maiores limites à utilização do poder diretivo no curso da relação de emprego do que aqueles normalmente previstos ou previsíveis.

Terceiro limite digno de nota à atuação do poder de direção do empregador constitui aquele dado pelas normas constitucionais garantidoras de direitos fundamentais. As normas relativas a direitos fundamentais têm ampla aplicabilidade nas relações jurídicas que se travam na esfera privada. A melhor exegese da Constituição exige que se reconheça a operatividade dos direitos fundamentais também no campo das relações privadas. Assim sendo, os negócios jurídicos entre particulares estão sujeitos à observância das normas constitucionais que encerrem direitos fundamentais. Os direitos fundamentais operam, assim, como claras demarcações para o exercício do poder diretivo.

Tal constatação derruba as interpretações tendentes a reconhecer que o estado de subordinação do empregado, decorrente do contrato individual de trabalho importa uma completa abdicação voluntária dos seus direitos fundamentais no curso da jornada de trabalho contratada.

Pode, desde já, concluir que é o poder de direção que deve se amoldar aos direitos fundamentais do trabalhador e não o contrário, pois basta lembrar do Princípio da Irrenunciabilidade de Direitos (ou indisponibilidade de Direitos, segunda Mauricio Godinho delgado).

Isto significa dizer que sempre será imperativo ao exercício do poder de direção o máximo respeito aos direitos fundamentais do trabalhador.

Paradoxalmente, a norma constitucional serve, a um só tempo, de instrumento de limitação e de legitimação do poder diretivo. Por tal motivo, não se pode cogitar da existência de limites constitucionais a esse poder, mas apenas e tão-somente de um desenho ou um delineamento constitucional, no qual se articulam limites e legitimações, contrapondo ao Direito de Resistência do empregado.

2.5. Resistência e Alterações Contratuais;

Na formação do contrato há o estabelecimento de uma série de regras, umas impostas pelo ordenamento jurídico, e outras estabelecidas pela simples vontade do empregador.

No entanto, ao longo da prestação de serviços esse conteúdo pode ser modificado, desde, logicamente, que respeitado os princípios protetivos do trabalhador como as próprias imposições legais.

As alterações contratuais podem ser de duas montas: Subjetivas, que dizem respeito aos sujeitos contratuais (empregado e empregador) e sua substituição ao longo da prestação de serviços e Objetivas (atingem cláusulas do CT).

No tocante às alterações subjetivas, só pode ocorrer no pólo passivo, qual seja, no tocante ao empregador, conhecido doutrinariamente como sucessão de empregadores. Já quanto aos empregados, o mesmo não ocorre, pois a condição da pessoalidade é elemento fático-jurídico da própria relação de emprego, ou seja, elemento de validade, por assim dizer, da relação.

Já quanto às alterações objetivas, muito se discute sobre suas possibilidades e suas amplitudes.

Classificação das alterações contratuais objetivas:

a) De acordo com a origem: quando as alterações são oriundas da norma jurídica (alterações normativas, ou seja, heterônomas) ou oriunda da vontade unilateral ou bilateral das partes (alterações meramente contratuais, ou seja, autônomas);

b) De acordo com a Obrigatoriedade: imperativas (as que se impõem às partes independente de sua vontade, independente de produção de efeitos favoráveis) e voluntárias (derivadas da vontade das partes);

c) De acordo com o Objeto: qualitativas (dizem respeito à natureza da prestação serviços e a modificação do trabalho pactuado, ou seja, tipo de trabalho, tipo de função, etc.), quantitativas (dizem respeito ao montante da prestação de serviços) e circunstanciais (dizem respeito à situação ambiental ou organizativa da prestação de serviços);

d) De acordo com os Efeitos: favoráveis (quando traduzem a concessão de direitos acima do patamar mínimo) e desfavoráveis (tendem a ser proibidas e não aplicáveis ao empregado, tendo em vista o Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva - exceção).

Cabe destacar algumas classificações, cujas alterações geram ampla divergência doutrinária.

Primeiramente cabe ressaltar as alterações Funcionais favoráveis e desfavoráveis – as primeiras são as lícitas, resultam de ato espontâneo de empregador, e há favorecimento do empregado; as outras são as que pugnam pela incidência do Art. 468 (clique aqui), CLT e podem ser questionadas judicialmente.

Alterações Funcionais Lícitas, que mesmo não sendo vantajosas para empregado são consideradas pelo Ordenamento Jurídico: a) Situações Excepcionais ou de Emergência - alterações funcionais de curta duração, a título excepcional ou em situação de emergência, sem prejuízo do salário; b) Substituição Temporária – situações semelhantes às anteriores, mas motivadas por fatores previsíveis e comuns na dinâmica da empresa; nova função com remuneração maior; se a remuneração for menor; c) Destituição do Cargo ou Função de Confiança – trata do retorno ao cargo efetivo após ocupação do cargo de confiança. Art. 468, p. único, CLT; d) Extinção do Cargo ou Função; e) Alteração de Plano de Carreira e Serviços ou Quadro de Carreira – alteração derivada de modificação de PCS ou Quadro de Carreira; f) Readaptação Funcional por Causa Previdenciária – É válida a readaptação desde que a debilidade seja atestada pelo órgão previdenciário e ainda que o empregado participe do programa de reabilitação profissional e g) Promoção ou Remoção: Promoção – há a progressão horizontal e a progressão vertical. A promoção será um direito do empregado se na empresa existir PCS com previsão de promoções alternadas por merecimento ou antiguidade; Remoção - transferência do empregado de local de trabalho onde isto importe mudança de residência do empregado (atendidos os requisitos do Art. 469, CLT) (clique aqui).

Quanto às alterações salariais prejudicial ao empregado só poderão ser aceitas quando estiver conforme a Constituição Federal, ou seja, quando se der por negociação coletiva (ACT ou CCT), uma vez que prevalece no Direito do Trabalho o Princípio da irredutibilidade salarial.

Em relação ao local de trabalho, há que observar primeiramente se é provisória ou definitiva e se o emprego é de confiança ou possui pacto de transferência. Cabe ainda lembrar que no caso de fechamento do estabelecimento empresarial, será lícita a transferência dos empregados para outras localidades, uma vez que prevalecerá o Princípio da Continuidade da Relação de Emprego. No tocante às transferências provisórias é necessário o pagamento de adicional de transferência, no importe de 25% sobre o salário, desde que implique mudança de sua residência o qual integrará ao salário para todos os fins. Todavia, tal adicional, não será devido quando a transferência se der em razão de interesse extracontratual do empregado.

A Transferência para o exterior só será lícita quando ocorrer a concordância do empregado, sendo válida a resistência do empregado a tal alteração.

2.6 Críticas da Resistência

Seguindo a distinção de Hanna Arendt, o Direito do Trabalho de hoje trata do homo laborans, que labora e “se mistura” com os materiais, e não do homo faber, que “faz” e literalmente trabalha “sobre” eles .

O que se vê na atualidade é o “uso” do empregado como parte da empresa, mais do que isso, como “objeto” na busca do lucro cada vez mais alto e com menos custos.

Observa Chaul que a sociedade de hoje é autoritária, pois não consegue sequer concretizar os velhos princípios liberais e republicanos do século passado: ao contrário, combate às idéias contidas na Declaração dos Direito do Homem, reprime os movimentos sociais e discrimina raça, sexo e classe.

Como bem exemplificado por Marcio Túlio Viana , o bóia-fria vai de fazenda em fazenda transportado como gado, em caminhões superlotados. E caso queira fugir para a cidade, está condenado em morar em miseráveis favelas, e, mesmo que consiga um emprego, se sujeita a um tempo de fadiga adicional, representado pelas filas, pelas distâncias e pelo atraso nos transportes.

Ainda conforme Márcio túlio, vive-se num país de salve-se quem puder, onde os trabalhadores competem entre si, sujeitando-se a redutibilidade salarial, enquanto vendem sua energia para as empresas. E até hoje se pode conceituar o trabalho como Marx, onde a forca de trabalho é “uma mercadoria, assim como o açúcar, nem mais nem menos. Mede-se a primeira com o relógio, a segunda com a balança” .

Pior ainda é a situação dos desempregados. Que quando possuem algum direito decorrente de um emprego outrora, se sujeita à barganha da Justiça do Trabalho, pois, como estão acostumados a dizer os juízes, “melhor R$ 500,00 agora do que seus direitos reconhecidos no valor de R$ 7.000,00 daqui unos”.

Assim sendo, a resistência do empregado está a mercê da luta pela permanência no emprego, a qualquer custo, mesmo que indo contra todos os princípios protetivos do Trabalho.

CAPÍTULO 3

MECANISMOS DE DEFESA

Pode-se pensar em alguns fatores que propiciam ou levam à resistência.

O primeiro é a união entre os trabalhadores, vale dizer, a resistência em grupo ou coletiva. De fato, a união fortalece, e o empregado se sente mais encorajado a resistir.

Outro fator que fortalece a resistência é a co-gestão, na medida em que diminui o temor da represália. Isso porque o empregado sabe que poderá se apoiar no órgão de participação, que irá defendê-lo, se for necessário.

Ainda lembramos da estabilidade – ainda que relativizada. Trata-se de condição essencial do direito de resistência, posto que não haverá medo por parte do empregado de ser despedido.

Por fim, as pesquisas demonstraram que os jovens tendem mais à resistência que os mais velhos. Portanto, muitas vezes, ser jovem é fator que propicia a resistência.

No campo das relações de trabalho, a resistência dá-se, segundo Marcio Túlio Viana pelo desejo de se defender o direito violado ou o justo interesse insatisfeito pelo empregador, no exercício (irregular) de seu poder diretivo.

O citado professor ainda argumenta que “sempre se resiste em nome da justiça, cujo ideal pode variar e varia, no espaço e no tempo, mas em cada espaço, e em cada tempo, é um dado real, sensível.” .

Luta-se tanto para defender as normas que já estão no ordenamento jurídico e não são cumpridas quanto por normas que se quer ter.

O desequilíbrio entre a necessidade de preservar o emprego e os gravames sofridos pelo empregado. Quando se rompem os limites de tolerância do empregado, a resistência ganha corpo. Um galanteio é mais tolerável do que um contato físico. Uma ironia é mais suportável que o escárnio.

A constante subordinação jurídica do empregado em relação ao empregador faz com que aquele, inicialmente, submeta-se, inicialmente, às ordens que lhe são dadas.

À medida que o ambiente de trabalho lhe vai tornando hostil, mecanismos de resistência são acionados.

Inicialmente, de ordem interna, como a revolta, a indignação e a vontade de reagir.

As manifestações externas, contudo, nem sempre ocorrem, dependendo do tipo de relação que há entre as partes e o grau de submissão que se tem.

A submissão é fruto da dependência econômica, como dito antes, o trabalhador precisa do emprego para sobrevivência de sua família e conseguir outro no meio a tantos desempregados é difícil, então este mesmo sofrendo prejuízos físicos e psicológicos se submete ao empregador aceitando o assédio.

O Direito dos trabalhadores é protegido pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) assim como protege o trabalhador a pleitear a indenização como quando despedido injustamente, também não admite o assédio moral, a maior dificuldade está no próprio trabalhador que muitas vezes acha melhor não resistir em prol de garantir seu emprego.

Já quanto ao direito superar a autodefesa é um pouco mais complexo, pois no direito precisamos de provas e estas aqui são muito difíceis principalmente quando se trata de testemunhas que são colegas de trabalho e se submetem à necessidade de estarem empregados.

Como dito acima, a estrutura judiciária muitas vezes é burocrática e complexa. Temos demora na solução de litígios a qual sempre beneficia o empregador deixando neste tempo o trabalhador desamparado. Por outro lado os sindicatos que deveriam dar forças ao trabalhador, não tem mais tanto poder assim deixando-o de novo desamparado.

Como se não bastassem os legisladores buscam cada vez mais criar leis que protegem ou dão espaço para patrão, temos contra o trabalhador uma situação econômica absurda e especulativa de mercado.

4.1. O Remédio da Participação;

A empresa, como visto, sofreu várias modificações em sua órbita, não so no sentido da busca dos lucros com baixos custos, flexibilizando direitos, terceirizando as atividades consideradas intermediárias de sua finalidade, busca também, com essas transformações uma maior participação dos empregados.

Conforme o Douto Otavio Bueno Magano:

“Devido à grande flexibilização da empresa moderna, capaz de operar, com estruturas variadas, nas mais diversas partes do globo, desenvolveu-se (...) a concepção da empresa como centro de decisão capaz de adotar estratégia econômica autônoma, visando à produção de bens e serviços. Por causa, finalmente, das interações da empresa com o mundo circundante, das quais resultam ininterruptas modificações de sua estrutura, tem sido ela também caracterizada como um sistema ”.

Qualquer que seja o modelo, a empresa assume diversos papéis na vida do trabalhador: é ela que paga o salário, consome o trabalho, exige o seu tempo, dirige os seus gestos... S ele passa dentro dela pelo menos a terça parte da vida, ela passa dentro dele boa parte de que resta: está presente na conta do armazém. No alivio de estar fichado, na conversa no bar da esquina...

Como lembra Marcio Túlio, em sua brilhante obra Direito de Resistência , o empregado quando está fora da empresa, quase sempre se verá excluído da própria sociedade, sem direito sequer ao respeito alheio: será visto como um paria, um desocupado, um cachaceiro, um vadio, um lúmpen, um vagabundo, eterno suspeito nas rondas policiais. De certa forma, pior até que não ter família.

A empresa não é pessoa, nem física nem jurídica, considerada por muito como puma instituição, sendo assim, a relação de emprego muita das vezes acaba se dando entre um empregado e uma máquina, e por vezes acabam se confundindo, máquina e empregado.

Essa discussão sobre a natureza da empresa é criada pela própria CLT. Mais precisamente se a empresa seria ou não uma instituição. Essa discussão parece de grande importância, pois se relaciona diretamente com o fundamento do poder diretivo, ou do Jus variandi; e, reflexamente, com o direito de resistir, tema dessa obra.

O jus variandi surge da própria empresa instituição, que por sua vez decorre da Gestão da própria empresa, que é exercida pelo empresário.

Uma forma de melhorar a situação do empregado frente à precariedade que vive o mercado de trabalho é a co-gestão, onde representante dos empregados participe diretamente das decisões e interesses da instituição-empresa.

Em termos de jus resistentiae, a co-gestão desempenha triplo papel, conforme informa Marcio Túlio Viana :

1. Em primeiro lugar, fortalece aquele direito, na medida em que reduz o temor da represália. De fato, sabendo o empregado que tem, por detrás, o órgão de participação a defendê-lo, ele próprio se sentira mais forte para resistir às ilegalidades patronais. A conclusão é intuitiva.

2. Em segundo lugar, viabiliza de outra forma o seu exercício, já que, o próprio órgão co-gestor pode resistir na defesa do empregado ou grupo.

3. Em terceiro lugar, por fim, reduz a necessidade de resistência, e, paradoxalmente, talvez seja essa a sua função mais importante. Também aqui, a explicação é simples. Se o direito de resistir, como vimos, deriva do transbordamento do poder diretivo é evidente que, construindo-se uma barragem, não mais se terá de usá-lo, a não ser eventualmente, em dias de tempestade. Essa barragem é exatamente o órgão co-gestor, como também, subjetivamente, aproximando do empregado, forjando uma mentalidade nova, de menos retaliações e mais respeito.

4.2. O Remédio da Estabilidade

Outra forma de fortalecer os direitos dos empregados e a própria resistência por melhores condições de trabalho, passa pela estabilidade, seja aquela que protege o obreiro de despedida arbitrária, ou sem justa causa.

A estabilidade por tempo de serviço foi excluída do nosso Ordenamento Jurídico a partir da Constituição Federal de 1988 (clique aqui), posto que criou um Fundo de Garantia Por Tempo de Serviço com uma indenização de 40% do valor depositado caso ocorra a despedida sem justa causa. Entretanto, tais modificações são transitórias, pois tais normas são de eficácia contida, ou seja, pode o legislador criar um novo sistema de despedida. Vale lembrar que tal instituto regesse pelos atos de disposições transitórias da CF.

É verdade que existem algumas formas de estabilidade, os quais muitos autores preferem chamar de garantia de emprego, como é o caso da gestante, do candidato e posterior eleição do diretor de sindicato, do acidentado, do membro da CIPA (clique aqui), entre outros, que podem até mesmo serem criadas pelos próprios sujeitos da relação, ou seja, por normas autônomas, qual sejam, negociações coletivas.

4.3. Os Remédios do Juiz

Para o Douto Viana, as soluções dos Magistrados são:

“a) tendo de decidir contra a sua consciência, tem o dever de demitir-se: Taparelli, Cathrein;

b) o juiz tem de aplicar a lei injusta, pois ele tem de dar o exemplo da confiança no direito: Stammler;

c) tem de aplicar a lei, porque a segurança da sociedade está acima da justiça: Radbruch;

d) em geral tem de aplicar a lei, mas pode vez por outra contrariá-la para não sacrificar um inocente: Sauer;

e) somente os indivíduos atingidos pela lei injusta é que podem revoltar-se, mas nunca os servidores do Estado e o juiz é um deles: Geny;

f) dar direito ao juiz de nestes casos enviarem o processo ao tribunal superior, que julgará livre dos preceitos legais: Angel Ossorio, que assim propôs no anteprojeto do C. Civ. Boliviano de 1943, de sua autoria;

g) tem de aplicar a lei como se fosse o direito, para evitar maiores males e preservação da segurança: Castan Tobeñas. Entenda-se como lei injusta em toda esta exposição a que viola os direitos inatos do homem por ser homem. ” .

Por isso que hoje existe o chamado julgamento por Equidade, ou seja, de certa forma o juiz julgará conforme seus próprios parâmetros de verdade, de justo.

A submissão do juiz será produzida ou facilitada sempre que o juiz julgar sem perceber o mundo que o cerca, quando a justiça não for dotada de celeridade e eficiência; quando não for concedida a inversão no ônus da prova quando preenchidos certos requisitos, como por exemplo, a proteção do hipossuficiente; o juiz não enxergar a lei com olhos voltados para a Justiça e a realidade social, ou seja, a aplicação de uma interpretação da Lei conforme seus fins e quando o Direito não incentivar a co-gestão e não garantir a estabilidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O direito de resistência surge agora de uma forma institucional, pois sempre foi inerente ao homem que desde os primórdios resiste à opressão. Tem sua trajetória histórica no direito natural, mas também pela positivação em diversos textos legais e constitucionais.

Os limites do direito de resistência se apresentam dentro do próprio texto constitucional. E mesmo estando esse direito implícito, não deixa dúvidas quanto a sua existência, vez que a Constituição faz uma promessa de construção do Estado de Direito, e o Brasil consolida lentamente o processo democrático e de efetividade dos direitos fundamentais.

Enfim, não é Direito novo que se busca, mas a efetiva implementação dos ditames do Direito já existente, portanto legítimo.

O direito pode superar a necessidade de resistência valorizando institutos que diminuam a necessidade da autodefesa.

Um deles é a co-gestão. De fato, se o direito de resistir deriva do transbordamento do poder diretivo, construindo-se uma barragem, no caso, o órgão co-gestor, o direito de resistência não terá de ser usado.

Se o Direito não superar a necessidade da autodefesa, deverá, ao menos, garantir a efetividade do direito de resistência. A condição para isso é a proteção ao emprego, drasticamente reduzida após a obrigatoriedade do sistema do FGTS.

Não custa lembrar que a CF garante aquela proteção, mas ao mesmo tempo a reduz à indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS, nas disposições transitórias.

É verdade que o índice parece alto; mas como repousa, em última análise, sobre salários baixos (e em depósitos, portanto, também de pouco valor), acaba não cumprindo o papel de evitar as despedidas. É também verdade que se trata de disposição transitória; mas no Brasil é usual o transitório se tornar definitivo...

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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MONTEIRO, Maurício Gentil. O Direito de Resistência na Ordem Jurídica Constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

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SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 3ª ed. rev. atual e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio & VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do Trabalho. 21a ed., São Paulo: LTr., 2004.

VIANA, Márcio Túlio. Direito de Resistência. São Paulo: LTr, 1996.

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*Bacharel em Direito pela Universidade de Uberaba





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