Migalhas de Peso

Estruturando negócios a partir de contratos

Cada relação comercial pode ser um átomo criador de riqueza em uma corporação. Por isso, um olhar mais comercial no desenho de contratos pode se transformar em vantagem competitiva.

8/3/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Uma das funções primordiais do advogado moderno é auxiliar o seu cliente na melhor estruturação possível para o negócio. Isso já era bem comum nas estruturas societárias, mas há mais espaço para otimizar e maximizar resultados. Cada relação comercial pode ser um átomo criador de riqueza em uma corporação. Por isso, um olhar mais comercial no desenho de contratos pode se transformar em vantagem competitiva.

Há diversos instrumentos que auxiliam a alcançar esses objetivos. A Análise Econômica do Direito, a Psicologia Social e a Teoria dos Jogos são alguns dos mais importantes. Mas, para usá-los, o advogado precisa buscar compreender o funcionamento do negócio que é objeto do contrato, entendendo os objetivos de seu cliente e encontrando oportunidades.

Existem modelos que podem ajudar. O primeiro passo é observar a questão sob a ótica de metas e expectativas. É preciso: (i) pensar cuidadosamente a respeito do que o cliente realmente deseja; (ii) estabelecer metas otimistas, mas justificáveis; (iii) ser específico; (iv) criar um modelo escrito, bem concatenado; e, (v) conhecer profundamente a estratégia e as suas justificativas.

Em seguida, é preciso observar com atenção os padrões da outra parte, de modo a: (i) pesquisar os padrões e normas aplicáveis; (ii) identificar aqueles que as outras partes considerem legítimos; (iii) preparar uma base de dados e argumentos; (iv) prever os argumentos que a outra parte usará; e, (v) preparar um tema de posicionamento e antever o dos demais.

Após essas duas etapas iniciais, é o momento de olhar para os interesses da outra parte, identificando as pessoas com poder de decisão; e refletindo sobre as seguintes indagações:

 A partir desse momento, é possível observar, com mais clareza, os incentivos econômicos que poderão fazer o sucesso da relação e do próprio instrumento contratual, transformando-o em um poderoso instrumento de gestão e maximização de resultados. Agora, a Análise Econômica do Direito, a Psicologia Social e a Teoria dos Jogos entram em cena.

Se a ideia é viabilizar o negócio e maximizar resultados, o conceito de penalidades contratuais deve ficar em um segundo plano. O objetivo é que o contrato seja cumprido, logo, pensando no Nudge de Richard Thaler, faz mais sentidos induzir comportamento com case em incentivos do que em punições.

Logo, as obrigações mais importantes devem seguir a lógica da recompensa: se “A” é feito, então ganha-se “B”. A parte que não cumpre é autopenalizada. Ela deixa de ganhar porque não fez o combinado. Evitam-se, assim, os desgastes de se cobrar multas e penalidades que têm uma carga muito negativa, sobretudo, em contratos de longa duração.

Saliente-se, por oportuno, que a prática na advocacia contenciosa cível ilustra muito bem a necessidade de reformular estruturas contratuais, a fim de que se privilegie mais o cumprimento das obrigações pelos contratantes em detrimento das penalidades. Como o contrato é lei entre as partes, o Judiciário está repleto de processos nos quais se discute o não cumprimento de obrigações e as respectivas sanções contratuais. Essa prática no contencioso é valiosa para que o advogado consiga auxiliar o cliente na estruturação de bons negócios, já que os possíveis problemas já foram enfrentados e, portanto, são conhecidos.

Isso não vai se alterar, contudo, enquanto os advogados não começarem a deixar de lado alguns conceitos fortemente enraizados na prática da advocacia cível e comercial, para pensar fora da caixa. O foco não deve ser, pura e simplesmente, a proteção do cliente custe o que custar. A preocupação dos advogados deve ser de como criar mecanismos contratuais que não só viabilizem o cumprimento das obrigações, mas a incentivem, com as devidas salvaguardas para os casos de descumprimento.

Nesse ponto, é dever do advogado conhecer o negócio do seu cliente, pois, somente assim, conseguirá avaliar uma gama de relações exógenas e endógenas no dia a dia do operacional, e, com isso, avaliar os pontos de fricção do negócio, os riscos e propor soluções contratuais criativas, as quais, muita das vezes, transcendem o simples conhecimento jurídico.

Ser criativo, aliás, é ainda mais necessário diante do avanço tecnológico que a cada momento apresenta novas oportunidades, novos negócios ou novas formas de fazer negócios. No caso de Smart Contracts, por exemplo, isso se tornará mais relevante ainda. Mas isso será tema para outro artigo.

É bom lembrar, ainda, que um contrato efetivo não apenas cobre os pontos que uma das partes pretende proteger ou determinar. Buscar o equilíbrio é essencial para reduzir os riscos de um litigio. De nada adianta estruturar todo o processo se o que for para o papel não representar, obrigações minimamente equilibradas.

Acreditamos, também, que contratos estruturados a partir dessa lógica têm muito mais chances de prevenirem litígios. É um ganho duplo, um alinhamento mais preciso dos incentivos somados a um risco menor de conflitos. Se olharmos os contratos a partir dessa lente, por certo eles serão instrumentos para destacar os Departamentos Jurídicos como geradores de resultado.

Leonardo Correa
Sócio de 3C LAW | Corrêa, Camps & Conforti, LL.M pela University of Pennsylvania

Luiz Fernando Ract Camps
Sócio de 3C LAW | Corrêa, Camps & Conforti, graduado pela Universidade Paulista, com LL.M pela University of Miami (EUA).

Mário Conforti
Sócio de 3C LAW | Corrêa, Camps & Conforti, graduado pela Universidade Candido Mendes - UCAM, com LL.M pela FGV Direito Rio.

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