A lei 14.230, de 25 de outubro de 2021 alterou substancialmente a lei 8.429, de 2 de junho de 1992 (LIA), resultando uma grande reforma no sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa.
Segundo artigo 1º, § 4º, da LIA reformada, “o sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta lei. (...) § 4º Aplicam-se ao sistema da improbidade disciplinado nesta lei os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador.”
Considerando que é aplicado os princípios constitucionais do direito administrativo sancionador ao sistema da improbidade disciplinado na LIA, torna-se imprescindível que as alterações legais implementadas sejam aplicadas às ações de improbidade administrativas em curso, visto que a retroação da lei mais benéfica é um princípio geral do Direito Sancionatório e não apenas do Direito Penal.
Desta feita, por coerência sistêmica deve-se observar a retroatividade da norma mais favorável ao réu, com amparo no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, segundo o qual a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu, ou seja, a lei mais benéfica retroage.
Não se pode olvidar que as condutas tipificadas na lei de Improbidade geram atuação punitiva do Estado. Aliás, se no caso de sanção penal, que é a mais grave das punições, a Constituição Federal determina a retroação da lei mais benéfica, com razão cabe a retroatividade da lei no caso de sanções aplicáveis em virtude da prática de atos de improbidade administrativa, de que trata o artigo 37, § 4º, da Constituição Federal.
Consigna-se, portanto, a aplicação imediata dos dispositivos da lei 14.230, de 25 de outubro de 2021, sobretudo quanto às normas que, sendo mais favoráveis ao requerido, devem retroagir, por imperativo constitucional.
Assim é que as alterações legais comportam aplicação retroativa, por seu caráter sancionatório e por beneficiar o réu, o que respalda a aplicabilidade do novo prazo prescricional às ações de improbidade em curso.
Sustenta-se a imediata aplicabilidade do vigente artigo 23, “caput”, da LIA, o qual determina o prazo prescricional de 8 (oito) anos à aplicação das sanções, contados a partir da ocorrência do fato ou, no caso de infrações permanentes, do dia em que cessou a permanência.
Referido dispositivo legal veicula expressiva modificação no regime de prescrição, com a inclusão dos seguintes marcos interruptivos, após a data dos fatos: (i) o ajuizamento da ação de improbidade administrativa; (ii) a publicação da sentença condenatória; (iii) a publicação de decisão ou acórdão de Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal que confirma sentença condenatória ou que reforma sentença de improcedência; (iv) a publicação de decisão ou acórdão do Superior Tribunal de Justiça que confirma acórdão condenatório ou que reforma acórdão de improcedência; (v) a publicação de decisão ou acórdão do Supremo Tribunal Federal que confirma acórdão condenatório ou que reforma acórdão de improcedência.
Dispõe ainda que em caso de interrupção da prescrição, o prazo recomeça a correr do dia da interrupção, pela metade do prazo de 8 (oito) anos previsto no previsto no artigo 23, “caput”, da LIA.
Além disso, a suspensão e a interrupção da prescrição produzem efeitos relativamente a todos os que concorreram para a prática do ato de improbidade. E, caso existam atos de improbidade conexos e objeto do mesmo processo, a suspensão e a interrupção relativas a qualquer deles estendem-se aos demais.
Ao que parece, contudo, é juridicamente viável e possível sustentar que, por força da superveniência da lei 14.230/21, aplica-se o novo prazo de prescrição às ações de improbidade em curso, cuja retroatividade encontra guarida no artigo 1º, § 4º, da LIA.