O universo das organizações da sociedade civil (associações e fundações de direito privado sem fins lucrativos e sem fins econômicos) e do chamado Terceiro Setor contempla diversos assuntos e desafios a serem diariamente enfrentados. Um tema pouco discutido e que merece atenção se refere à proteção dos chamados elementos imateriais (como nome e marca) das organizações sem fins lucrativos.
Diante da importância da realização dos projetos e objetivos sociais no dia a dia dessas organizações, o assunto pode parecer de menor relevância. Todavia, um olhar mais atento identifica a proteção jurídica que estes elementos podem conferir às organizações, além de sua relação com a consolidação da imagem, podendo influenciar, inclusive, a própria formalização jurídica dessas organizações.
Os elementos imateriais se relacionam diretamente com a identidade das organizações e, assim, conflitos de natureza de propriedade intelectual podem, em última instância, culminar no fim dessas iniciativas. No decorrer de nossa atuação, acompanhamos um caso em que a impossibilidade da utilização de nome que se alinhava perfeitamente aos objetivos sociais de uma organização em fase de constituição foi causa para a descontinuidade da formalização jurídica da entidade.
Desta forma, a proteção de elementos imateriais, como nome e marca, dentro do universo do Terceiro Setor, é de grande relevância, devendo ser levada em consideração desde a constituição das organizações sem fins lucrativos.
ELEMENTOS IMATERIAS: DIFERENÇAS E REGISTRO
Para compreender melhor o assunto, é importante esclarecer brevemente a diferença entre denominação social (nome), nome fantasia e a marca, dentro do universo do Terceiro Setor.
A denominação social se configura como o nome de registro da organização, indicado em seu Estatuto Social e no seu cartão CNPJ. Embora menos frequente do que no mundo empresarial, as organizações do Terceiro Setor também podem adotar nome fantasia (que pode ser uma abreviação da denominação social ou, ainda, outro nome que não necessariamente coincida ou se relaciona com a denominação social, e se caracteriza como o nome pelo qual a entidade é ou deseja ser conhecida perante o público). O nome fantasia, se existir, também será mencionado no Estatuto Social e no CNPJ da organização.
A marca, por sua vez, é mais abrangente: podem ser registrados como marcas os sinais distintivos visualmente perceptíveis, ou seja, não apenas o nome, mas também o logotipo e demais elementos que formam a identidade visual dos serviços e produtos da entidade. As marcas não são registradas em cartório, mas no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Uma vez registradas, recebem proteção em âmbito nacional.
Compreender essa diferença é importante, pois nem sempre o registro dos documentos societários em cartório de registro civil de pessoas jurídicas garante toda a proteção à identidade imaterial da organização, isto é, a exclusividade do seu nome e identidade visual.
Sabe-se que o momento do registro do ato constitutivo de uma organização do Terceiro Setor determina o começo de sua existência legal, ocorrendo, junto a isso, a declaração de sua denominação, de acordo com o que positivam os artigos 45 e 46 do Código Civil.
Quando do registro dos atos constitutivos, os cartórios realizam busca para verificar se há outras organizações com o nome pretendido. Entretanto, essa busca não é suficiente para garantir a exclusividade do nome, do nome fantasia ou da marca da organização em âmbito federal, pois os cartórios costumam realizar busca de denominações similares dentro da comarca que atendem. O registro da marca junto ao INPI, por sua vez, confere abrangência e proteção nacional.
Por estes motivos, é recomendável sempre realizar pesquisas mais aprofundadas quanto ao nome, nome fantasia (se for o caso) e à marca pretendidas.
VANTAGENS DA PROTEÇÃO DOS ELEMENTOS IMATERIAS
A proteção dos elementos imateriais confere segurança jurídica às organizações do Terceiro Setor. Diante do quadro apresentado, verifica-se que, sem o registro da marca, a organização não está completamente protegida, mesmo que atue por muito tempo e venha construindo seu nome e identidade.
Isso porque ainda existe a chance de que terceiro prossiga com o registro prévio junto ao INPI de marca similar ou coincidente daquela pretendida ou até utilizada pela organização, seja para o mesmo tipo de atividade ou para função diversa. Neste cenário, se a organização ainda não estiver formalmente registrada em cartório, terá de alterar sua denominação social para que futuramente consiga registrar sua marca ou, se já constituída formalmente, poderá ser notificada extrajudicialmente para que altere os elementos que foram registrados anteriormente por outrem.
Além disso, ao realizar o registro perante o INPI, a organização passa a ter a opção de judicialização de eventuais conflitos decorrentes de conflitos com marcas idênticas ou similares de terceiros. Desse modo, na ocorrência desse conflito, a organização terá segurança jurídica de que a sua marca estará protegida.
Portanto, percebe-se que o registro da marca é muito importante para assegurar a identidade e valores das organizações da sociedade civil no âmbito de sua atuação. Somado a isso, a possibilidade de comunicar, por meio de elementos visuais, a causa na qual se engaja e os princípios pelos quais se norteia, faz com que a entidade fortaleça sua identidade e goze de maior credibilidade perante seus parceiros, doadores e patrocinadores.
CONCLUSÃO
Apesar de ser tema pouco explorado no universo do Terceiro Setor, a proteção aos elementos imateriais das organizações da sociedade civil não deve ser vista como fator menor ou pouco relevante, mas como um importante aspecto a ser trabalhado desde a constituição da organização, para além do seu registro em cartório.
Tal preocupação permite a construção de uma identidade visual sólida, transparecendo confiabilidade e seriedade perante terceiros, além de trazer segurança para a própria organização quanto a eventual uso indevido de seu nome ou marca por terceiros.