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A responsabilidade civil das instituições financeiras: fraudes bancárias e o novo sistema de pagamento instantâneo pix

Da responsabilidade civil das instituições financeiras em fraudes bancárias ocorridas durante o uso do novo sistema de pagamento instantâneo pix.

14/12/2021

(Imagem: Arte Migalhas)

Instituído em meados de 16 de junho de 2020, após a publicação no Diário Oficial da União (DOU) da circular 4.027, de 12 de junho de 2020, do Banco Central do Brasil (BCB), o novo sistema de pagamento instantâneo Pix chegava para concretizar um verdadeiro avanço no sistema tecnológico e operacional de grande parcela das instituições financeiras.

Para desburocratizar aqueles até então disponíveis no âmbito do sistema financeiro brasileiro, houve o início e inclusão de um inovador meio de pagamento capaz de facilitar o dia a dia de cada cidadão brasileiro.

Em relação aos fundamentos utilizados para a sua instituição, pode-se afirmar que o seguro e eficiente funcionamento do novo sistema acabaram por motivar a sua inclusão no sistema financeiro brasileiro.

E não para por aí, já que se soma a tais fatores que em meados do presente século XXI existe forte crescente dos números de operações e pagamentos realizados por algum meio eletrônico, isto é, seja por meio do internet banking disponibilizado pelas instituições financeiras ou até mesmo através do uso constante de pagamentos por algum meio digital.

Apesar da patente desburocratização no sistema financeiro brasileiro, houve aumento no número de fraudes bancárias, que para tanto pode ser justificado pela existência de movimento crescente no tocante ao uso e tratamento de dados pessoais de forma insegura.

No tocante as fraudes bancárias ocorridas durante o uso do novo sistema de pagamento, é a partir de então que se inicia a discussão acerca da possibilidade de responsabilização civil das instituições financeiras.

Em primeiro lugar, cabe citar que a resolução do BCB 1, de 12 de agosto de 2020, dispõe acerca do sistema de pagamento Pix, de maneira em que no seu art. 3º, caput, existe disposição aplicável a participação das instituições financeiras, vejamos:

A participação no Pix é obrigatória para as instituições financeiras e para as instituições de pagamento autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil com mais de quinhentas mil contas de clientes ativas, consideradas as contas de depósito à vista, as contas de depósito de poupança e as contas de pagamento pré-pagas.

Já o regulamento do supracitado sistema de pagamento, este está previsto anexamente à resolução do BCB 1, de 12 de agosto de 2020, sendo que nele encontram-se previstas todos os principais pontos e disposições aplicáveis.

O próprio regulamento do sistema Pix já prevê eventuais riscos de fraudes ocorridos pelo uso do sistema, de modo cabe ao BCB operar e definir o seu gerenciamento do risco de fraude.

O supracitado regulamento define ainda de modo simples acerca de eventual responsabilidade civil das instituições financeiras, quando for porventura o caso de existir fraudes bancárias no âmbito Pix, sendo tal definição de responsabilidade prevista no art. 32, V, vejamos:

Os participantes do Pix devem:

V - responsabilizar-se por fraudes no âmbito do Pix decorrentes de falhas nos seus mecanismos de gerenciamento de riscos, compreendendo a inobservância de medidas de gestão de risco definidas neste Regulamento e em dispositivos normativos complementares; (Redação dada, a partir de 28/9/2021, pela Resolução BCB 147, de 28/9/2021, produzindo efeitos a partir de 16/11/2021).

Como se percebe, o BCB impôs expressamente a existência de responsabilidade civil das instituições financeiras em casos de fraudes ocorridas no novo sistema de pagamento.

Tudo isso reflete a corrente teórica que afirma que “[s]e por um lado a evolução da tecnologia trouxe amplas melhorias na comunicação do cliente com o banco, praticamente afastando-o das agências, de outro, facilitou e aumentou o número de fraudes [...]” (SCHONBLUM, 2021, p. 351).

A responsabilidade civil das instituições financeiras se deve pelo próprio desempenho de sua atividade de risco, como bem pontuado por Sérgio Cavalieri Filho:

Assim, parece-nos lógico concluir que o objetivo do legislador foi estabelecer uma cláusula geral de responsabilidade objetiva que abrangesse toda essa vasta área dos serviços, mormente se tivermos em conta que o Projeto do novo Código Civil foi elaborado muito antes do Código do Consumidor, que posteriormente tratou da matéria no seu art. 14, no que concerne às relações de consumo (FILHO, 2011, p. 268)

Em regra, a responsabilidade das instituições financeiras é analisada do ponto de vista objetivo, ou seja, basta a existência da comprovação do dano ocorrido no exercício da atividade do banco.

Nesse rumo assim dispõe o art. 927, caput, do CC/02, nestas palavras:

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem

Se for o caso de existir comprovação de falha na prestação dos serviços pelo banco réu, é inconteste a aplicação da responsabilidade civil objetiva no caso em concreto.

Veja-se, o regulamento do Pix atribui a seguinte responsabilidade: dever de reparação em favor do lesado por conta única e exclusiva da instituição financeira.

O supracitado trecho reflete o chamado caso de ocorrência de fortuito interno, que nada mais é que um risco que “quando surge da própria coisa, de sua fabricação, fazendo parte da atividade do fornecedor” (RIZZARDO, 2019, p. 357).

Além disso, é importante ainda que sejam demonstradas as causas excludentes de responsabilidade, como é o caso do fortuito externo, que nada mais que aquele fato que não possui nenhuma relação com o dano (FILHO, 2011, p. 276).

Quando o fato for exclusivo da vítima ou terceiro, de modo que o comportamento do usuário foi a única causa do dano efetivamente ocorrido, sendo que o mesmo ocorreu por culpa exclusiva diante da ocorrência de imprudência ou negligência sua, certamente não haverá que se falar em reparação civil.

De outro modo, de extrema relevância cabe citar que houve o advento da lei 13.709, de 14 de agosto de 2018, ora conhecida como lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD, sendo essa plenamente aplicável ao caso.

Tal novidade advém da necessidade de regulamentação de dados pessoais, já que visa resguardar a privacidade dos seus titulares, a liberdade de expressão, de informação, bem como em especial a inviolabilidade da honra e imagem de cada pessoa.

Por tais necessidades, a LGPD se aplica diretamente aos casos em que existem fraudes bancárias surgidas durante o uso do novo sistema Pix, como é o exemplo de eventual responsabilização civil por vazamento de dados.

Assim sendo, se por acaso existir a ocorrência de fraude bancária originada por meio do vazamento de dados pessoais, tem-se que a instituição financeira poderá ser responsabilidade a reparar tal dano sofrido pelo usuário.

E melhor dizendo, a própria instituição financeira poderá ainda ser responsabilizada administrativamente, como bem previsto nas hipóteses dispostas no art. 52 da LGPD.

Portanto, conclui-se pela existência de efetiva possibilidade de responsabilização das instituições financeiras em casos de fraudes bancárias quando advindas do uso do novo sistema de pagamento Pix.

Em outras palavras, não existe novidade legislativa quanto a possibilidade de responsabilização das instituições financeiras, mas, na verdade, é certo que ocorrerá o aumento do número de processos judiciais com causa de pedir advinda do novo sistema de pagamento, além do número de casos e sanções administrativas.

__________

BANCO CENTRAL DO BRASIL. 12/06/2020. Diário Oficial da União, 16 jun. 2020. Disponível aqui. Acesso em: 29 nov. 2021.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. 01/08/2020. Diário Oficial da União, 2020. Disponível aqui. Acesso em: 29 nov. 2021.

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível aqui. Acesso em 27 de nov. de 2021.

BRASIL. Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018. Disponível aqui. Acesso em 29 de nov. de 2021.

FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2011. p. 268.

FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2011. p. 276.

RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade Civil, 8ª edição. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2019. p. 357.

SCHONBLUM, Paulo Maximilian Wilhelm. Contratos Bancários, 4ª edição. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2015. p. 351.

Caio Almeida Monteiro Rego
Advogado do escritório Barreto Dolabella Advogados. Pós-graduando em Direito Civil pela Puc Minas.

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